Opinião

Competência da JT para cobrança de créditos extraconcursais na recuperação

Autor

  • Mirella Pedrol Franco

    é advogada e coordenadora da área trabalhista no Granito Boneli e Andery Advogados (GBA Advogados Associados) pós-graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e auditora líder pela Q Academy: Sistema de Gestão de Compliance Sistema de Gestão Antissuborno e Anticorrupção.

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17 de setembro de 2024, 11h20

Recentemente, o Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-SC) proferiu uma decisão significativa, determinando a competência da Justiça do Trabalho para a cobrança de créditos extraconcursais originados após a decretação da recuperação judicial de uma empresa. Essa decisão é um marco importante no Direito Trabalhista brasileiro, trazendo clareza para uma questão que tem gerado debates e incertezas no meio jurídico.

Reprodução/TRT-12

A recuperação judicial, instituída pela Lei 11.101/2005, é um processo destinado a permitir que empresas em dificuldades financeiras reestruturem suas dívidas e continuem operando. No entanto, a interação entre esse processo e os créditos trabalhistas tem sido complexa, especialmente quando se trata de créditos extraconcursais, que são aqueles contraídos pela empresa após a decretação da recuperação judicial.

Tradicionalmente, a competência para decidir sobre questões relacionadas à recuperação judicial e falência é da Justiça Comum, especificamente das varas de falências e recuperações judiciais. No entanto, os créditos trabalhistas têm tratamento diferenciado, sendo, em regra, de competência da Justiça do Trabalho. A recente decisão do TRT-SC aborda justamente a interface entre essas duas esferas judiciais.

Prioridade

A decisão do TRT-SC estabelece que a Justiça do Trabalho é competente para julgar e executar os créditos extraconcursais trabalhistas, mesmo após a decretação da recuperação judicial. Isso significa que os trabalhadores que tiverem créditos a receber de uma empresa em recuperação judicial poderão buscar a satisfação desses créditos diretamente na Justiça do Trabalho, sem a necessidade de se submeterem ao juízo universal da recuperação judicial.

Spacca

Essa definição de competência é crucial por diversas razões. Primeiramente, os créditos extraconcursais têm prioridade sobre os créditos concursais no pagamento das dívidas da empresa em recuperação judicial. Essa prioridade é fundamental para garantir que os trabalhadores, que muitas vezes dependem desses créditos para sua subsistência, tenham uma chance maior de receber o que lhes é devido.

Além disso, a decisão fortalece a proteção dos direitos dos trabalhadores, que são considerados hipossuficientes na relação trabalhista. A Justiça do Trabalho, por sua especialização e familiaridade com as questões trabalhistas, está melhor equipada para lidar com as especificidades desses créditos e garantir uma execução mais célere e eficaz.

Sobrecarga e necessidade de integração

No entanto, a decisão do TRT-SC também levanta desafios e questões práticas. Uma das principais preocupações é a possível sobrecarga da Justiça do Trabalho, que já lida com um volume significativo de processos. A execução de créditos extraconcursais pode aumentar ainda mais essa carga, exigindo eficiência e recursos adicionais para que as decisões sejam cumpridas de maneira tempestiva.

Outra questão relevante é a coordenação entre a Justiça do Trabalho e a Justiça Comum. A recuperação judicial envolve um plano de reestruturação abrangente, que considera todas as dívidas da empresa. A execução de créditos extraconcursais na Justiça do Trabalho deve, portanto, ser harmonizada com o processo de recuperação judicial em curso, para evitar conflitos e garantir que o plano de recuperação seja efetivamente implementado.

A decisão do TRT-SC é um avanço na proteção dos direitos trabalhistas, mas também destaca a necessidade de uma abordagem integrada e colaborativa entre os diferentes ramos do Judiciário. A criação de mecanismos de comunicação e coordenação entre as varas trabalhistas e as varas de recuperação judicial pode ser uma solução para minimizar conflitos e assegurar que as decisões sejam executadas de forma harmoniosa e eficiente.

Em termos práticos, as empresas em recuperação judicial precisam estar cientes dessa nova dinâmica e ajustar suas estratégias jurídicas e financeiras. A previsão de créditos extraconcursais trabalhistas deve ser cuidadosamente considerada nos planos de recuperação, e a empresa deve estar preparada para atender às demandas que surgirem na Justiça do Trabalho.

Conclusão

Em suma, a decisão do TRT-SC sobre a competência da Justiça do Trabalho para a cobrança de créditos extraconcursais após a decretação da recuperação judicial é um passo importante na clarificação de uma área nebulosa do Direito Trabalhista. Essa decisão reforça a proteção dos trabalhadores e assegura que seus créditos sejam tratados com a prioridade devida, ao mesmo tempo que impõe novos desafios para a coordenação judicial e a gestão das empresas em recuperação.

A evolução desse entendimento e a sua implementação prática serão acompanhadas de perto pelos operadores do Direito, empresas e trabalhadores, pois representam um avanço significativo na busca por um equilíbrio justo e eficiente entre os interesses das partes envolvidas na recuperação judicial e na proteção dos direitos trabalhistas.

Autores

  • é coordenadora da área trabalhista do GBA Advogados Associados no Granito, Boneli e Andery Advogados (GBA Advogados Associados), pós-graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e auditora líder pela Q Academy: Sistema de Gestão de Compliance, Sistema de Gestão Antissuborno e Anticorrupção.

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