Quando a preliminar (do processo) é prejudicial (do recurso)
19 de janeiro de 2025, 7h14
Preliminar é o que vem antes do limiar, do limite, da fronteira. Etimologicamente deriva de prae (antes) e limen (soleira), portanto, antes da soleira da porta.
O limen, na Roma antiga, representava o limiar entre o ambiente interno e o ambiente externo, a fronteira da defesa do ambiente sagrado do lar.
De limen vem também a palavra liminar, porque é concedida no limiar, vale dizer, no início do processo, antes do contraditório.
Mas não é só a preliminar que antecede o mérito: preliminares e prejudiciais são espécies do gênero prévias e enfrentadas antes do mérito.
No processo, as preliminares condicionam a apreciação do mérito da causa (v.g. a capacidade processual para a apreciação do direito ao crédito), enquanto as prejudiciais influenciam o resultado do mérito da causa, ou seja, a procedência ou a improcedência do pedido (v.g., a inconstitucionalidade da lei que criou o tributo para a declaração da inexistência do débito tributário).
Já nos recursos, as preliminares são constituídas pelos pressupostos recursais (cabimento, legitimidade recursal, interesse recursal, tempestividade, regularidade formal, preparo e ausência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer) e condicionam a apreciação do mérito recursal – o conhecimento ou o não conhecimento do recurso.
Já as prejudiciais normalmente dizem respeito à existência de error in procedendo (decisão tida como ilegal, v.g., sentença extrapetita) ou error in judicando (decisão tida como injusta, em razão de uma errônea interpretação do fato ou do direito, v.g., decisão que reconhece a inconstitucionalidade de uma norma ajustada à Constituição) e influenciam o resultado do mérito recursal – o provimento (com a declaração de nulidade ou a reforma da decisão recorrida) ou o não provimento do recurso.
Com frequência se recorre alegando que o juiz não poderia julgar o mérito da causa em razão da falta de uma condição da ação ou de um pressuposto processual. Quando isso acontece, não é incomum o tribunal inadmitir o recurso e decidir sem resolução do mérito.
Ocorrer que condições da ação e pressupostos processuais integram o campo das preliminares ao mérito da causa – condicionam a apreciação do mérito da causa. Portanto, não integram o campo das preliminares ao mérito recursal – não condicionam a apreciação do mérito recursal.
Para que o tribunal declare a falta de um pressuposto processual ou de uma condição da ação, deve, antes, conhecer do recurso.
Mesmo quando se dá o efeito translativo, por meio do qual o tribunal conhece, de ofício, de uma matéria de ordem pública, o recurso deve ser previamente conhecido.
Uma diferença importante: acórdão de recurso não conhecido pode desafiar ação rescisória por vício relacionado à inadmissibilidade recursal (inciso II do § 2⁰ do artigo 966 do CPC) – e a decisão recorrida será rescindível por vício relacionado à inadmissibilidade do processo –, enquanto acórdão de recurso provido ou não provido, pode desafiar ação rescisória por vício relacionado à inadmissibilidade do processo, que constitua prejudicial recursal.
No idioma processual, aquilo que é preliminar para o processo, pode ser prejudicial para o recurso.
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