Colocando o dedo na ferida da litigância predatória empresarial
12 de janeiro de 2025, 17h13
A alta litigância judicial de empresas no Brasil é um reflexo direto da mentalidade e da cultura enraizadas nos gestores e executivos jurídicos, que muitas vezes preferem o litígio “ad eternum” como uma das formas de postergação e solução dos problemas da companhia.
Essa alta litigância predatória empresarial, que gera insegurança jurídica e morosidade processual, causando sobrecarga ao Judiciário brasileiro, poderia facilmente ser resolvida de forma extrajudicial ou pré-processual.
Em um contexto como esse, com as empresas de fato deixando para o Judiciário brasileiro a atribuição da solução de disputas, nas quais, na maioria das vezes, sabem que não tem razão e sabem que irão perder, sobrecarrega-se o Judiciário, aumentando e encarecendo o custo Brasil e contribuindo para o aumento do congestionamento processual no país, o que impacta negativamente a economia.
Recentemente, o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, em evento empresarial e jurídico em São Paulo, fez uma observação dura e crítica ao afirmar que as empresas, de certa forma, “negociam para a insegurança jurídica” no Brasil. Essa declaração provocou uma reflexão sobre o comportamento das empresas diante do cenário jurídico brasileiro. O ministro sugere que, em vez de buscarem um ambiente jurídico mais seguro e claro, muitas empresas acabam utilizando a litigância como uma estratégia para resolver questões legais e protelar ao máximo que puder a solução do litígio, pois sabem que a incerteza das decisões judiciais pode ser um aliado nas disputas. Essa postura, por sua vez, alimenta e retroalimenta o ciclo de alta litigância, agravando ainda mais a sensação de insegurança jurídica no país e a imagem do Poder Judiciário.
A alta litigância, no entanto, não é vantajosa nem para as empresas e nem para o país, no fim das contas. Para as empresas, os custos com processos e custas judiciais, advogados e o risco de decisões desfavoráveis podem ser significativos.
Maiores litigantes
De acordo com o último relatório do Conselho Nacional de Justiça (atualizado em 6/12/2024), com os maiores litigantes do Brasil, novamente o sistema bancário se destaca, enquanto o banco Bradesco aparece como o maior litigante do setor no Brasil e um dos maiores em números absolutos entre todas as áreas.
É imperioso ressaltar que o Bradesco tem quase o dobro de novas ações passivas (nos últimos 12 meses) em relação ao segundo colocado, que é a Caixa Econômica Federal. E se formos analisar a quantidade absoluta de clientes, o Bradesco, de acordo com o relatório do Banco Central, tem pouco mais de 100 milhões de clientes, enquanto a CEF tem mais de 155 milhões.
Esse levantamento referenda e corrobora a afirmação de que temos, sim, uma postura e cultura beligerante, de uma pequena parte dos executivos jurídicos dos grandes conglomerados brasileiros, principalmente nos departamentos jurídicos do setor bancário.
Em vez de buscar soluções para melhorar o ambiente legal, de cooperação, de conciliação, muitas empresas acabam se acomodando a esse estado de coisas, utilizando-o em seu “benefício”.
Essa postura não contribui para a construção de um sistema jurídico mais seguro e previsível, mas sim para a manutenção de um estado de instabilidade que prejudica todos os envolvidos.
Leis mais justas
A criação de uma legislação mais transparente, a aplicação de leis mais justas e duras, junto à uniformização das interpretações pelas cortes, pode auxiliar na mudança da cultura existente e equilibrar essa relação.
Além disso, é essencial que o sistema judiciário se torne mais previsível em suas decisões, criando uma jurisprudência mais sólida e coerente. A estabilidade nas decisões é crucial para reduzir a sensação de imprevisibilidade e permitir um ambiente de negócios mais seguro.
A crítica de Alexandre de Moraes revela um status quo de um ciclo vicioso, no qual algumas empresas se aproveitam, protelam a solução do seu conflito interno e abusam do seu poder econômico e do direito de defesa, sendo que a parte hipossuficiente acaba geralmente “pagando a conta” da alta litigância.
A verdade é que essa postura contribui para a perpetuação dessa realidade. Para romper esse ciclo, é necessário que o Poder Judiciário como um todo adote medidas firmes que tragam maior previsibilidade, clareza e eficiência ao sistema jurídico, de modo que o Brasil possa criar um ambiente de negócios mais seguro e favorável ao crescimento econômico.
Encontrou um erro? Avise nossa equipe!