Trump sofre primeira derrota na Justiça dos Estados Unidos
24 de janeiro de 2025, 16h35
Um decreto que o presidente dos EUA, Donald Trump, assinou na tarde de segunda-feira (20/1), dia de sua posse, foi paralisado pela Justiça na manhã desta quinta-feira (23/1). Um juiz federal bloqueou temporariamente a “ordem executiva” de Trump, que pretende extinguir o direito por nascimento de filhos de imigrantes à cidadania.
“Essa ordem é flagrantemente inconstitucional. Francamente, tenho dificuldade em entender como membros da ordem dos advogados podem declarar que tal ordem é constitucional. Isso me deixa perplexo”, disse, ao anunciar sua decisão, o juiz federal John Coughenour, de um tribunal federal em Seattle, em referência aos procuradores do Departamento de Justiça (DOJ) que defenderam o decreto.
“Sou juiz há mais de quatro décadas. Não consigo me lembrar de algum outro caso em que a questão apresentada [sobre a inconstitucionalidade do decreto] fosse tão clara como essa. Onde estavam os advogados quando essa decisão foi tomada?”, disse ao juiz, em referência à equipe jurídica do governo Trump.
A liminar temporária bloqueia a entrada em vigor do decreto por duas semanas. Depois disso, o juiz deverá emitir outra medida liminar com validade até a decisão do mérito da questão.
“Há uma alta probabilidade de que os peticionários serão bem-sucedidos em seu caso”, escreveu o juiz em sua decisão. Os peticionários são quatro estados — Washington, Arizona, Illinois e Oregon. Para chegar a esse entendimento, o juiz se baseou no texto da 14ª Emenda da Constituição e em precedente da Suprema Corte.
A 14ª Emenda estabelece: “Todas as pessoas nascidas ou naturalizadas nos Estados Unidos e sujeitas à jurisdição do mesmo são cidadãos dos Estados Unidos e do estado onde residem. Nenhum estado deve aprovar ou executar qualquer lei que restrinja os privilégios ou imunidades dos cidadãos dos Estados Unidos”.
O precedente da Suprema Corte, estabelecido em United States v. Wong Kim Ark, declara que todas as pessoas nascidas nos Estados Unidos, mesmo que sejam filhas de imigrantes, são cidadãs dos EUA. Wong Kim Ark era filho de imigrantes chineses e, por isso, foi barrado pela imigração ao regressar de uma viagem internacional. Esse precedente resistiu por 126 anos a algumas tentativas de derrubá-lo.
A única exceção ao direito à cidadania por nascimento se aplica a filhos de diplomatas estrangeiros. A razão é a de que os diplomatas não estão sujeitos “à jurisdição dos Estados Unidos”. Em outras palavras, eles têm imunidade diplomática às leis do país.
Entendimentos diferentes
Os procuradores do DOJ alegam, em defesa do decreto, que os imigrantes ilegais, bem como turistas e estudantes com visto temporário, devem ser encaixados na exceção, porque não “estão sujeitos à jurisdição dos Estados Unidos”.
Os procuradores dos estados argumentam que esse não é o caso. Se fosse, os imigrantes ilegais não poderiam ser presos e processados por qualquer crime (como os diplomatas estrangeiros).
Em sua petição, os procuradores-gerais dos estados citaram um testemunho do procurador-geral Walter Dellinger ao Congresso, em 1995. Dellinger disse aos parlamentares que qualquer lei que limite o direito à cidadania por nascimento “seria, em princípio, inconstitucional”.
E que “mesmo uma emenda à Constituição iria contrariar frontalmente a história e as tradições da nação” — uma linha de entendimento que tem sido usada com frequência pela atual maioria conservadora da Suprema Corte para tomar decisões a favor dos republicanos.
Em entrevista coletiva, que concedeu após o anúncio da decisão do juiz federal, Trump declarou: “Obviamente, vamos recorrer. Eles usaram um certo juiz em Seattle, eu acho. Certo? Não há surpresa quanto a esse juiz”.
Trump pode ter concluído que os peticionários usaram a tática de judge shopping, recorrendo a um juiz liberal-democrata. Mas, não. O juiz John Coughenour é conservador e foi nomeado pelo presidente republicano Ronald Reagan.
Esse caso no tribunal federal de Seattle (Washington) é apenas uma de várias ações judiciais contra o decreto de Trump. Entre elas, uma ação similar que foi movida por uma coalisão de 18 estados em um tribunal federal em Massachusetts e pelo menos três ações movidas por organizações de defesa de direitos civis, entre elas a poderosa American Civil Liberties Union (ACLU).
Com informações adicionais do The Washington Post, The New York Times e CNN.
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