Opinião

Telegestão na iluminação pública: engodo da dimerização e omissão do Inmetro

Autor

  • é advogado e palestrante especialista no segmento de Iluminação Pública sócio do escritório Gouveia Gioielli Advogados especializado em Direito Processual Tributário pós-graduado em Direito Tributário coordenador do Programa IP Legal da Abilux (Associação Brasileira da Industria de Iluminação).

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21 de fevereiro de 2025, 19h33

Governo Federal
iluminação pública, energia elétrica

A promessa de economia energética por meio da dimerização na iluminação pública vem sendo amplamente divulgada, mas apresenta inconsistências regulatórias e operacionais. O faturamento da energia elétrica destinada à iluminação pública no Brasil não é calculado com base no consumo real, mas sim estimado pela Aneel, conforme a Resolução Homologatória nº 2.590/2019 — incorporado pela REN nº 1.000/2021 —, que fixa o tempo médio de funcionamento diário para fins de faturamento, independentemente da variação de intensidade luminosa. Assim, reduzir o fluxo luminoso não altera a conta de energia, tornando a dimerização uma medida sem impacto financeiro para a maioria dos municípios.

Além disso, nenhuma distribuidora de energia no Brasil aceita a dimerização como critério para redução do faturamento, uma vez que a cobrança segue modelos padronizados estabelecidos no Despacho Aneel nº 3.423/2022. Esse despacho regula três modalidades de faturamento:

  1. estimativa pelo período de utilização e carga (modelo majoritário, adotado por 80% das cidades)

  2. estimativa pelo período de utilização, carga e eventos de dimerização (aplicável apenas em concessões específicas com medição aprovada) e

  3. consumo mensurado por dispositivos de controle de carga (modelo raro e sujeito à aceitação da distribuidora desde que aprovado pelo Inmetro).

Como as distribuidoras não adotam a dimerização na prática, sua implementação nos municípios representa um investimento sem retorno financeiro.

Homologação pelo Inmetro

Outro aspecto relevante, amplamente omitido por diversas empresas desse setor, é a obrigatoriedade de aprovação e homologação pelo Inmetro para que qualquer sistema de telegestão seja utilizado na medição do consumo de energia. A Portaria Inmetro nº 221/2022, alterada pela Portaria Inmetro nº 601/2023, estabelece de forma expressa em seu artigo 6º que:

“Os Sistemas de Iluminação Pública (SIP) produzidos a partir de 1º de abril de 2024 deverão ser submetidos à verificação inicial pelo INMETRO, para serem habilitados também para a medição do consumo de energia elétrica.”

Isso significa que qualquer sistema não aprovado pelo Inmetro não poderá ser utilizado para faturamento medido. No entanto, empresas vêm oferecendo essa solução que pode causar lesão ao patrimônio público quando adquiridas sem aprovação e/ou homologação do Inmetro para efeitos de medição de grandezas elétricas. Além disso, é essencial que os municípios consultem a relação de empresas e dispositivos já aprovados e homologados pelo Inmetro antes de qualquer aquisição, o que pode ser feito no portal oficial.

Spacca

A falta dessa verificação representa um risco grave, pois a aquisição de um sistema de telegestão sem a devida aprovação e homologação do Inmetro pode configurar dano ao erário, podendo enquadrar gestores municipais em improbidade administrativa. Segundo a legislação, é dever do ordenador de despesas garantir que qualquer contratação pública siga as normas técnicas e regulatórias vigentes, evitando desperdício de recursos e prejuízos financeiros ao município.

Transparência na modernização da iluminação pública

A modernização da iluminação pública deve seguir princípios de transparência, viabilidade técnica e rigorosa conformidade legal. A simples implementação de um sistema de telegestão não assegura economia efetiva, e qualquer alegação nesse sentido deve ser analisada sob a ótica regulatória e financeira, evitando decisões baseadas em expectativas irreais. Equipamentos de medição de grandezas elétricas via telegestão que não possuam aprovação e homologação pelo Inmetro não serão aceitos pelas distribuidoras de energia, tornando sua aquisição inviável para fins de faturamento real e representando um risco de desperdício de recursos públicos.

Além disso, não há qualquer redução de consumo via dimerização na iluminação pública se o faturamento permanecer estimado, conforme os critérios estabelecidos pela Aneel na Resolução Homologatória nº 2.590/2019. Como a cobrança da energia elétrica na maioria dos municípios segue um modelo fixo baseado na carga instalada e no tempo de uso, a dimerização não altera o valor faturado. Dessa forma, qualquer empresa que ofereça esse tipo de tecnologia alegando redução de custos pratica uma informação ideologicamente não verdadeira, induzindo gestores públicos a erro e criando um cenário propício para aquisições tecnicamente ineficazes e potencialmente lesivas ao erário.

Se esses cuidados não forem rigorosamente observados, os municípios estarão direcionando recursos públicos para uma tecnologia sem retorno financeiro comprovado, enquanto o faturamento da energia permanecerá atrelado à carga instalada e ao tempo de uso fixado pela Aneel, sem qualquer impacto na redução de custos.

A aquisição de sistemas de telegestão sem aprovação e homologação pelo Inmetro não apenas configura desperdício de verba pública, mas pode caracterizar dano ao erário, sujeitando gestores e ordenadores de despesa a responsabilização por improbidade administrativa. Diante desse cenário, o Ministério Público de cada estado pode intervir para apurar eventuais irregularidades, garantindo que contratos firmados observem rigorosamente a legislação vigente e protejam o patrimônio público.

Autores

  • é advogado e palestrante, especialista no segmento de Iluminação Pública, sócio do escritório Gouveia Gioielli Advogados, especializado em Direito Processual Tributário, pós-graduado em Direito Tributário, coordenador do Programa IP Legal da Abilux (Associação Brasileira da Industria de Iluminação).

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