TCU retomará nos estados Programa Diálogo Público com prefeituras
18 de março de 2025, 20h44
Apesar de encarados como limitações à administração pública, os critérios dos Tribunais de Contas (TC’s) também são guias de otimização da capacidade de entrega de políticas públicas. As auditorias de conformidade legal cobram o cumprimento das leis e normas que buscam aprimorar a efetividade da gestão. Nas auditorias operacionais (ou de resultado), avalia-se esta efetividade, o planejamento, da capacidade de entrega e melhor uso dos investimentos.

Isso mostra a importância da retomada do Programa Diálogo Público, onde o TCU dialoga com prefeitos em eventos presenciais organizados nos Tribunais de Contas estaduais (TCE’s), pois permite a assimilação destes critérios pelos gestores municipais e suas equipes. Foi anunciada na primeira quinzena de fevereiro, e apresentada no Encontro de Novos Prefeitos e Prefeitas, evento organizado pelo governo federal entre os dias 11 e 13 do mesmo mês, e encerrado por mesa composta pelo TCU e pela Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon).
É sabido que os responsáveis por avaliar as prefeituras são os TCE’s, mas, por outro lado, boa parte dos referenciais orientadores são elaborados na instância federal e adaptados para a realidade local pelo Instituto Rui Barbosa, em conjunto com a Atricon e outras entidades representativas dos órgãos de auditoria externa públicos. Uma ação conjunta entre instância federal e seus respectivos estaduais, com finalidade didática para os municípios, levando em conta as transformações no mundo e na digitalização cada vez mais consolidada nos processos decisórios, vai ao encontro da tendência recente em aproximar gestores e a sociedade civil dos Tribunais de Contas.
Diálogo entre Tribunais de Contas, administração pública e sociedade
O aperfeiçoamento desta conexão entre as auditorias externas públicas e seus jurisdicionados (e os cidadãos em geral) é uma tarefa delicada por dois motivos: a tendência das burocracias à concentração de poder via falta de clareza quanto a suas regras e procedimentos (assimetria de informação) e o poder de articulação dos que são auditados, pois são atores políticos.
Um estudo criterioso a respeito desta tendência à invisibilidade procedimental dos TCs foi elaborado por Diones da Rocha, Robson Zuccolotto e Marco Antonio Teixeira em 2020 no Centro de Estudos em Administração Pública e Governo CEAPG (Eaesp-FGV), identificando um comportamento de “panótipo”, que podem ver tudo e não podem ser vistos por ninguém. Eles observam mudanças na forma de relacionamento com o mundo, agora mais aberto.
Este direcionamento mais didático e conectado com as mudanças contemporâneas também pode ser observado em dois documentos publicados em 2019: a Declaração de Moscou, síntese do XXIII Congresso Internacional das Entidades Fiscalizadoras Superiores (Incosai, da Intosai, órgão consultivo das Nações Unidas); e a Carta de Foz do Iguaçu, de abrangência continental, do I Congresso Internacional dos Tribunais de Contas. Ambas abordam dilemas das economias e das esferas públicas num contexto de digitalização, e sobre como os “tribunais” podem contribuir para que o poder público os supere. Existe, sim, uma preocupação para garantir a independência dos órgãos em relação aos administradores públicos, mas agora estimulando a interação e estabelecendo limites de integridade.
Programa Diálogo Público
É neste contexto que o Programa Diálogo Público constitui-se como esforço fundamental de aproximação com os representantes legitimamente eleitos. Está dividido em seis eixos temáticos: três de interesse público, relacionados aos resultados das políticas finalísticas (entregas diretas de equipamentos e serviços para a população) e três temas transversais, voltados para a conformidade dos procedimentos e à responsabilidade fiscal. São os mesmos do anterior Programa TCU+Cidades, o que permite acúmulo de experiências sobre os temas, que são especificamente os seguintes:

1) Interesse público
- Educação: trata das atribuições municipais previstas na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9.394/1996), na Resolução 3/1997 da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, no Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) e no Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE);
- Saúde: como o SUS tem contribuições obrigatórias da União, estados e municípios, objetiva a adequação legal e normativa destes últimos, sobretudo em decorrência da intensidade de contratualização políticas e do alto valor agregado dos insumos e equipamentos do setor;
- Infraestrutura das Cidades: prioriza a capacitação para articular o complexo arranjo de instituições envolvidas na aprovação e execução de obras públicas, como ministérios, Codevasf, Trensurb e CBTU;
Interessante notar que destes três tópicos, os dois primeiros referem-se a sistemas nacionais policêntricos (que possuem diferentes arenas de decisão, em hierarquia), que integram as esferas municipal, intermunicipal, estadual e a União, são referências para os demais sistemas a serem criados e, por isso, necessariamente são avaliados pelo TCU e TCE’s. Os relacionados aos temas transversais são os mais sensíveis à responsabilidade fiscal, relacionados ao planejamento propriamente dito.
2) Temas transversais
- Transferências da União: trata das mais diversas formas de transferências do governo federal para estados, municípios e organizações da sociedade civil sem fins lucrativos, de suas mais variadas fontes (ministérios e autarquias);
- Contratações Públicas: tem suas atenções concentradas na implementação da Nova Lei de Licitações (Lei 14.133/2021), ainda não plenamente adotada pelas prefeituras.;
- Finanças Públicas: focada no melhor entendimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, ancorada na Constituição, e o equilíbrio entre suas orientações e as várias políticas finalísticas fundamentais que o gestor precisa realizar, em conformidade com a Lei de Diretrizes Orçamentárias e a Lei Orçamentária Anual.
Existem materiais didáticos a respeitos destes tópicos tanto no site do TCU quanto nos dos TCE’s e do Instituto Rui Barbosa, isto é um fato. Por outro lado, quando esta aprendizagem sai de uma tela e acontece em um encontro presencial com um prefeito, junto a seus pares, é como se toda esta estrutura das auditorias externas públicas passasse a fazer parte do processo político.
Interlocução com os TC’s e o aprimoramento da democracia
Pensando estas entidades como auxiliares do Poder Legislativo no papel de fiscalização da execução dos orçamentos, os encontros do Diálogo Público podem fortalecer a adesão às boas práticas de gestão e governança públicas, contribuindo para a qualificação de nossa democracia e trazendo ao debate questões que realmente fazem diferença do cotidiano dos cidadãos. Apesar de ainda estar em um momento de reinício, seus eventos pelos estados já estão sendo marcados, e seus detalhes já consolidados podem ser conferidos neste link.
Existe uma infinidade de estudos desenvolvidos pelas entidades associativas ligadas aos TC’s e de pesquisas sobre eles desenvolvidas em espaços de excelência acadêmica. O esforço de organizar e apresentar de modo compreensível estes conteúdos de maneira didática e atraente contribui para o aprimoramento da democracia. Permite pensar a política distanciando-se dos calores eleitorais, mesmo que estes sempre deverão estar ao alcance dos olhos. São estes ânimos de candidaturas e governos que o Estado precisa moderar e acalmar, para que convergências sejam possíveis.
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