Justiça Tributária

Permanecem os problemas com as contribuições aos fundos estaduais

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20 de janeiro de 2025, 8h00

O artigo 136 do ADCT, criado pela EC 132/23, permitiu que os estados mantivessem os Fundos Estaduais “destinados a investimentos de infraestrutura e habitação e financiados por contribuições sobre produtos primários e semielaborados estabelecidas como condição à aplicação de diferimento, regime especial ou outro tratamento diferenciado”, relativos ao ICMS, permitindo que os Estados pudessem “instituir contribuições semelhantes, não vinculadas ao referido imposto”, impondo condições.

Uma dessas condições é que a “alíquota ou o percentual de contribuição não poderão ser superiores e a base de incidência não poderá ser mais ampla que os das respectivas contribuições vigentes em 30 de abril de 2023”.

No apagar das luzes de 2024, dia 26 de dezembro, por meio da Lei nº 10.837/24, o estado do Pará modificou a Lei 5.674/91 que rege o Fundo de Desenvolvimento Econômico do Estado, para incluir o segmento agropecuário como contribuinte dessa contribuição (artigo 3º-K e Anexo II), que denominou de não-compulsória, mas que possui todas as características de compulsoriedade.

A alegação de “falsa compulsoriedade” decorre do simples fato de que, com a adesão de uma empresa a qualquer desses mecanismos de benefícios fiscais, a outra compulsoriamente deverá a ele aderir, sob pena de quebra da dinâmica concorrencial entre as empresas.

Daí surge a questão: é constitucional tal ampliação da base de incidência? Tudo indica que não, pois as contribuições destinadas a tais fundos deveriam ser mantidas conforme “vigentes em 30 de abril de 2023”, consoante o próprio texto constitucional (artigo 136, I, ADCT):

“Art. 136. Os Estados que possuíam, em 30 de abril de 2023, fundos destinados a investimentos em obras de infraestrutura e habitação e financiados por contribuições sobre produtos primários e semielaborados estabelecidas como condição à aplicação de diferimento, regime especial ou outro tratamento diferenciado, relativos ao imposto de que trata o art. 155, II, da Constituição Federal, poderão instituir contribuições semelhantes, não vinculadas ao referido imposto, observado que:

I – a alíquota ou o percentual de contribuição não poderão ser superiores e a base de incidência não poderá ser mais ampla que os das respectivas contribuições vigentes em 30 de abril de 2023;”

O estado do Pará possui o Fundo de Desenvolvimento do Estado desde 1991 (Lei 5.674/91), que cumpre as funções de ser um fundo de infraestrutura.

Spacca

Ocorre que, na data estabelecida pelo artigo 136, ADCT, que foi em 30 de abril de 2023, as contribuições devidas ao FDE do estado do Pará apenas incidiam sobre o segmento da mineração, e não sobre o segmento agropecuário.

Isso viola o inciso I do artigo 136, ADCT, acima transcrito, pois uma das condições estabelecidas é que a “alíquota ou o percentual de contribuição não poderão ser superiores e a base de incidência não poderá ser mais ampla que os das respectivas contribuições vigentes em 30 de abril de 2023”.

É translucido que a Constituição foi infringida, pois: (1) foi ampliada a base de incidência, em razão da inclusão do segmento agropecuário que antes não estava obrigado ao pagamento dessa contribuição, e (2) o percentual de contribuição foi ampliado, pois o que antes era zero passou a incidir, obrigando ao pagamento na forma do Anexo II da nova norma.

Há outro aspecto importante a considerar. A nova lei alterou a norma para: “‘Total Saídas’ é a quantidade de minérios em toneladas, relativa à saída ao exterior, por minério, constante nas Notas Fiscais Eletrônicas (NF-e)”. A redação é idêntica para o segmento agropecuário. Ou seja, tanto para a mineração quanto para o segmento agropecuário, a incidência da contribuição para o Fundo ocorre apenas sobre saídas ao exterior.

Neste aspecto surge outro problema jurídico, referente à imunidade das exportações. O Supremo Tribunal Federal apreciou o assunto na ADI 6.365/TO, quando declarou inconstitucional o artigo 7º da Lei 3.617/2019 do estado do Tocantins, que determinava o recolhimento ao Fundo Estadual do Transporte (FET) uma contribuição semelhante à do Pará, inclusive com destino à exportação ou equiparadas. Foi decidido por unanimidade (julgamento virtual de 2 a 9/2/2024) que essa contribuição seria, na verdade, um adicional de ICMS, tendo o Plenário afirmado que “O adicional do ICMS em questão incide inclusive sobre operações de saída de mercadorias com destino à exportação ou equiparadas à exportação, em manifesta afronta ao disposto no artigo 155, § 2º, X, “a”, da Constituição Federal, que estabelece imunidade em relação ao ICMS para as operações que destinem mercadorias ao exterior”. A decisão foi que se trata de um adicional do ICMS travestido de contribuição, e que, é inconstitucional sua cobrança sobre as exportações.

Desconheço se outros estados adotaram procedimentos semelhantes nessa virada de ano, mas esse é um precedente importante, mal aprovado o novo texto constitucional, e sem sua plena aplicabilidade. Infelizmente outras virão, contrariando o que foi vastamente alardeado. Fique atento.

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