Opinião

TST e a era dos precedentes: nova arquitetura de uniformização jurisprudencial

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13 de abril de 2025, 7h03

O Tribunal Superior do Trabalho tem passado por um momento de transformação institucional silenciosa, mas de grande impacto: a consolidação de sua atuação como um verdadeiro tribunal de TST.

Reprodução/TST
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Com a intensificação dos julgamentos de incidentes de recursos repetitivos (IRRs) e a valorização dos incidentes de resolução de demandas repetitivas (IRDRs), o TST está redesenhando seu papel dentro da Justiça do Trabalho — que, por muito tempo, foi mais afeita à casuística do que à normatização jurisprudencial.

Essa guinada coincide com uma tendência mais ampla do sistema jurídico brasileiro: a centralidade dos precedentes como instrumento de segurança jurídica e racionalização do Judiciário. O Código de Processo Civil de 2015 já havia dado os contornos normativos dessa virada, e agora o TST, mesmo com resistência histórica à rigidez dos precedentes, assume esse protagonismo.

Novo protagonismo do TST e os temas paradigmáticos

Nos últimos meses, o TST tem afetado inúmeros recursos para julgamento sob a sistemática de IRR, elevando esses julgamentos a um novo patamar de normatividade. Dentre os temas recentemente enfrentados, destacam-se:

– Comissões de bancários: Estabelecida a tese de que a comercialização de produtos de empresas integrantes do mesmo grupo econômico da instituição bancária não gera o pagamento de comissões, salvo se houver previsão contratual em contrário.

– Impossibilidade de pagamento de FGTS direto ao empregado: FGTS e depósito em conta vinculada: Firmou-se entendimento de que o pagamento do FGTS e da indenização de 40% deve ser feito, necessariamente, por meio de depósito na conta vinculada do trabalhador, vedando o pagamento direto em juízo. Essa tese tem implicações práticas relevantes para execuções e acordos judiciais.

– Revista de bolsas e pertences: A realização de revista meramente visual nos pertences dos empregados, desde que procedida de forma impessoal, geral, sem contato físico e exposição dos trabalhadores a situação humilhante ou vexatória, não configura ato ilícito apto a gerar indenização por dano moral”.

Spacca

Esses julgamentos demonstram que o TST está, gradualmente, abandonando sua tradição de tolerância à fragmentação jurisprudencial e assumindo um papel institucional mais próximo ao do STF em matéria de sistematização de entendimentos.

Contudo, essa fase de normatização não ocorre em um vácuo ideológico. Ela se insere num contexto mais amplo de retração do papel protetivo do Direito do Trabalho. A jurisprudência recente do TST, mesmo quando busca uniformizar entendimentos, tem adotado uma postura claramente mais conservadora, alinhada com a racionalidade da Reforma Trabalhista de 2017.

Essa racionalidade prioriza previsibilidade, segurança jurídica e redução de litigiosidade — objetivos legítimos, mas que, se desvinculados de uma leitura principiológica do Direito do Trabalho, podem resultar em decisões tecnicamente coerentes, porém socialmente descomprometidas. O risco de engessamento jurisprudencial é real, especialmente se as teses firmadas forem aplicadas com rigidez excessiva, desconsiderando as peculiaridades dos casos concretos.

O discurso da segurança jurídica não pode ser utilizado como pretexto para a desproteção do trabalho. A função contramajoritária da Justiça do Trabalho — sua vocação de defesa da parte hipossuficiente — não pode ser subvertida pela lógica puramente gerencial do Judiciário.

O novo cenário impõe aos advogados trabalhistas uma mudança de postura. O argumento de autoridade, baseado em precedentes, passa a ter papel central na estratégia processual. A atuação profissional deve ser pautada por:

– Monitoramento sistemático dos temas afetados pelo TST: É fundamental acompanhar a pauta dos IRRs e IRDRs, bem como as teses firmadas, suas fundamentações e eventuais modulações.

– Capacidade de distinguir o caso concreto da tese firmada: O domínio da técnica do distinguishing torna-se essencial para evitar a aplicação automática e injusta dos precedentes. Argumentar com base em peculiaridades fáticas é uma habilidade que ganha novo valor.

– Atuação estratégica no ajuizamento das ações: Em muitos casos, a escolha do foro, a tese jurídica adotada e o modo de formular os pedidos devem levar em consideração os entendimentos firmados em IRRs.

– Engajamento institucional: Participar de audiências públicas, apresentar memoriais em casos paradigmas e fomentar o debate doutrinário é uma forma de influenciar os rumos da jurisprudência.

Conclusão

O TST está deixando de ser apenas o guardião da interpretação da CLT para se tornar um verdadeiro legislador jurisprudencial. Essa transformação impõe desafios e oportunidades. É preciso estar atento à jurisprudência, sem se submeter a ela de forma passiva. A advocacia trabalhista deve continuar sendo uma força crítica e propositiva, defendendo a justiça social mesmo em tempos de racionalização conservadora.

Nesse novo ciclo, conhecimento técnico, capacidade analítica e sensibilidade social são as virtudes que definirão a advocacia trabalhista de excelência.

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