Violência contra crianças

Lei Henry Borel não obriga MP a seguir requisição da polícia, diz maioria do STF

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16 de maio de 2024, 16h45

O delegado pode apenas solicitar que o Ministério Público proponha ação cautelar de antecipação de produção de prova em casos de violência contra crianças e adolescentes. O MP tem a prerrogativa de avaliar se é o caso de atuar nesse sentido ou não.

Lei diz que polícia pode “requisitar” ao MP a antecipação de provas em casos de violência contra crianças e adolescentes

Esse entendimento foi estabelecido pela maioria do Plenário do Supremo Tribunal Federal nesta quinta-feira (16/5). O fim da sessão virtual está previsto para esta sexta-feira (17/5).

A análise diz respeito ao parágrafo 1º do artigo 21 da Lei Henry Borel, de 2022, que passou a prever a possibilidade de a polícia requisitar ao Ministério Público a antecipação de produção de provas em casos de violência contra crianças e adolescentes.

O trecho da norma é contestado pela Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp). De acordo com a entidade, o termo “requisitar” significa “determinar” e isso inverte a lógica acusatória, pois é o MP quem tem função de requisitar diligências policiais. Para a Conamp, o MP não pode ser submetido a uma ordem da polícia.

Voto do relator

O ministro Luiz Fux, relator do processo, explicou que a autonomia do MP é garantida pela Constituição e, por isso, não pode ser restringida pela legislação infraconsticucional:

“A atuação dos membros do Ministério Público não admite balizas jurídicas à sua independência funcional que não estejam previstas no sistema constitucional de responsabilização.”

Na prática, isso significa que uma lei não pode dar a um órgão o poder ou a atribuição de determinar que o MP proponha uma ação. O magistrado lembrou que o ajuizamento da ação penal e da ação cautelar de produção de provas é função institucional do MP.

O relator também apontou que as funções da polícia judiciária (que inclui as Polícias Civis e a Polícia Federal) “não incluem a de determinar atuação do Ministério Público, como ao se exigir a propositura de ação cautelar de produção de provas”.

Ele também destacou que o MP é o responsável pelo controle externo da atividade policial. Assim, atribuir à polícia o controle externo do MP “subverteria o desenho constitucional de ambas as instituições”.

O ministro afirmou que o verbo “requisitar” pode ter o sentido de “pedir”, em vez de “determinar”. É usado neste sentido, por exemplo, no § 1º do artigo 100 do Código Penal, segundo o qual a ação penal pública depende de representação do ofendido ou de “requisição” do ministro da Justiça.

“Apesar de se utilizar o termo ‘requisição’, a compreensão tem sido de que o vocábulo denota, em sua compreensão jurídica, uma autorização ou pressuposto para atuação ministerial, jamais como uma ordem dirigida ao titular da ação penal pública”, explicou.

Por outro lado, o verbo “requisitar” de fato tem sido usado, “ao menos no âmbito processual penal”, com o sentido de “determinar”, para diferenciar a determinação funcional de um pedido ou uma solicitação — geralmente representados pelo verbo “requerer”.

Por isso, Fux considerou importante dar ao termo da lei o sentido de “solicitar”. Para ele, isso preserva a autonomia constitucional do MP e “mantém a ideia legislativa de se possibilitar a provocação da polícia judiciária para a coleta cautelar de provas”.

Até o momento, seu voto foi acompanhado na íntegra por Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Cristiano Zanin e Dias Toffoli.

O ministro Gilmar Mendes também acompanhou o relator, mas fez a ressalva de que o MP precisa fundamentar sua opção caso não promova a ação cautelar de antecipação de prova requisitada pela polícia em casos do tipo.

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ADI 7.192

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