legislação insuficiente

Escolas devem reprimir discriminação por gênero e orientação sexual, diz STF

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1 de julho de 2024, 10h49

Os cidadãos brasileiros têm um direito de proteção do Estado contra discriminações baseadas em gênero e orientação sexual, mas a proteção oferecida pela legislação é insuficiente.

Sala de aula, escola, aluno

PSOL alegou que previsão da Lei do PNE de 2014 não garantia proteção adequada

Assim, o Plenário do Supremo Tribunal Federal reconheceu, na última sexta-feira (28/6), em sessão virtual, que as escolas têm a obrigação de coibir discriminações por gênero, identidade de gênero e orientação sexual, como o bullying machista e homotransfóbico.

Contexto

Na ação direta de inconstitucionalidade, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) alegou que há omissão quanto ao tema no Plano Nacional de Educação (PNE), previsto na Lei 13.005/2014.

Por isso, pediu que o STF reconhecesse a existência desse dever e garantisse o respeito à identidade das crianças e adolescentes LGBTQIA+ no ambiente escolar.

O inciso III do artigo 2ª da lei de 2014 prevê a “superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da cidadania e na erradicação de todas as formas de discriminação”.

Mesmo assim, o PSOL apontou que o PNE (bem como os planos estaduais e municipais de educação) não faz menção ao enfrentamento específico das discriminações de gênero, identidade de gênero e orientação sexual por parte das escolas.

Segundo o partido, isso fez com que as escolas deixassem de combater a prática. Para a legenda, as escolas deveriam ensinar crianças e adolescentes a conviverem com a diversidade, com especial atenção aos alunos pertencentes a minorias e grupos vulneráveis.

Já a Advocacia-Geral da União argumentou que os pedidos da agremiação seriam desnecessários, porque a própria lei já prevê, de forma mais geral, a proteção a tais discriminações e o ordenamento jurídico já é voltado a erradicá-las.

Voto do relator

O ministro Luiz Edson Fachin, relator do caso, foi acompanhado na íntegra por Dias Toffoli, Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Luís Roberto Barroso.

Fachin afirmou que o Estado precisa produzir leis e dar corpo a políticas públicas voltadas a combater preconceitos de gênero e orientação sexual.

Ele apontou que os precedentes do STF “são uníssonos na constatação de que o Brasil vive uma situação de catástrofe concernente à violência de gênero e a violência homofóbica e transfóbica”.

De acordo com o magistrado, a comunidade LGBTQIA+ “é submetida, sistematicamente, a um conjunto de circunstâncias materiais e simbólicas que degradam sua existência digna”.

Em 2015, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) apresentou um relatório no qual citou algumas formas sistemáticas de violência sofridas por crianças e jovens LGBTQIA+: isolamento na escola, marginalização, exclusão de serviços essenciais, abandono familiar e comunitário, assédio, bullying, violência física e sexual etc.

O relator também lembrou que o STF já reconheceu o gênero como uma “expressão fundamental da liberdade e da dignidade humana”.

Para Fachin, seria necessário especificar que a lei do PNE também busca combater essas discriminações, pois “todo déficit de clareza quanto a estes objetivos conduz a um correspondente decréscimo de adequação técnica da norma”.

Ele explicou que seu voto consiste em dar uma interpretação conforme a Constituição para a lei de 2014, de forma a tornar explícita uma norma “já implícita de promoção das igualdades de gênero e orientação sexual”.

Outros votos

O ministro Flávio Dino acompanhou Fachin, mas fez um complemento. Para ele, também “devem ser observados os preceitos pedagógicos de adequação do conteúdo e da metodologia aos diferentes níveis de compreensão e maturidade, de acordo com as faixas etárias e ciclos educacionais”.

O acréscimo de Dino foi seguido por Cristiano Zanin, Gilmar Mendes e André Mendonça, mas essa corrente ficou vencida.

Já o ministro Kassio Nunes Marques abriu divergência e também ficou vencido. Ele foi o único a negar o pedido do PSOL e declarar a constitucionalidade das normas questionadas.

Para Kassio, “o poder público tem agido e demonstrado agilidade e eficiência no trato com a matéria, o que afasta a hipótese de omissão inconstitucional”.

Assim, o magistrado considerou impossível a intervenção do Judiciário, para não violar o princípio da separação dos poderes.

“O tema da educação em escolas públicas e particulares é altamente complexo e multifacetário”, assinalou. “O debate sobre tais questões deve ser feito, de forma primordial, pelo Legislativo e, posteriormente, pelo Executivo, por seu respectivo Ministério da Educação”.

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ADI 5.668

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