Opinião

Impactos da reforma tributária no setor de energia elétrica

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  • é professor titular de Direito Financeiro e chefe do Departamento de Direito Econômico Financeiro e Tributário da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) presidente da Associação Brasileira de Direito Financeiro (ABDF) e advogado.

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21 de setembro de 2024, 7h01

A reforma da tributação do consumo, introduzida pela Emenda Constitucional 132/23, trouxe a criação do IBS e da CBS e implantará relevantes mudanças na economia, com promessas de neutralidade, maior simplificação, transparência e não cumulatividade plena, com integral devolução de todos os créditos acumulados na cadeia, para que a tributação se opere com a soma das três alíquotas: do município e do estado de destino (IBS) e da União (CBS).

Certamente, os benefícios da reforma justificam os esforços do período de transição, que deve ser usado para mitigar potenciais riscos tributários.

No setor elétrico, que é um dos mais estratégicos do país, espera-se tempos melhores com a reforma tributária. Cientes de que qualquer assimetria que esta trouxer poderá gerar majoração das tarifas, logo, compartilhada com os consumidores.

Conforme o artigo 9º, § 3º da Lei 8.987/1995:

“Ressalvados os impostos sobre a renda, a criação, alteração ou extinção de quaisquer tributos ou encargos legais, após a apresentação da proposta, quando comprovado seu impacto, implicará a revisão da tarifa, para mais ou para menos, conforme o caso.”

Esta é uma regra de proteção para evitar que aumento de custos tributários prejudique a essencialidade dos serviços.

A complexidade da cadeia de transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica, que envolve diferentes modalidades contratuais, como o Ambiente de Contratação Livre (ACL) e o Ambiente de Contratação Regulada (ACR), demanda uma abordagem funcional, a evitar distorções entre distribuidoras, produtoras e comercializadoras.

Reguladoras não definem competência tributária

As agências assumem competência para fixar regulamentação nos estritos limites legais, jamais para invadir competências, como aquela de natureza tributária. E a eficiência regulatória, na equação do equilíbrio econômico-financeiro, nos contratos com o ente público, tampouco pode servir de escusa para prejudicar direitos dos contribuintes.

Exemplo disso, recentemente, o STF formou maioria de seis votos a zero pela constitucionalidade da Lei nº 14.385/2022, que fez incluir os artigos 3º-B e 3º, XXII, na Lei nº 9.427/1996, para exigir apenas das distribuidoras de energia elétrica a proibição de compensar os valores da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins, contra o Tema nº 69, do próprio STF, que é coisa julgada formal e material. O exame de mérito foi suspenso após pedido de vista do ministro Dias Toffoli.

Spacca

Há uma violência simbólica inequívoca ao princípio da não discriminação, do artigo 150, II, da CF, quando uma lei surge para criar regimes tributários diferentes para contribuintes que se encontram em situação equivalente, mormente quando em face dos efeitos de coisa julgada, ferindo a isonomia e afrontando o artigo 5º, XXXVI, da CF.

A coisa julgada impõe que o crédito, em razão do Tema nº 69 do STF, conferido às concessionárias de energia elétrica, deva ser integralmente compensado mediante repetição de indébito tributário. Por isso, espera-se que na ADI 7.324, se não afirmar o direito à compensação, ao menos siga o rumo de reconhecer a prescrição para cobrança.

Incidência de IBS e CBS

Algo dessa natureza jamais acontecerá com o IBS ou a CBS. O § 2º do artigo 12 do PLP 68/24 estabelece que “a base de cálculo do IBS e da CBS é o valor da operação”, do qual são excluídos “I – o montante do IBS e da CBS incidentes sobre a operação; e o II – montante do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI)”.

Logo, os tributos sobre o consumo estarão excluídos da base de cálculo do IBS e da IBS, além de serem facilmente identificados, darão créditos às empresas e não haverá nenhum cálculo “por dentro” (alíquota sobre o valor da conta com o tributo) ou substituição tributária.

O imposto seletivo, que virá com a reforma para agravar a tributação de certos produtos ou serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, não incidirá sobre energia elétrica. Esta é também uma boa notícia, especialmente para o consumidor.

O setor convive com contratos de construção de grandes linhas de transmissão ou complexos sistemas de distribuição que exigem elevados investimentos por períodos longos de tempo. Em boa hora, o Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento da Infraestrutura (Reidi) foi mantido no artigo 104 do PLP68/24, com suspensão do pagamento do IBS e da CBS. E, no artigo 105, poderemos ter casos em que importações e aquisições no mercado interno de bens de capital serão realizadas com suspensão do pagamento do IBS e da CBS.

Eficiência econômica e redução de preços

Tem-se a questão do direito ao crédito referente ao total da energia adquirida pela distribuidora, pois entre a geração da energia e a entrega há perdas técnicas, e também perdas comerciais, como o furto de energia, que é um problema de segurança pública. Temas a serem aperfeiçoados no Senado.

Há, porém, diversas questões em aberto, como a apropriação dos créditos, sobre o direito de uso do “cashback”, que ficou limitado a 20% para o IBS, nas operações de fornecimento de energia elétrica, bem como quanto ao aproveitamento dos benefícios fiscais no regime de transição.

No setor elétrico, a modicidade tarifária é um princípio que não pode ser olvidado. Em 2021, o STF (RE 714139 — Tema 745) declarou a inconstitucionalidade de normas que fixavam a alíquota sobre energia elétrica sem observar a essencialidade no ICMS. Mesmo que este princípio já não integre o IBS, a dignidade da pessoa humana e o mínimo existencial seguem em vigor.

Com a transparência dos custos tributários, espera-se vir aumentada a eficiência econômica do setor elétrico e que isso se reflita em alguma redução dos preços da energia para o consumidor e para os setores produtivos.

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