Opinião

Responsabilidade dos bancos digitais nos golpes virtuais: do REsp 2.124.423/SP

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  • é advogado sócio do escritório Ernesto Borges Advogados graduado em Direito pela Universidade Católica Dom Bosco (UCDB) especializado em Processo Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) e mestre em Direito com ênfase em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP).

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22 de março de 2025, 11h20

O Superior Tribunal de Justiça recentemente julgou o Recurso Especial nº 2.124.423/SP, um caso que trouxe à tona a questão da responsabilidade dos bancos digitais em fraudes eletrônicas. O recorrente buscava indenização por danos materiais decorrentes do chamado “golpe do leilão falso”, argumentando que a facilidade na criação de contas digitais teria favorecido a prática criminosa. No entanto, o STJ negou provimento ao recurso, afastando a responsabilidade objetiva do banco demandado. A decisão reforça a necessidade de um equilíbrio entre inovação financeira e segurança, um tema que se torna cada vez mais relevante no contexto do avanço dos serviços bancários digitais.

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Desembargador manteve decisão que condenou banco por danos morais

O crescimento dos bancos digitais revolucionou o setor financeiro, proporcionando acessibilidade e agilidade nas transações bancárias. No entanto, essa inovação também trouxe desafios, principalmente no que diz respeito à segurança contra fraudes eletrônicas. O caso analisado pelo STJ envolveu um consumidor que acreditou ter adquirido um veículo em um leilão virtual fraudulento e transferiu o valor para uma conta bancária aberta em um banco digital, que teria sido utilizada pelos criminosos. O recorrente alegava que a facilidade na abertura dessas contas digitais facilitou a concretização do golpe, caracterizando falha na prestação do serviço bancário.

Decisão dos tribunais

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) já havia negado provimento ao pedido de indenização, sustentando que o banco não poderia ser responsabilizado, pois havia adotado procedimentos compatíveis com a regulamentação vigente para a abertura de contas digitais. A decisão foi mantida pelo STJ, que considerou que a instituição financeira não falhou no cumprimento de seus deveres regulatórios. Segundo o entendimento da ministra relatora Nancy Andrighi, a Resolução 4.753/19 do Banco Central determina que as instituições financeiras devem verificar e validar a identidade dos titulares da conta, mas não especifica quais documentos devem ser exigidos para esse processo. Como o banco cumpriu com as exigências normativas, não se pode imputar falha na prestação do serviço.

Além disso, o STJ afastou a aplicação da Súmula 479, que prevê a responsabilidade objetiva das instituições financeiras por fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias. O Tribunal entendeu que, no caso concreto, a relação entre a vítima e o banco era indireta, pois o consumidor não era correntista da instituição financeira. Dessa forma, não haveria um dever de monitoramento das transações em questão, o que diferenciou o caso de outros precedentes em que a responsabilidade dos bancos foi reconhecida.

A decisão não foi unânime. Os ministros Moura Ribeiro e Humberto Martins divergiram do entendimento majoritário, argumentando que a teoria do risco da atividade deveria ser aplicada para responsabilizar o banco. Para eles, a instituição financeira, ao oferecer um serviço que pode ser utilizado para fraudes, assume os riscos decorrentes dessa atividade e deve responder pelos danos causados aos consumidores.

Restrição de responsabilidade dos bancos

O julgamento do REsp 2.124.423/SP reforça a tendência do STJ em restringir a responsabilidade objetiva dos bancos digitais em casos de fraudes eletrônicas, impondo ao consumidor um dever maior de cautela ao realizar transações financeiras. Isso gera um desafio para os usuários desses serviços, que devem redobrar a atenção ao efetuar pagamentos e transferências, especialmente em transações online.

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Por outro lado, a decisão destaca a necessidade de aprimoramento regulatório para garantir um equilíbrio entre inovação tecnológica e segurança. A crescente digitalização do setor bancário exige que as instituições aprimorem continuamente seus mecanismos de prevenção a fraudes, sem inviabilizar a inclusão financeira promovida pelos bancos digitais.

O caso analisado pelo STJ ilustra bem as complexidades envolvidas na responsabilização das instituições financeiras no ambiente digital. Embora a decisão tenha sido favorável ao banco, o debate sobre a responsabilidade dos bancos digitais em fraudes eletrônicas permanece aberto, exigindo constante adaptação do ordenamento jurídico às novas realidades do mercado financeiro.

Autores

  • é advogado, sócio do escritório Ernesto Borges Advogados, graduado em Direito pela Universidade Católica Dom Bosco (UCDB), especializado em Processo Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) e mestre em Direito, com ênfase em Direito Processual Civil, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP).

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