Opinião

Qual forma de licitação deve ser adotada para concessão de uso onerosa de bens públicos?

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20 de setembro de 2024, 13h23

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Essa é uma pergunta que a todo momento é feita aos órgãos de controle e não há uma resposta na Lei nº 14.133/2021, que foi construída, na sua grande maioria, para desenhar contratos em que a administração é quem efetua o pagamento por um determinado bem, serviço, obra ou quando atua como locatária de um imóvel.

Contudo, há contratos em que é a administração pública quem aufere renda, tal como ocorre quando ela aliena seus bens móveis ou imóveis, ou quando pretende firmar um contrato em que o resultado da prestação dos serviços resulte em economia para os cofres públicos em relação às despesas de custeio.

Critérios

Para o primeiro caso, a lei prevê, como critério de julgamento da proposta, o maior lance. Para o segundo, o maior retorno econômico.

Mas esqueceu o legislador que há outros contratos em que a administração igualmente auferirá renda.

Vale lembrar que a Lei nº 14.133/2021 aplica-se igualmente aos contratos de concessão e permissão de uso de bens públicos.

Nesses casos, a administração poderá auferir receita, sendo mais apropriado o uso de critério da maior oferta de preço.

Quando da vigência da Lei nº 8.666/93 não havia dúvidas sobre a possibilidade de a administração lançar um edital de concorrência para a concessão de uso de bens públicos, utilizando-se de critério do maior lance ou oferta, ou mesmo, em casos de concessão de imóveis para fins econômicos, por exemplo, para o desenvolvimento de área industrial em determinada localidade, utiliza-se o critério da técnica e preço, conforme a modelagem adotada.

Impropriedade de técnica

Ocorre que a Lei nº 14.133/2021 estabeleceu uma regra absurda ao vincular o uso do critério do maior lance somente à modalidade do leilão, modalidade esta inapropriada para os casos de concessão de uso de bens públicos, dada a sua simplicidade procedimental, em que não são avaliadas questões de habilitação.

Spacca

O leilão para venda de bens imóveis inservíveis não se presta para a seleção da proposta para a concessão de uso de bens imóveis, sobretudo, para aqueles casos em que a administração exige contrapartidas do concessionário.

Portanto, entendemos que o artigo 33, inciso V da Lei nº 14.133/2021 deva ser imediatamente alterado para suprimir a parte final que expressa “no caso de leilão”, pois não é verdade que este critério somente seria aplicável nos leilões.

Na realidade, há uma impropriedade de técnica legislativa, uma vez que a descrição legal da modalidade de leilão já contempla a aplicação do critério do maior lance, conforme se pode observar no artigo 6º, inciso XL.

O legislador, ao vincular o uso do maior lance somente à modalidade de leilão, reduziu inadvertidamente seu campo de incidência. Ocorre que, a licitação no mundo real exige a aplicação desse critério em outras modalidades.

Desta forma, sugere-se aos legisladores com competência para modificarem a Lei nº 14.133/2021, a adoção imediata de iniciativa para alterar a redação do artigo 33, inciso V da Lei n° 14.133/2021, não atrelando o critério do maior lance ao leilão.

Como sugestão, tem-se a seguinte proposição para nova redação:

“Lei n.14.133/2021.
Art. 33. O julgamento das propostas será realizado de acordo com os seguintes critérios:
{…}.
V – maior lance ou oferta, nos casos em que a Administração pretenda auferir receitas, tais como com a alienação de bens móveis ou imóveis, ou com a concessão e permissão de direito real de uso de bens públicos;”

Enquanto a alteração legislativa não vier, caberá aos órgãos de controle orientarem os órgãos e entidades jurisdicionadas.

Concessão de uso onerosa de bens públicos

É inapropriado orientarem a utilizar o leilão para os casos de concessão de uso onerosa de bens públicos ou de outros bens imóveis da administração que possam ser explorados economicamente na Lei nº 14.133/2021, uma vez que, nesses casos, a administração precisa avaliar questões de habilitação jurídica, econômica, técnica, dentre outros critérios conforme a situação, sobretudo em questões que envolvam a realização de obras, o que seria inadmissível no modelo do leilão trazido na Lei nº 14.133/2012

A doutrina já vem apontando essa impropriedade na Lei nº 14.133/202. Vejamos o que destacou o professor Joel de Menezes Niebuhr:

“A questão é que esse vínculo entre o critério de julgamento do maior lance e a modalidade leilão deve ser compreendido com cautela e anteparos. Sendo assim, deve-se entender que o inciso V do caput do artigo 33 da lei 14.133/2021 prescreve que o critério do maior lance deve ser aplicado na modalidade leilão, porém que também pode sê-lo em outras modalidades, desde que o interesse público demande que a melhor proposta seja aquela com o maior preço e não aquela com o menor preço” [1].

Há mais de 30 anos a administração vinha utilizando o tipo licitatório (hoje critério de julgamento) de maior lance ou oferta para os casos de alienação de bens ou concessão de direito real de uso de bens públicos, e não houve nenhuma razão especial para que o legislador impedisse a sua continuidade. Na realidade, o legislador da Lei nº 14.133/2021 nesse ponto errou ao limitar o uso do maior lance ao leilão, esquecendo-se de uma forma de contratação muito comum na administração pública brasileira.

Modalidade mais adequada

Diante do exposto, para responder ao questionamento fixado no título deste artigo, entendemos que a modalidade adequada seria a concorrência, utilizando-se o critério do maior lance, por ser este o mais adequado para nos casos de concessão de uso onerosa de bens pertencentes à administração pública que possam ser explorados economicamente, sempre que julgar necessária a avaliação de requisitos de habilitação dos proponentes, deixando o leilão apenas para os casos de alienação de bens móveis inservíveis para a administração ou legalmente apreendidos.

 


[1] NIEBUHR, Joel de Menezes. Licitação pública e contrato administrativo. 5ª ed. Belo Horizonte: Fórum, 2022, p. 749.

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