Prática Trabalhista

O 13º salário como um direito social e garantia fundamental

Autores

  • Ricardo Calcini

    é professor advogado parecerista e consultor trabalhista. Atuação estratégica e especializada nos Tribunais (TRTs TST e STF). Coordenador trabalhista da Editora Mizuno. Membro do Comitê Técnico da Revista Síntese Trabalhista e Previdenciária. Membro e Pesquisador do Grupo de Estudos de Direito Contemporâneo do Trabalho e da Seguridade Social da Universidade de São Paulo (Getrab-USP) do Gedtrab-FDRP/USP e da Cielo Laboral.

  • Leandro Bocchi de Moraes

    é pós-graduado lato sensu em Direito do Trabalho e Processual do Trabalho pela Escola Paulista de Direito (EPD) pós-graduado lato sensu em Direito Contratual pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) pós-graduado em Diretos Humanos e Governança Econômica pela Universidade de Castilla-La Mancha pós-graduando em Direitos Humanos pelo Centro de Direitos Humanos (IGC/Ius Gentium Coninbrigae) da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra membro da Comissão Especial da Advocacia Trabalhista da OAB-SP auditor do Tribunal de Justiça Desportiva da Federação Paulista de Judô e pesquisador do núcleo O Trabalho Além do Direito do Trabalho da Universidade de São Paulo (NTADT/USP).

24 de novembro de 2022, 8h00

As comemorações de Natal e de Réveillon vêm se aproximando e junto com elas, claro, a expectativa de o(a) trabalhador(a) vir a receber o festejado 13º salário que, neste ano de 2022, completou 60 anos. Nesse sentido, surgem algumas dúvidas e questionamentos sobre essa temática, tanto em relação aos trabalhadores que possuem tal direito, assim como a forma de cálculo desse benefício.

Com efeito, a gratificação natalina, mais conhecida como 13º salário, foi introduzida pela Lei nº 4.090, de 13 de julho de 1962 [1], assegurando ao(à) empregado(a) o pagamento do benefício no mês de dezembro de cada ano. Já a Lei nº 4.749, de 12 de agosto de 1965 [2], melhor regulamentou a referida legislação no tocante ao seu pagamento.

Nesse desiderato, a Constituição Federal de 1988 consagra em seu artigo 7º, inciso VIII [3], o 13º salário como um direito social e uma garantia fundamental aos trabalhadores. Por isso, nos termos do artigo 60, §4º da Carta Magna [4], o 13º salário é infenso à revogação pelo legislador ordinário, tanto que protegido pelo manto das cláusulas pétreas. À vista disso, o atual artigo 611-B da Consolidação das Leis do Trabalho [5], introduzido pela Lei 13.467/2017, reforça a vedação de que a negociação coletiva de trabalho (convenção coletiva ou de acordo coletivo) possa vir a suprimir e/ou reduzir a gratificação natalina.

É certo que todos os empregados — urbanos e rurais, avulsos, domésticos, aposentados, pensionistas e servidores públicos — terão direito ao 13º salário. E, mais, tal benefício consistirá numa gratificação extraordinária, de modo que, ao final de cada ano, o(a) trabalhador(a) fará jus a esse pagamento suplementar à razão de 1/12 da remuneração por mês efetivamente laborado.

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A base de cálculo a ser utilizada será o salário bruto devido no mês de dezembro, sem, contudo, levar em consideração eventuais deduções ou adiantamentos. Já quando o salário for pago por comissão, se não houver norma coletiva disciplinando o assunto, o 13º salário será calculado com base na média do valor recebido pelo(a) empregado(a) no último ano, ou pelo número de meses laborados, se o período for menor.

Frise-se, por oportuno, que será feita a somatória de todas as verbas de natureza salarial para fins de integração da base de cálculo do benefício, tais como: salário fixo, gorjetas, adicionais, comissões e horas extraordinárias, por exemplo.

Além disso, o pagamento do benefício deverá ser realizado em duas parcelas, sendo que a primeira entre 1º de fevereiro e 30 de novembro, e a segunda até o dia 20 de dezembro. Caso seja de interesse do(a) empregado(a), o 13º salário poderá ser pago juntamente com as suas férias, desde que tenha formalizado essa solicitação, por escrito, até o mês de janeiro do respectivo ano. Se não houver esse requerimento, contudo, o empregador poderá quitar a primeira parcela quando achar mais adequado.

Bem por isso, algumas empresas optam por fazer o pagamento da primeira parcela no dia no mês do aniversário do trabalhador, de sorte que, além de cumprirem com a obrigação prevista em lei, ainda "presenteiam" os trabalhadores em seus respectivos aniversários, não sobrecarregando, assim, a folha de pagamento.

Se é verdade que a companhia não precisará efetuar o pagamento do 13º salário de uma única vez a todos os empregados, de igual modo deve respeitar fielmente os prazos estipulados pela legislação trabalhista para o pagamento do benefício, até porque é sabido que esse benefício movimenta e impulsiona significadamente a economia do país.

De acordo com o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o pagamento do 13º salário tem a capacidade de introduzir cerca de R$ 248,8 bilhões neste ano de 2022, o equivalente a 2,6% do PIB do país [6]. Aliás, a quantidade de trabalhadores contemplados com o 13º salário atualmente é de cerca de 85,5 milhões de brasileiros. Já no ano de 2021, a gratificação natalina teria injetado R$ 232 bilhões na economia [7].

De outro norte, um estudo elaborado pela Confederação Nacional do Comércio (CNC), realizado em maio de 2022, apontou o aumento do consumo dos brasileiros, sendo que a expectativa para o segundo trimestre tinha por base recursos extraordinários, como o décimo terceiro salário [8].

Destarte, no que tange à problemática de que tal benefício reflete numa onerosidade considerável para o empregador, impende destacar que na época da criação legal do 13º salário já se tinha como praxe das empresas o pagamento da gratificação aos funcionários perto do Natal. A propósito, outros países garantem aos seus empregados um benefício semelhante, dada à tradição cristã, como são os casos de Portugal, México, Argentina, Uruguai, Espanha e Itália [9].

Nessa linha de raciocínio, oportunas são as palavras do professor Homero Batista [10]:

"Pode-se questionar a pertinência dessa criação legal, por onerar excessivamente a folha de pagamento, mas algumas questões não ligadas ao Direito do Trabalho devem ser frisadas quando o assunto é o processo legislativo: a) o décimo terceiro salário nasceu de uso e costumes no próprio seio das relações trabalhistas, possivelmente influenciados pela tradição cristã desse país, tendo o legislador de 1962 apenas estendido a prática para poucos setores que ainda não a praticavam e, também, disciplinado valores e condições de pagamento; b) o mês de dezembro passa a representar um diferencial em quase todas as atividades produtivas, porque, da mesma maneira como o dinheiro sai de forma dobrada, sob modalidade de forma de pagamento, circula de modo exponencial pela economia brasileira e volta em grande medida sob a forma de aquisição de bens e serviços naquele mês e nos meses próximos, a ponto de não se poder mais deixar de contar com esse impacto nas políticas econômicas; c) o legislador praticamente reconhece que, não havendo condições políticas e econômicas de elevação substancial da massa salarial brasileira em geral e do salário mínimo em particular, alguns subterfúgios são relevantes para se buscar diluir outros tipos de aumento ao longo dos meses e do ano, sendo o décimo terceiro salário exemplo de como os empregados obtiveram um aumento de 8,33% (equivalente a 1/12) sem maior alarde.

Oito inteiros e trinta e três centésimos por cento: esse exatamente o alcance do décimo terceiro salário sobre a remuneração do trabalhador, reforçando ainda mais a tese da natureza jurídica salarial".

Entrementes, existem algumas peculiaridades para o pagamento do 13º salário nas hipóteses de extinção do contrato de trabalho. Isso porque em se tratando de extinção do contrato de trabalho por justa causa, o(a) empregado(a) não terá direito ao benefício, conforme entendimento já sedimentado pelo Tribunal Superior do Trabalho [11].

No entanto, se o(a) trabalhador(a) for dispensado(a) sem justa causa ou pedir demissão, e, mais, nas hipóteses de término do contrato por prazo determinado e rescisão indireta, fato é que se pagará o 13º salário proporcional ao tempo de serviço. Neste cenário, a remuneração a ser utilizada para a base de cálculo do benefício será a do mês da rescisão.

Se, porventura, o(a) empregado(a) for dispensado(a), mas já tiver recebido o pagamento da primeira parcela, o empregador poderá realizar o desconto desse adiantamento na rescisão do contrato de trabalho.

Outrossim, o direito ao benefício surge a partir do 15º dia de serviço prestado ao empregador. Todavia, se o(a) trabalhador(a) possuir mais de quinze faltas não justificadas no mês, poderá sofrer o desconto no equivalente à fração de 1/12 referente ao período.

Aliás, vale lembrar que o pagamento do 13º salário não está condicionado à produtividade, de forma que todos os funcionários terão este direito, independentemente dos resultados alcançados.

É importante ressaltar que o pagamento do 13º salário deverá ser efetuado de forma antecipada se, por acaso, recair o dia do seu pagamento em domingo ou feriado. Caso isto não aconteça, o empregador estará sujeito à multa, não sendo possível a prorrogação do pagamento para o primeiro dia útil subsequente. Nessa oportunidade, o imposto de renda e a contribuição do INSS incidirão sobre o pagamento do benefício, contudo, os descontos deverão acontecer no pagamento da segunda parcela.

Noutro giro, o contrato de trabalho intermitente possui uma particularidade no que tange ao pagamento do 13º salário, diferindo-se dos demais contratos de trabalho. Isto porque, nos termos do artigo 452-A, § 6º, inciso III, da Consolidação das Leis do Trabalho [12], ao final de cada prestação de serviço para o qual foi convocado(a) o(a) trabalhador(a) intermitente já deverá ser efetuado o pagamento da verba. Caso ocorra a extinção do pacto laboral, não haverá a necessidade do pagamento do 13º salário, porquanto o benefício já foi quitado ao longo da prestação de serviço.

Por todo o exposto, todos os empregados com carteira assinada possuem direito ao 13º salário a ser pago pelo empregador ou pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), se forem aposentados ou pensionistas. A gratificação natalina não será paga, contudo, àqueles que recebem benefícios assistenciais, como o Benefício de Prestação Continuada da Lei Orgânica da Assistência Social (Loas) e Renda Mensal Vitalícia.

Em arremate, incontestavelmente esse benefício é de grande importância para toda a sociedade, pois, além de estimular a economia do país, ainda garante ao(à) trabalhador(a) uma oportunidade de organização da sua vida financeira, sobretudo nas festas de final de ano.

 


[2] Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4749.htm. Acesso em 21/11/2022.

[4] Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: (…). § 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I – a forma federativa de Estado; II – o voto direto, secreto, universal e periódico; III – a separação dos Poderes; IV – os direitos e garantias individuais.

[5] Art. 611-B. Constituem objeto ilícito de convenção coletiva ou de acordo coletivo de trabalho, exclusivamente, a supressão ou a redução dos seguintes direitos: (…). V – valor nominal do décimo terceiro salário;

[9] Disponível em https://www.tst.jus.br/13-salario. Acesso em 21/11/2022.

[10] Direito do Trabalho Aplicado: Direito Individual do Trabalho – São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021. – (Coleção Direito do Trabalho aplicado, Volume 2)

[12] Art. 452-A. O contrato de trabalho intermitente deve ser celebrado por escrito e deve conter especificamente o valor da hora de trabalho, que não pode ser inferior ao valor horário do salário-mínimo ou àquele devido aos demais empregados do estabelecimento que exerçam a mesma função em contrato intermitente ou não. (…). § 6º Ao final de cada período de prestação de serviço, o empregado receberá o pagamento imediato das seguintes parcelas: (…). III – décimo terceiro salário proporcional;

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  • Brave

    é mestre em Direito do Trabalho pela PUC-SP, professor de Direito do Trabalho da FMU, coordenador trabalhista da Editora Mizuno, membro do Comitê Técnico da revista Síntese Trabalhista e Previdenciária, coordenador acadêmico do projeto "Prática Trabalhista" (ConJur), membro e pesquisador do Grupo de Estudos de Direito Contemporâneo do Trabalho e da Seguridade Social, da Universidade de São Paulo (Getrab-USP), do Gedtrab-FDRP/USP e da Cielo Laboral.

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    é pós-graduado lato sensu em Direito do Trabalho e Processual do Trabalho pela Escola Paulista de Direito, pós-graduado lato sensu em Direito Contratual pela PUC-SP, pós-graduando em Direitos Humanos pelo Centro de Direitos Humanos da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, membro da Comissão Especial da Advocacia Trabalhista da OAB-SP, auditor do Tribunal de Justiça Desportiva da Federação Paulista de Judô e pesquisador do núcleo O Trabalho Além do Direito do Trabalho, da USP.

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