O futuro do DeFi é a sua contraditória regulamentação?
5 de março de 2025, 16h14
O setor de finanças descentralizadas (DeFi) vem ganhando cada vez mais relevância no cenário econômico global.
Com a capacidade de replicar funcionalidades do sistema financeiro tradicional, as plataformas DeFi operam através de contratos inteligentes (smart contracts) registrados em redes blockchain.
Esses contratos nada mais são que códigos autoexecutáveis programados para realizar ações automáticas com base nas condições estabelecidas em sua programação.
Plataformas de empréstimos descentralizadas, por exemplo, operam a partir de contratos inteligentes que liberam empréstimos em criptoativos após a confirmação do depósito de uma garantia por parte do solicitante. Tudo isso através do registro das operações em redes blockchain, o que lhe garante transparência e segurança.
Com essa tecnologia, as plataformas eliminam intermediários antes necessários em operações tradicionais. No exemplo do empréstimo acima mencionado, elimina-se o intermediário responsável por verificar a ocorrência dos eventos do acordo de empréstimo e por executar suas condições.
Redução de custos
Ao proceder à eliminação desses intermediários, as plataformas DeFi contribuem para uma redução considerável nos custos desses serviços e operações. Ainda promovem o acesso global a serviços financeiros antes restritos a uma parcela bancarizada da população.
Não por acaso, são diversos os produtos e serviços atualmente oferecidos no ecossistema DeFi, como pagamentos, seguros, tokenização de ativos, remessas internacionais e gestão automatizada de fundos e portfólios.
No caso da gestão automatizada de fundos, por exemplo, contratos inteligentes otimizam investimentos em ativos digitais com códigos autoexecutáveis que não dependem da intervenção de gestores financeiros tradicionais. Em um só lance, diminuem-se os riscos e também os custos da operação.

Todos esses benefícios intrínsecos ao ecossistema DeFi demonstram que o setor chegou para ficar. E a crescente interoperabilidade entre redes blockchain indica que seu crescimento tende a ser cada vez maior.
Movimentação de stablecoins
A corroborar essa conclusão, em 2023 a Receita Federal apontou um crescimento vertiginoso na movimentação de stablecoins, criptoativos usualmente utilizados para a realização de operações no ecossistema DeFi. Segundo o órgão, somente naquele ano as stablecoins foram negociadas em patamar acumulado superior a R$ 271 bilhões, quase o dobro do volume do Bitcoin no mesmo período[1].
O acelerado crescimento dessas operações, no entanto, não tem passado despercebido dos órgãos estatais. No final de 2024, o Banco Central, órgão responsável pela regulamentação do mercado de ativos virtuais (Decreto nº 11.563/2023), propôs a alteração da Resolução nº 277[2] com o fim de equiparar as stablecoins ao câmbio tradicional.
Caso a proposta entre em vigor, corretoras de criptoativos que operam serviços de remessa internacional serão obrigadas a obter autorização de funcionamento junto ao Banco Central em uma clara indicação de que operações financeiras realizadas no ambiente descentralizado podem, em algum momento, ser obrigadas a seguir certas normas aplicáveis do sistema financeiro tradicional.
Regulamentação benéfica
Ainda que soe contraditório em um ambiente descentralizado, que opera à de autoridades centrais, a regulamentação de certos serviços e operações no ecossistema DeFi pode ser benéfica ao setor.
A ausência completa de regulamentação, por vezes, coloca desenvolvedores e usuários dessas plataformas em uma zona cinzenta sobre a conformidade legal de determinadas operações, como é o caso das remessas internacionais realizadas a partir de criptoativos.
Além disso, a ausência de regulamentação expõe o setor a riscos e vulnerabilidades capazes de afetar não apenas os usuários dessas plataformas, mas a economia como um todo.
Nesse sentido, vale atenção ao relatório divulgado pela empresa Chainalysis no ano passado, revelando que, naquele ano, um total de US$ 2,2 bilhões foram roubados a partir do uso de plataformas DeFi.
Lavagem de dinheiro
Outro relatório de 2021 indicou que 17% dos valores lavados via criptomoedas passaram por aplicações de finanças descentralizadas, evidenciando o potencial do setor para a prática de atividades ilícitas de lavagem de dinheiro.
O próprio FBI, inclusive, já emitiu alertas recomendando que investidores estudem as plataformas DeFi antes de utilizá-las, sugerindo aos desenvolvedores que submetam seus códigos a auditorias independentes.
A criação de um arcabouço regulatório mínimo poderia, portanto, estabelecer padrões de segurança às plataformas DeFi, exigir auditorias de contratos inteligentes e até mesmo estabelecer responsabilidades no seu desenvolvimento, trazendo maior confiança no setor.
Assim, regulamentações bem projetadas podem ser benéficas, sobretudo se voltadas a garantir maior segurança e transparência ao setor. Todavia, é essencial que qualquer regulamentação respeite a essência descentralizada do DeFi, evitando a replicação das barreiras burocráticas próprias dos sistemas centralizados, sob pena de frear o desenvolvimento de um setor com alto potencial disruptivo para a economia global.
[1] https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/assuntos/noticias/2023/outubro/criptoativos-receita-federal-detecta-crescimento-vertiginoso-na-movimentacao-de-stablecoins#:~:text=Pelos%20gr%C3%A1ficos%20acima%20%C3%A9%20poss%C3%ADvel,informada%20%C3%A9%20relativa%20ao%20USDT.
[2] https://www.gov.br/participamaisbrasil/consulta-publica-n-111
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