Supremo valida busca domiciliar e prisão feitas por guardas municipais
28 de janeiro de 2025, 21h49
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, considerou válida uma busca domiciliar feita por guardas municipais que encontraram drogas na casa de uma mulher no Paraná. Com isso, ele anulou a absolvição da ré e determinou que o Tribunal de Justiça do Paraná julgue novamente o recurso da defesa, mas agora levando em consideração a legalidade da prisão em flagrante e das provas dela decorrentes.
A decisão do ministro foi tomada em recurso extraordinário apresentado pelo Ministério Público do Paraná (MP-PR) contra a absolvição.
No caso analisado, os guardas faziam patrulhamento de rotina na cidade de Quatro Barras (PR) quando avistaram um homem em atitude suspeita, saindo da residência da mulher. Ao abordá-lo, encontraram um cigarro de maconha e três pedras de crack. Ele, então, informou aos agentes que havia comprado as drogas naquele local. Os guardas se dirigiram à residência da mulher e encontraram, num guarda-roupa, cerca de 20 gramas em pedras de crack.
A mulher foi condenada em primeira instância a quatro anos e quatro meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, por tráfico. Mas, no julgamento de apelação da defesa, o TJ-PR absolveu a acusada por entender que os guardas atuaram fora de sua atribuição, como se fossem policiais militares em ação ostensiva, o que levou à anulação das buscas e das provas encontradas.
Fundadas suspeitas
Ao analisar o recurso do MP-PR, o ministro não constatou ilegalidade na ação dos guardas municipais, já que foi comprovado que havia fundadas suspeitas para a busca pessoal. O relator citou três precedentes do Supremo para fundamentar sua decisão.
No primeiro, o tribunal reconheceu que as guardas municipais executam atividade de segurança pública. O segundo é uma decisão da 1ª Turma do STF (RE 1.468.558), de sua relatoria, em que foi reconhecida a validade da revista pessoal e da prisão feitas por guardas municipais em casos de flagrante envolvendo tráfico de drogas.
O ministro citou também a orientação adotada pela corte de que a justa causa para a conduta dos agentes não exige a certeza da ocorrência de delito, mas fundadas razões a respeito do cometimento de crimes. Com informações da assessoria de comunicação do STF.
Jurisprudência de STF e STJ
As atribuições das guardas municipais têm se tornado tema recorrente de julgados no STF e também no Superior Tribunal de Justiça. Em 2021, o Supremo autorizou o porte de arma de fogo para todas as guardas municipais do país (ADI 5.948, ADI 5.538 e ADC 38).
Até então, isso era restrito às capitais dos estados; aos municípios com mais de 500 mil habitantes; e aos municípios com população entre 50 mil e 500 mil, mas somente quando os guardas estivessem em serviço.
As cortes também têm se debruçado sobre casos que tratam da validade de provas obtidas por esses agentes em casos de tráfico de drogas. O fenômeno se insere em um contexto de expansão das guardas ante o encolhimento das polícias.
Desde 2022, o STJ vinha estabelecendo uma série de limites à atuação das guardas. No entanto, conforme mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico, a corte passou a revisar sua jurisprudência em função de uma tendência do STF de validar ações de policiamento ostensivo pelos guardas municipais.
Em outubro, a 1ª Turma do Supremo considerou, por maioria, válidas as provas obtidas por guardas municipais em uma busca domiciliar. No caso concreto, o acusado teria dispensado entorpecentes embalados ao avistar os agentes municipais, que, posteriormente, foram à residência do suspeito e encontraram o material ilícito.
Ainda na ocasião, o ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, votou para cassar um acórdão da 5ª Turma do STJ que absolvia o suspeito. Para ele, a guarda atuou legalmente ao efetuar a prisão em flagrante, uma vez que o tráfico de entorpecentes é crime permanente e, portanto, aquele que o comete continua em estado de flagrância.
Em junho de 2022, no entanto, também em decisão da 1ª Turma, o STF optara por restabelecer acórdão do TJ-SP, que absolveu um suspeito de tráfico. Ele havia sido preso em flagrante por guardas municipais.
Na ocasião, a guarda o abordou por causa de uma denúncia anônima, mas não encontrou nada ilícito em busca pessoal. Em seguida, os agentes foram a um terreno baldio que o suspeito teria ocupado, onde acharam drogas atribuídas a ele.
Também relator do caso, Alexandre entendeu à época que o flagrante foi legal. Já o ministro Luís Roberto Barroso, que proferiu o voto-vista vencedor, julgou que a prisão ultrapassou o limite do flagrante delito, que autorizaria a atuação de qualquer pessoa, e exigiu diligências investigativas, o que foge da competência constitucional dos agentes.
Policiamento ostensivo
No período entre as duas decisões divergentes, em 2023, o Plenário do STF decidiu, na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 995, que as guardas municipais integram o Sistema de Segurança Pública.
Porém, para o ministro Edson Fachin, o reconhecimento das guardas como integrantes do Susp não as autoriza a exceder sua competência, em consonância com o entendimento de especialistas ouvidos pela ConJur.
Já em decisão monocrática mais recente, o ministro Flávio Dino entendeu ter sido legal a busca pessoal feita pela guarda contra um suspeito de roubo, por haver fundadas razões para isso.
Na ocasião, o magistrado cassou acórdão da 6ª Turma do STJ que absolveu o suspeito ao ver ilegalidade na busca. “Fica evidente a incongruência do ato reclamado com a ADPF 995, pois teríamos um órgão de segurança pública de mãos atadas para atender os cidadãos na justa concretização do direito fundamental à segurança”, disse Dino.
Em outro caso, o Supremo tem 4 votos a 1 pela validade da atuação policialesca das guardas municipais (RE 608.588). O caso tem repercussão geral (Tema 656).
Há duas correntes formadas: a do ministro Luiz Fux, relator da matéria, votou no sentido de que é constitucional atribuir às guardas o “exercício do policiamento preventivo e comunitário diante de condutas potencialmente lesivas a bens, serviços e instalações do município”.
Na prática, o voto de Fux permite, por exemplo, buscas pessoais, atividade ostensiva cumprida por policiais militares. E também permite a validação de provas obtidas em atuações desse tipo. O relator foi seguido pelos ministros Dias Toffoli, Flávio Dino e André Mendonça.
A outra corrente foi inaugurada pelo ministro Cristiano Zanin. Para ele, as guardas não têm atribuições ostensivas, nem investigativas.
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RE 1.532.700
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