Tentativa de acordo na desapropriação é obrigatória
16 de janeiro de 2025, 8h00
Nos últimos anos, o Direito Administrativo brasileiro incorporou uma série de novos debates ampliando discussões sobre diversos domínios (v.g., terceiro setor, controles, leniências, integridade, consensos), os quais têm comparecido com mais frequência nas publicações especializadas da disciplina.
Não obstante isso, tópicos tradicionais do Direito Administrativo, tais como atos administrativos e medidas de intervenção na propriedade, continuam a despertar celeumas, especialmente quando tocados por legislações novas ou por decisões judiciais uniformizadoras da jurisprudência. É este o caso das desapropriações.
Com efeito, o Decreto-Lei 3.365/41 foi alterado pelas Leis 13.867/19, 14.421/22 e 14.620/23, trazendo a lume novas hipóteses sobre o procedimento da desapropriação, a natureza da imissão provisória na posse e a questão da retrocessão.
O texto de hoje versará sobre um dos pontos havidos na alteração promovida pela Lei 13.867/19, o da obrigatoriedade da tentativa de acordo na fase administrativa da desapropriação.
É sabido que o procedimento da desapropriação, nos termos do Decreto-Lei 3.365/41, acontece em duas fases, a da declaração de utilidade pública ou interesse social do bem (artigo 2º e 8º), e a das providências executórias de transferência do bem, subdividindo-se essa última em etapa administrativa e etapa judicial (artigo 10).
Tradicionalmente, a etapa administrativa da fase executória da desapropriação, embora utilizada para tentar um acordo entre expropriante e expropriado, sempre foi tratada como um acessório no procedimento, nos termos do artigo 10, Decreto-lei 3.365/41. De acordo com o dispositivo, “a desapropriação deverá efetivar-se mediante acordo ou intentar-se judicialmente no prazo de cinco anos, contados da data do decreto expropriatório, sob pena de caducidade”.
Com o advento da Lei n. 13.867/19, foi acrescentado o artigo 10-A ao Decreto-Lei 3.365/41, instituindo fase negocial obrigatória, necessariamente prévia ao processo judicial, com o objetivo de avaliar a possibilidade de acordo extrajudicial entre as partes interessadas. Eis o dispositivo:
“Art. 10-A. O poder público deverá notificar o proprietário e apresentar-lhe oferta de indenização.
§1º A notificação de que trata o caput deste artigo conterá:
I – cópia do ato de declaração de utilidade pública;
II – planta ou descrição dos bens e suas confrontações;
III – valor da oferta;
IV – informação de que o prazo para aceitar ou rejeitar a oferta é de 15 (quinze) dias e de que o silêncio será considerado rejeição;
§2º Aceita a oferta e realizado o pagamento, será lavrado acordo, o qual será título hábil para a transcrição no registro de imóveis.
§3º Rejeitada a oferta, ou transcorrido o prazo sem manifestação, o poder público procederá na forma dos arts. 11 e seguintes deste Decreto-Lei.”
A alteração legislativa, como se vê, torna a oferta administrativa da indenização obrigatória, e isso passa condicionar a validade do procedimento. Conforme explica Carvalho Filho, o artigo 10-A traz um “dever jurídico” ao Poder Público de apresentar a notificação para tentativa de acordo prévio, tratando-se de “ato vinculado”, a cuja prática não pode se furtar o expropriante, sob pena de “macular todo o processo dirigido à desapropriação” [1].
Sustenta o autor que o poder público expropriante está “compelido a seguir esse procedimento. Se não o fizer, estará maculado todo o processo dirigido à desapropriação. Como se trata de elemento obrigatório, a notificação não pode ser formalizada verbalmente” [2].
O que se quer dizer com isso, em outras palavras, é que a partir da Lei 13.867/19, deixar de se fazer a oferta administrativa da indenização ao particular, configura vício de forma ou procedimento da desapropriação (art. 2º, “b”, da Lei 4.717/65), ofendendo, a um só tempo, a legislação de regência (art. 10-A do Decreto-Lei n° 3.345/41), os princípios do devido processo legal e do contraditório (art. 5º, LIV e LV), autorizando que o proprietário acione o Poder Judiciário para corrigir a ilegalidade.
[1] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo, 38ª Edição. São Paulo: Atlas, 2024, ebook.
[2] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo, 38ª Edição. São Paulo: Atlas, 2024, ebook.
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