ESCOLHA TORTUOSA

Comunidade jurídica dos EUA se decepciona com banca que se rendeu a chantagens de Trump

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24 de março de 2025, 9h55

Uma das bancas mais conceituadas dos Estados Unidos, a Paul Weiss decepcionou a comunidade jurídica dos Estados Unidos. O escritório, cujo nome completo é Paul, Weiss, Rifkind, Wharton & Garrison LLP, se rendeu à política de chantagens do presidente Donald Trump.

Banca se rendeu às chantagens de Trump e fez acordo com o governo

No início do mês, o republicano dedicou uma ordem executiva especialmente à Paul Weiss, uma banca famosa por defender causas liberais-democratas, ao representar clientes associados ao partido que antagoniza com os republicanos.

A ordem executiva, uma espécie de decreto presidencial, veio recheada de ameaças de retaliações, tais como as que fez contra as bancas Perkins Coie e Covington & Burling, que representaram adversários de Trump. Na cabeça do presidente, um dos pecados da Paul Weiss foi contratar um ex-promotor que atuou em uma ação criminal contra ele em Nova York.

Uma das ameaças de retaliação, entre as que constam no documento, foi a de cancelar as chamadas security clearances (espécie de credencial que garante aos advogados e empregados da banca acesso a informações classificadas do governo, bem como acesso a dependências de órgãos públicos federais). Sem isso, fica impossível buscar provas contra o governo.

Outra ameaça foi a de rescindir contratos da banca e de seus clientes com a administração pública. E proibir os órgãos públicos de assinar novos contratos com eles. A justificativa foi a de que a banca e seus clientes “usam os ganhos derivados desses contratos para subsidiar atividades que não se alinham com os interesses americanos”.

Trump também acusa a Paul Weiss de “discriminação racial” contra brancos por adotar programas de diversidade, equidade e inclusão (DEI). Isso viola, de acordo com o documento, duas ordens executivas anteriores, que pretendem extinguir todos os programas de DEI nos órgãos públicos e nas empresas que têm contratos com o governo.

Tudo isso foi escanteado na sexta-feira (21/3), depois que o chairman da Paul Weiss, Brad Karp, foi à Casa Branca para se render. Trump acolheu, com satisfação, a bandeira branca e concordou em cancelar a ordem executiva. O preço foi alto: Paul Weiss teve de aceitar todas as condições que ele impôs.

Toma lá, dá cá

A banca também se comprometeu a prestar serviços jurídicos pro bono para o governo, no valor de US$ 40 milhões. Terá, por exemplo, de defender os interesses do governo, tais como a iniciativa que Trump chama de “fairness in the Justice System” (algo como “honestidade no Sistema Judicial”,  que pode ser interpretado como “a favor de Trump e seu governo”).

A Paul Weiss se comprometeu a apoiar as iniciativas do governo contra os programas de diversidade e abandonar seu próprio programa. Para coibir suas atividades de “discriminação flagrante” contra brancos, deverá revisar suas práticas de contratação e emprego e pagar um perito de auditoria externo para fiscalizar se está cumprindo o trato.

O escritório deve também apoiar a força-tarefa para combater o antissemitismo e passar a representar clientes conservadores-republicanos, abandonando sua vocação democrata.

E, para consternação geral, deverá criticar publicamente o ex-sócio da banca Mark F. Pomerantz. Pelo acordo, a banca deve declarar a má conduta de Pomerantz, que participou das investigações criminais contra Trump (quando trabalhava na Promotoria de Manhattan), no caso do suborno a uma atriz pornô.

A capitulação da banca doeu. A Paul Weiss era uma banca admirada pela comunidade jurídica. Foi o primeiro escritório de advocacia em Nova York a misturar a classe de WASPs (white anglo-saxon protestants) com advogados judeus e de diversas minorias.

Também foram precursores na luta contra a desigualdade racial e de gênero ao empregar um advogado negro, uma advogada negra e a promover uma mulher à sócia. O escritório também trabalhou com o ex-ministro da Suprema Corte Thurgood Marshall, que era negro, no caso Brown v. Board of Education — o que acabou com a segregação formal nas escolas.

Difícil compreensão

Em comentários nas redes sociais ou em entrevistas a publicações, as reações de advogados e acadêmicos variaram de uma ou outra tentativa de compreensão a lamentos e críticas — algumas ácidas, como a de que o acordo que a banca fechou com Trump foi um ato de covardia.

Para alguns, foi uma atitude “absolutamente vergonhosa”, que vai deixar uma mácula na profissão jurídica; “um ataque na independência dos advogados e dos escritórios de advocacia”; e “uma mensagem ruim aos clientes de que os advogados podem capitular, em vez de defender a norma jurídica e os princípios éticos que devem orientá-los.”

Alguns acham que foi apenas uma decisão empresarial. O chairman da Paul Weiss, Brad Karp, declarou que a decisão se alinha com os princípios da banca, e a posição foi necessária para proteger seus clientes e empregados. Disse ainda que a banca preferiu evitar batalhas judiciais prolongadas, que poderiam prejudicar suas operações e seus serviços aos clientes.

A American Bar Association (ABA) não se manifestou sobre o caso da Paul Weiss. Mas divulgou uma declaração, no início do mês, condenando os esforços do governo Trump para minar os grandes escritórios de advocacia, porque “esses atos da Casa Branca negam aos clientes o acesso à Justiça e traem nossos valores fundamentais”. Com informações adicionais do Washington Post, The Hill e New York Times.

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