Poder monocrático

Governo dos EUA quer limitar ordens judiciais válidas para todo o país

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9 de janeiro de 2025, 12h32

O Departamento de Justiça (DOJ) dos Estados Unidos pediu intervenção da Suprema Corte para acabar com uma luta, de muitos anos, contra a prática de juízes federais de emitir ordens judiciais monocráticas com validade para todo o país (nationwide injunctions). Tais ordens são combatidas por governos democratas e republicanos.

A nationwide injunction é definida como uma ordem ou decisão judicial que impede o governo de implementar uma lei, um regulamento ou uma política, por tempo indeterminado (ou até que a disputa sobre o mérito de uma questão percorra todas as instâncias).

É uma espécie de liminar que impõe a obrigação de fazer ou não fazer alguma coisa, com a característica de afetar todos os habitantes e entidades do país, mesmo aqueles que não estão envolvidos ou não têm interesse em um determinado litígio.

Justiça dos EUA

Não há lei federal que proíba juízes de emitir ordens monocráticas

Não há lei federal que autorize juízes a emitir tais decisões monocráticas, mas também não há lei que os proíba de fazê-lo. A Suprema Corte nunca se pronunciou sobre a legalidade de tal prática. Há apenas uma luta persistente contra ou favor dela.

O uso de nationwide injunctions, também chamadas de universal injunctions ou national injunctions, estimula outra prática criticada em relatório pelo presidente da Suprema Corte, John Roberts: a de judge shopping — às vezes, apenas com o objetivo de conturbar a vida de um governo cujo partido está no poder.

Assim, entidades republicanas que querem impedir a execução de lei, regulamento ou política que foi aprovada por um governo democrata movem uma ação para derrubá-lo — normalmente, em alguma jurisdição específica do Texas.

Se a decisão, sempre favorável aos peticionários, for contestada em grau de recursos, ela cai no Tribunal Federal de Recursos da 5ª Região, que é a corte mais conservadora-republicana do país e a mais revertida pela Suprema Corte.

Se os peticionários são entidades democratas, elas movem uma ação contra medidas legislativas e políticas de um governo republicano em alguma jurisdição específica, em que o caso cairá nas mãos de um juiz liberal, nomeado por um presidente democrata.

Se a decisão, sempre favorável aos peticionários, for contestada em grau de recursos, ela cai no Tribunal Federal de Recursos da 9ª Região, que é a corte mais liberal-democrata do país e a segunda mais revertida pela Suprema Corte.

Veículo para contestar decisões monocráticas

O pedido para limitar o poder dos juízes federais de paralisar o governo não é a principal questão apresentada pelo DOJ à Suprema Corte. Ele está embutido no caso Garland v. Texas Top Cop Shop, em que seis peticionários (um indivíduo, três empresas, uma organização política e uma associação de classe) disputam a constitucionalidade da Lei de Transparência Corporativa (CTA — Corporate Transparency Act).

A CTA requer que toda empresa (entre as cerca de 32,6 milhões nos EUA) revele a identidade de qualquer proprietário que “exerça controle substancial” sobre ela. O objetivo da lei é o de facilitar o combate, pelas autoridades competentes, de atividades ilegais, tais como lavagem de dinheiro, financiamento de terrorismo e várias formas de fraudes.

O Congresso aprovou a lei, no final do governo de Donald Trump, com a justificativa de que “atores malignos tentam esconder a propriedade de empresas que promovem atividades ilegais”.

Em primeira instância, o juiz federal Amos Mazzant, do Distrito Leste do Texas, concedeu aos peticionários uma liminar proibindo a CTA e a Regra de Relatórios. Mazzant declarou que a CTA é inconstitucional, porque excede a autoridade do Congresso para “regulamentar o comércio entre os diversos estados”.

O Tribunal Federal de Recursos da 5ª Região, dominado por juízes conservadores-republicanos, confirmou a ordem judicial monocrática, válida para todo o país.

O DOJ não vê dificuldades para reverter, na Suprema Corte, essa decisão dos tribunais inferiores que pretendem derrubar a lei. Mas considerou o caso um bom veículo para a corte cortar as asas de juízes em casos de repercussão nacional.

Palavra de ministro

A advogada-geral dos EUA, Elizabeth Prelogar, espera contar com a palavra do ministro conservador Neil Gorsuch. Em 2020, o ministro criticou, em uma decisão, as ordens judiciais com validade nacional.

“Atualmente, existem mais de mil juízes ativos em 94 tribunais federais, sujeitos a 12 tribunais federais de recurso. Se uma ordem judicial válida para todo o país é permitida, qualquer um desses juízes federais podem, sozinhos, bloquear qualquer lei federal, mesmo que outros juízes no país discordem dele.”

“Esse problema”, escreveu Gorsuch, “criou apostas assimétricas onde um autor desafiando uma lei ou política federal precisa apenas encontrar um juiz, em qualquer lugar do país, para ganhar uma ordem judicial que, pelo menos temporariamente, bloqueie essa política.”

O ministro sugeriu uma alternativa às ordens judiciais com efeito nacional: “Os juízes devem emitir ordens mais limitadas, permitindo a demandantes de um caso particular — e apenas a esses demandantes — ignorar uma lei ou política federal, enquanto essa ordem estiver em efeito”.

A advogada-geral apresentou esse pedido à Suprema Corte no apagar das luzes do governo de Joe Biden. Se a corte concordar com seus argumentos, o primeiro governo a se beneficiar da decisão será o do presidente eleito, o republicano Trump, que toma posse no próximo dia 20.

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