Inaplicabilidade do Tema 1.068/STF em sentença desclassificatória
9 de abril de 2025, 9h17
Resumo do caso: Paciente submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri de comarca do interior de Santa Catarina. Veredicto desclassificatório para crime não doloso contra a vida. Condenação por juíza singular em lesões corporais seguidas de morte. Negativa ao paciente e aos corréus do direito a recorrer em liberdade com fundamento no Tema 1.068, do STF. Constrangimento ilegal caracterizado. Ordem de Habeas Corpus concedida.
Sinteticamente, no dia 27 de março de 2025, o paciente foi submetido, conjuntamente com dois outros corréus a julgamento perante o conselho de sentença do Tribunal do Júri de uma comarca do interior de Santa Catarina, por infração dos seguintes dispositivos do Código Penal:
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Acusado 01: artigo 121, §2º, incisos II e IV, c.c artigo 14, II, CP;
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Acusado 02: artigo 129, § 3º, CP;
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Acusado 03: artigo 129, § 3º, CP.
Na votação da série de quesitos do primeiro acusado, os jurados desclassificaram o crime de homicídio a ele imputado, considerando ausente em sua conduta o “animus necandi”.
Juíza singular
Com essa decisão, os jurados devolveram à juíza de direito a competência para julgar a causa na qualidade de juíza singular, o que efetivamente aconteceu com a condenação dos três acusados pelo crime de lesões corporais seguidas de morte.
No entanto, mesmo diante da declinação da competência do Tribunal do Júri, a magistrada, em sua sentença condenatória, negou aos acusados o direito de recorrer em liberdade, invocando para tanto o Tema 1.068, do STF, nos seguintes termos:
“Tendo em vista a tese de repercussão geral fixada pelo Supremo Tribunal Federal (Tema 1.068), que deve ser observada por este juízo, segundo a qual ‘a soberania dos veredictos do Tribunal do Júri autoriza a imediata execução de condenação imposta pelo corpo de jurados, independentemente do total da pena aplicada’, nego aos acusados o direito de recorrerem em liberdade. Assim, expeçam-se os mandados de prisão, encaminhando-se para cumprimento, a fim de que se dê início à execução da pena.”
Ocorre que, quando os jurados desclassificaram a conduta do primeiro acusado, devolveram à juíza singular a competência para o julgamento da causa, de modo que a decisão não pode ser considerada propriamente uma decisão do Tribunal do Júri.
Dessa forma, incabível invocar o Tema 1.068 para negar ao paciente e aos corréus o direito constitucional de recorrer em liberdade.

Prisão preventiva
A Lei 11.719/2008 revogou o artigo 594, do CPP, que determinava que “o réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, ou prestar fiança, salvo se condenado por crime de que se livre solto”, de modo que a decisão nega ao paciente um direito de liberdade sem fundamentação válida.
Ressalte-se, enfim, que não houve qualquer justificativa da autoridade coatora para a decretação da prisão preventiva do paciente, o que só poderia ser feito, com outros fundamentos, mediante a presença de um dos requisitos do artigo 312, do CPP, ausentes no caso em análise.
A fumaça do bom direito restou demonstrada, já que a autoridade coatora aplicou indevidamente o Tema 1.068, do STF, para negar o direito de recorrer em liberdade ao paciente condenado em juízo singular. Também o perigo na demora ficou caracterizado, pois a sentença determinou a expedição de ordem imediata de prisão do paciente para início do cumprimento da pena, o que autorizaria, na visão dos impetrantes, a concessão liminar da ordem com fim de restabelecer o direito indevidamente sonegado.
Habeas Corpus
O pedido de HC foi distribuído no TJ-SC (Tribunal de Justiça de Santa Catarina), no dia 31 de março de 2025, tendo sido atribuído à relatoria de desembargador integrante do colegiado de sua 3ª Câmara Criminal, que na mesma data concedeu liminarmente a ordem — estendida, de ofício, a todos os corréus do caso —, acolhendo integralmente os argumentos dos impetrantes e acrescentando:
“In casu, porém, observa-se, de plano, que o Tema nº 1.068 é inaplicável, porquanto a condenação do paciente não foi exarada pelo Tribunal do Júri, mas sim pela Magistrada singular após o delito doloso contra a vida – imputado inicialmente ao corréu [nome suprimido] ser desclassificado pelos jurados para o delito de lesão corporal seguida de morte (art. 129, § 3º, do Código Penal). Tanto é que, a partir dessa decisão, os quesitos relacionados ao paciente ficaram prejudicados.”
O HC foi assinado pelos impetrantes Matheus Felipe de Castro (OAB/SC 39.928), Sérgio Francisco Carlos Graziano Sobrinho (OAB/SC 8.042), Susana Formentin Mendes Graziano (OAB/SC 36.586) e Jonas Machado Ramos (OAB/SC 24.625), todos sócios do Escritório Graziano-Advocacia Criminal, sediado em Florianópolis/SC.
Os dados identificadores do caso foram suprimidos para preservar as partes envolvidas.
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