Opinião

Pagamentos do mecanismo de solidariedade para Fifa: classificação da operação no BC e retenção do IR

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7 de março de 2025, 16h22

As transações internacionais de direitos econômicos de atletas profissionais são corriqueiras no mercado do futebol, as quais implicam na realização de diversas operações financeiras pelos clubes, seja de recebimento de receitas quanto de remessas ao exterior, decorrentes de aquisições pelos direitos desses profissionais.

Divulgação

A Federação Internacional de Futebol (Fifa), por meio da Câmara de Compensação, sediada na França, regula e gerencia as transações internacionais do mercado futebolístico, por meio do “Transfer Matching System”, concentrando os pagamentos oriundos das transferências dos atletas. Assim, quando há a transferência de um atleta profissional para um determinado país, os pagamentos feitos pelos clubes são intermediados pela Câmara, garantindo a clareza e segurança da operação.

Em tais operações, a Câmara de Compensação da Fifa estabelece que o clube que realiza a transferência deve realizar o pagamento do percentual fixo de 5% da transação internacional a título de compensação ao clube formador do profissional transferido[1]. Tal compensação é denominada como “mecanismo de solidariedade” (solidarity contribution).

Tributação do mecanismo de solidariedade

O pagamento do mecanismo de solidariedade tem repercussões tributárias e regulatórias relevantes que devem ser atentamente observadas pelos clubes de futebol.

O pagamento do aludido mecanismo de solidariedade é intermediado por instituições financeiras contratadas pelo clube, já que a transação internacional implica numa operação de câmbio. Tais instituições são responsáveis pelas respectivas retenções dos tributos incidentes sobre a operação, que, em síntese, são o imposto sobre operações financeiras (IOF-Câmbio) e o imposto de renda retido na fonte (IRRF).

Em relação ao IOF-Câmbio não há maiores discussões. Há a retenção do imposto sob a alíquota de 0,38% sobre o valor da operação de câmbio.

Spacca

Já em relação à retenção do imposto de renda, é relevante o correto enquadramento perante o Banco Central (BCB) da operação de remessa de valores ao exterior para o pagamento do percentual do mecanismo de solidariedade, pois há impacto direto sobre a alíquota do IRRF aplicada pela instituição financeira.

Classificação do Banco Central

O BCB, por meio das notas auxiliares para classificação de operação de câmbio, classifica e lista as operações de remessas internacionais de acordo com regulamentação própria, com base em alguns critérios, dentre eles a finalidade da operação.

As remessas internacionais decorrentes do pagamento do mecanismo de solidariedade da FIFA integram os custos decorrentes dos direitos econômicos do atleta profissional.

Nos termos do artigo 18 da Instrução Normativa 1.455/2014 da Receita Federal, que trata sobre a tributação dos pagamentos referentes aos direitos pela transferência de atleta profissional, as importâncias pagas ou remetidas para o exterior, pela aquisição ou pela remuneração, a qualquer título, de atleta profissional estão sujeitas à retenção do imposto de renda na fonte sob alíquota de 15%:

Capítulo XVII Dos Direitos pela Transferência de Atleta Profissional

Art. 18. Sujeitam-se à tributação de imposto sobre a renda na fonte, à alíquota de 15% (quinze por cento), as importâncias pagas, creditadas, entregues, empregadas ou remetidas para o exterior, pela aquisição ou pela remuneração, a qualquer título, de qualquer forma de direito, inclusive na hipótese de transferência de atleta profissional.

Diante de tal previsão normativa e a finalidade da operação internacional realizada para o pagamento do mecanismo de solidariedade da Fifa, qual seja, a transação internacional dos direitos econômicos do atleta profissional, a operação de câmbio deve ser classificada sob o código 47922 “Direitos econômicos e federativos de atletas profissionais”, da lista do Banco Central.

Tal classificação garante que a retenção do imposto de renda corresponderá a 15% sobre o valor da operação, nos termos do do artigo 18 da IN RFB 1.455/2014.

Risco de elevar imposto

Apesar disso, não raramente, as instituições financeiras intermediadoras das remessas internacionais relacionadas a direitos econômicos de atletas classificam unilateralmente as operações em códigos diversos, o que pode elevar o imposto de renda retido na fonte à alíquota de 25%, tornando (mais) custoso o mecanismo de solidariedade da Fifa.

Nessa hipótese, os clubes de futebol têm base legal para afastar a classificação incorreta da operação pela instituição financeira.

O artigo 4º, §2º, da Lei 14.286/2021[2] determina que é de responsabilidade do cliente a classificação da finalidade da operação no mercado de câmbio, na forma prevista no regulamento do Banco Central[3]. Além disso, no § 3º do mesmo artigo, há a previsão de que as instituições financeiras autorizadas a operar no mercado de câmbio devem prestar orientações e suporte técnico aos seus clientes sobre a correta classificação da finalidade da operação[4]; mas tais instituições não estão autorizadas a classificar unilateralmente a finalidade da operação.

A correta classificação das remessas internacionais do mecanismo de solidariedade da Fifa é essencial para evitar que os clubes de futebol se submetam a retenções tributárias indevidas. Imprescindível, pois, que os clubes profissionais se atentem à correta classificação da operação e busquem suporte jurídico para assegurar a conformidade regulatória e eficiência tributária das operações internacionais envolvendo a transferência de atletas.

 


[1] FIFA Clearing House Regulations: 11.4 For the purposes of calculating the Allocation Statement, the amount declared in the proof of payment will be considered to reflect the respective transfer compensation (or instalment thereof), with 5% as solidarity contribution having been withheld by the club making the payment, in accordance with article 1 paragraph 1 of Annexe 5 to the RSTP.

[2] Lei 14.286/2021: Art. 3º […] § 2º É de responsabilidade do cliente a classificação da finalidade da operação no mercado de câmbio, na forma prevista no regulamento a ser editado pelo Banco Central do Brasil.

[3] Lei 14.286/2021: Art. 4º […] § 2º É de responsabilidade do cliente a classificação da finalidade da operação no mercado de câmbio, na forma prevista no regulamento a ser editado pelo Banco Central do Brasil.

[4] Lei 14.286/2021: Art. 4º […] § 3º As instituições autorizadas a operar no mercado de câmbio prestarão orientação e suporte técnico, inclusive por meio virtual, para os clientes que necessitarem de apoio para a correta classificação de finalidade da operação no mercado de câmbio, de que trata o § 2º deste artigo

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