Juiz concede pensão vitalícia à viúva de Vladimir Herzog, assassinado na ditadura
5 de fevereiro de 2025, 15h49
A Constituição garante anistia àqueles atingidos por “atos de exceção” com motivos exclusivamente políticos. Já a Lei 10.559/2002 estabelece que esses anistiados têm direito a reparação econômica, “de caráter indenizatório”.
Assim, a 2ª Vara Federal Cível do Distrito Federal determinou, em liminar, na última sexta-feira (31/1), que o governo federal pague uma pensão mensal de R$ 34,5 mil à publicitária Clarice Herzog, viúva do jornalista Vladimir Herzog, 50 anos depois do seu assassinato por agentes da ditadura militar em 1975.
A decisão ocorre quase 50 anos após o homicídio, que teve motivações políticas. Hoje com 83 anos, Clarice tem doença de Alzheimer em fase avançada.
Contexto
O marido da publicitária era diretor do departamento de jornalismo da TV Cultura. Os órgãos de repressão do regime militar suspeitavam das ligações de Vladimir Herzog com o Partido Comunista Brasileiro (PCB, que atuava na ilegalidade), do qual ele era militante.
O jornalista foi convocado e compareceu de forma voluntária ao Destacamento de Operações de Informação do Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) de São Paulo. No mesmo dia, foi morto. Os militares alegaram que Herzog se enforcou com o cinto do seu macacão de presidiário.
Mais tarde, ficou claro que o caso era de assassinato. Companheiros de prisão atestaram que o macacão obrigatório do DOI-Codi não possuía cinto. Jornalistas presos no mesmo local testemunharam ter ouvido os gritos de Herzog sendo torturado. Já os médicos legistas prestaram depoimentos contraditórios.
No último mês de janeiro, a defesa de Clarice pediu indenização pela morte do marido. Os advogados argumentaram que ele foi perseguido e assassinado pelo Estado brasileiro.
Fundamentação
“A perseguição de caráter exclusivamente político sofrida por Vladimir Herzog, que resultou em sua detenção arbitrária e execução extrajudicial, já foi reconhecida em várias instâncias”, destacou o juiz Anderson Santos da Silva.
O magistrado ressaltou as “fartas evidências” a respeito da tortura e do assassinato do jornalista. “O pedido autoral de reconhecimento da sua condição de anistiado político, com as suas consequências legais, apresenta plausibilidade jurídica”, assinalou. Na decisão, ele também ressaltou a idade e o diagnóstico médico da publicitária.
Segundo os advogados Beatriz Cruz e Paulo Abrão, do escritório Cruz e Temperani Advogados Associados, que representou Clarice, ainda há um longo caminho até a decisão de mérito, mas a liminar é um marco importante que garante o pagamento imediato da prestação mensal.
Histórico
Em 1978, ainda durante a ditadura militar, um juiz federal declarou que Vladimir Herzog morreu de causas não naturais e condenou a União a indenizar a família da vítima. A sentença transitou em julgado em 1995, mas não foi cumprida.
Em 2014, a Comissão Nacional da Verdade concluiu que o jornalista foi estrangulado e que os agentes públicos montaram uma estrutura para simular um enforcamento.
Já em 2018, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) constatou que Herzog foi assassinado por agentes da ditadura militar e determinou que o Estado brasileiro promovesse uma investigação completa e imparcial dos fatos, para punir os responsáveis pela tortura e morte. Na ocasião, foi estipulado um total de US$ 60 mil como reparação aos familiares do jornalista.
O ordenamento jurídico brasileiro reconhece a competência da CIDH. Por isso, o país tem o compromisso de cumprir as decisões da corte.
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Processo 1006041-09.2025.4.01.3400
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