Para o STJ, paradoxo da segurança digital não pode eximir plataformas de resposta a crimes
10 de fevereiro de 2025, 8h53
O paradoxo da segurança digital — segundo o qual quanto mais segura for a técnica de compartilhamento de conteúdo, mais inseguras estarão as vítimas dos abusos cometidos por usuários — não exime as plataformas digitais de estabelecer protocolos para dar respostas eficientes a ilícitos.
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Para o STJ, plataformas não podem se eximir de proteger seus usuários
Segundo advogados ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico, esse foi o aviso dado pelo Superior Tribunal de Justiça ao manter a condenação do Facebook, dono do aplicativo de mensagens WhatsApp, pela não exclusão de imagens íntimas compartilhadas por meio da plataforma.
A empresa alegou que o cumprimento da ordem judicial de derrubada do conteúdo era inviável porque usa criptografia de ponta a ponta. O Facebook sustenta que não consegue sequer acessar as mensagens das conversas dos usuários.
Para a ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso especial, a plataforma se manteve inerte. Diante da impossibilidade de remover o conteúdo, poderia ter reduzido o dano suspendendo o usuário da plataforma, por exemplo.
“Não é razoável deixar as vítimas da pornografia de vingança, especialmente se menores de idade, à mercê do paradoxo da segurança digital: quanto mais segura for a técnica de compartilhamento de conteúdo infrator, mais inseguras estarão as vítimas dos abusos perpetrados por usuários que utilizam a robustez do sistema de mensageria privada para fins ilícitos”, explicou ela.
Paradoxo da segurança digital
Segundo Alexander Coelho, sócio do escritório Godke Advogados e especialista em Direito Digital e Proteção de Dados, o Poder Judiciário deve tratar esses casos com equilíbrio: a solução não pode ser fragilizar a criptografia que protege as mensagens, mas é legítimo exigir protocolos eficientes para combater crimes.
“O papel do Judiciário deve ser o de garantir que as plataformas adotem todas as medidas razoáveis para evitar danos às vítimas, sem criar obrigações inviáveis ou que comprometam a segurança digital como um todo. O caso do WhatsApp reforça a necessidade de um debate mais profundo sobre como equilibrar privacidade e responsabilidade nas plataformas digitais.”
Para ele, a condenação do Facebook é justificável na medida em que a plataforma deixou de adotar as providências possíveis dentro de suas limitações técnicas. No entanto, o advogado afirma que o caso levanta um ponto crítico no debate sobre as empresas de tecnologia.
“Se o Judiciário impõe às plataformas uma responsabilidade irrestrita sobre conteúdos impossíveis de serem acessados por questões técnicas, abre-se um precedente perigoso, que pode comprometer a segurança digital como um todo.”
Privacy by design
Na mesma linha, Felipe Monteiro, advogado-sócio do Kasznar Leonardos, diz que a grande questão desse precedente é a falta de empenho do WhatsApp para reduzir os danos sofridos pela usuária, que teve imagens íntimas compartilhadas sem autorização judicial.
“A segurança da plataforma é importante e clara, e ela deve ser respeitada, mas é preciso ter outros mecanismos para garantir, na situação de uma eventual infração, uma resposta para quem está sofrendo com o abuso. Existem outras perspectivas e ações que podem ser aplicadas dentro dos termos e condições de uso das plataformas.”
Wilson Sales Belchior, sócio do RMS Advogados, aponta que a colisão de valores no contexto das novas tecnologias exige um juízo de ponderação que, de um lado, não penalize a inovação e o empreendedorismo, e, de outro, assegure a proporcionalidade entre as possibilidades existentes.
“Não se desconhece a sensibilidade do caso submetido a julgamento. Contudo, é preciso avaliar a viabilidade do cumprimento da identificação de dados e a concepção de privacy by design adotada pela solução tecnológica”, disse Belchior, referindo-se ao conceito que prioriza a privacidade e a segurança de dados desde a concepção da tecnologia.
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REsp 2.172.296
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