Ex-cônsul chamado de 'tirano africano' critica valor de indenização
7 de janeiro de 2025, 14h53
A 1ª Turma Recursal do Tribunal de Justiça da Bahia confirmou a condenação por dano moral de um francês acusado de ofensa racista, mas o acórdão não agradou ao autor da ação, um ex-cônsul, que foi chamado de “tirano africano”. A indenização foi mantida em R$ 3 mil, aquém dos R$ 40 mil pleiteados na inicial.
Senegalês naturalizado francês, Mamadou Gaye foi insultado na condição de cônsul honorário da França na Bahia, cargo que ocupou de fevereiro de 2019 a junho de 2024. Após a decisão da 1ª Turma Recursal, ele tornou público o caso e desabafou: “Sofrer racismo é doloroso, mas ver a Justiça não condenar com firmeza o fato é outra violência”.
Na sentença que condenou o réu a pagar R$ 3 mil ao autor, a juíza leiga Daiany de Almeida Jesus ponderou que, “a despeito do requerimento, a indenização não pode alcançar níveis desarrazoados”. Segundo ela, o magistrado deve ser cauteloso e prudente para não ensejar um enriquecimento sem causa ao ofendido, em detrimento do ofensor.
“Não deve o juiz propiciar a captação de lucro ou enriquecimento ilegal da parte autora; mas, noutra quadra, deve afastar-se de condenações inócuas, desprovidas de natureza didático-preventiva à repetição da conduta lesiva pela parte ré”, fundamentou a julgadora leiga.
A juíza de Direito Marcia Denise Mineiro Sampaio Mascarenhas, da 8ª Vara do Sistema dos Juizados Especiais de Causas Comuns de Salvador, homologou a decisão e o autor recorreu. Porém, por unanimidade, o recurso foi improvido nos termos do voto da juíza relatora Nicia Olga Andrade de Souza Dantas, que manteve a sentença na íntegra.
Revelia e mérito
Assim como o ex-cônsul, o acusado reside em Salvador. Citado, ele não compareceu à audiência, sendo decretada à sua revelia. Segundo a sentença, além de o réu não se defender dos fatos alegados pelo autor, o demandante comprovou os fatos constitutivos de seu direito, conforme impõe o artigo 373, inciso I, do Código de Processo Civil.
O e-mail ofensivo que o requerido enviou ao ex-cônsul foi copiado a vários interlocutores institucionais franceses e brasileiros. Essa mensagem e a sua tradução foram juntadas nos autos. Conforme a decisão do juizado especial, “a conduta do réu transbordou a mera liberdade de expressão, ofendendo diretamente a honra objetiva e subjetiva do autor”.
De acordo com a sentença, o autor sofreu violação de direito personalíssimo. Diante da presença do trinômio conduta, dano e nexo causal, incumbe ao réu o dever de indenizá-lo pela lesão imaterial, com base no artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal, e do artigo 186 do Código Civil.
Consta da inicial que o réu entrou em contato com o autor, então cônsul honorário, com o objetivo de resolver questões administrativas. Porém, a solicitação não pôde ser atendida pelo representante da França no Brasil por estar fora do âmbito de suas atribuições.
Inconformado por não ter a sua demanda solucionada, como forma de pressão, o réu copiou o cônsul em e-mails sobre o assunto que enviou a cidadãos franceses. Ele também questionou a competência do autor para ocupar o cargo, chamando-o de “tirano africano” e expressando o desejo de que retornasse ao seu “buraquinho” em Paris.
“Tudo isso começou porque ele (requerido) não aceitava o fato de um negro ser representante do consulado”, explicou Mamadou Gaye, após a publicação do acórdão da 1ª Turma Recursal do TJ-BA. “Qual é o preço do racismo? Independentemente do valor, a dor é ver que, mais uma vez, a Justiça minimizou a situação”, finalizou.
Processo 0216912-70.2023.8.05.0001
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