Grupo estrangeiro tenta mudar decisão sobre controle da Usiminas no STJ e no Supremo Tribunal Federal
31 de outubro de 2024, 18h57
O grupo ítalo-argentino Ternium está atuando em diferentes frentes para tentar derrubar a decisão do Superior Tribunal de Justiça que o obrigou a fazer oferta pública de ações aos sócios minoritários da Usiminas.
A reviravolta do caso no STJ foi concretizada no último mês de junho e, pelos cálculos do próprio grupo estrangeiro, pode representar até R$ 4,3 bilhões em indenizações, como resultado da mudança de entendimento.
No próprio STJ, o Grupo Ternium ajuizou segundos embargos de declaração para sustentar que os primeiros eram incabíveis ou, se não tiver sucesso, ao menos modular os efeitos temporais da decisão.
No Supremo Tribunal Federal, tramita uma ação direta de inconstitucionalidade na tentativa de declarar inconstitucional a interpretação dada pelo STJ ao caso.
E, como mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico, o assunto também levou membros do governo italiano a circular entre o empresariado brasileiro, tendo como pano de fundo os 150 anos da imigração italiana para o Brasil. O cerco busca tentar influenciar decisões judiciais.
Disputa intensa
O caso trata de uma disputa iniciada em 2011, quando o bloco de controle da Usiminas era composto por Nippon Steel, Votorantim, Camargo Corrêa e a Caixa de Empregados da Usiminas (CEU).
O Grupo Ternium comprou todas as ações da Votorantim e da Camargo Corrêa e parte da cota da CEU, assumindo 43,3% das ações ordinárias dentro do bloco de controle da companhia.
Não houve alteração do sócio majoritário, que continuou sendo a Nippon Steel, com 46,12% das ações. Por esse motivo, as instâncias ordinárias entenderam que não era necessária a oferta pública de aquisição (OPA).
Previsto no artigo 254-A da Lei 6.404/1976, esse procedimento serve para proteger os minoritários de alterações abruptas no rumo das empresas das quais são sócios. A parte que ingressa no bloco de controle deve comprar as ações dos minoritários pelo preço no mínimo igual a 80% do valor pago por ação com direito a voto.
No caso da Usiminas, essa conta é ainda mais relevante porque o Grupo Ternium ingressou no bloco de controle pagando muito mais do que o valor de mercado das ações.
Inicialmente, o STJ teve a mesma conclusão das instâncias ordinárias. Mas, nos embargos de declaração, percebeu que, apesar de a Nippon Steel continuar sendo sócia majoritária da Usiminas, a companhia passou por mudanças importantes na forma de comando.
A aprovação das chamadas resoluções ordinárias passou a demandar quórum de 65% da massa acionária do bloco controlador, o que só seria possível pelo consenso entre Grupo Ternium e Nippon Steel. Já as resoluções especiais passaram a demandar quórum de 90% das ações — ou seja, a concordância dos três membros controladores.
Na prática, o veto do Grupo Ternium em qualquer dessas situações seria suficiente para inviabilizar sua implementação, o que implica uma mudança efetiva do bloco de controle e consequências na estrutura gerencial da Usiminas.
No STJ
Nos segundos embargos de declaração, o Grupo Ternium sustenta que o acórdão da 3ª Turma do STJ não tinha omissão a ser corrigida nos primeiros embargos.
A companhia afirma ainda que teses de simulação e fraude foram apresentadas somente em grau de apelação e que a análise daquelas questões necessitaria da interpretação de cláusula contratual, fatos e provas, medida vedada no STJ pela Súmula 7.
Por fim, pede a modulação dos efeitos da decisão sobre a interpretação dada ao artigo 254-A da LSA, para que passe a valer a partir do julgamento, sem alcançar o caso concreto.
“Esses novos embargos de declaração estão pendentes de julgamento”, disse o relator da matéria, ministro Moura Ribeiro, autor do voto vencedor na reviravolta no julgamento. Essa informação foi enviada ao Supremo, que também analisa a disputa.
No STF
No Supremo, o pedido em favor do Grupo Ternium foi feito pela Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), que ajuizou ação direta de inconstitucionalidade contra a decisão do STJ que determinou a oferta pública de ações aos sócios minoritários da Usiminas.
O caso está sob a relatoria do ministro André Mendonça, que enviou o processo direto ao Plenário da corte.
Na ação, a AEB pede a suspensão de processos judiciais em que se discuta a obrigatoriedade de fazer a oferta pública de ações e uma interpretação conforme a Constituição ao artigo 254-A da LSA, determinando que a obrigação de oferta pública só ocorre quando o alienante transfere o controle para outra companhia.
A AEB diz que o dispositivo não se aplica a casos de “mera alteração dos membros integrantes do bloco de controle” ou em que há “consolidação de controle compartilhado”. O argumento usa precedentes da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
“O acionista minoritário, ainda que tenha participação relevante nas deliberações da assembleia-geral e eleja a maioria dos administradores, não detém o poder de controle, pois somente pode alienar o controle de determinada companhia aquele que efetivamente seja o titular desse direito”, diz a ação.
Para que o STF aceite o processo, contudo, há uma preliminar. A pouco conhecida AEB deve passar pelo crivo da sua legitimidade. A entidade, que tem o Grupo Ternium na sua direção, precisa demonstrar a pertinência temática da sua representação.
Outro desafio, além de comprovar sua presença em pelo menos dez estados brasileiros, é que a ADI tem no seu bojo uma tese jurídica com paradigma constitucional — e não um caso concreto, que só seria examinado em sede de recurso extraordinário. Nesse plano, a ADI se torna um recurso a mais e o STF, uma quarta instância para o caso.
Terceira via
Enquanto o caso aguarda andamento nos tribunais de Brasília, o grupo italiano age para cercar o governo brasileiro e influenciar decisões judiciais.
Em um encontro na Fiesp, do qual participou o ministro-chefe da Casa Civil da Presidência da República, o vice-primeiro-ministro italiano, Antonio Tajani, cobrou em público uma posição da entidade paulista em favor da empresa de seu país.
Tajani atacou a decisão mais recente do STJ no caso. “Um absurdo”, disse ele. Josué Gomes, presidente da Fiesp, discordou e reagiu contra o lobby para interferir na Justiça pela via da política.
Antes da decisão desfavorável no STJ, o Grupo Ternium publicou o que se chama de “fato relevante”, informando ao mercado que assumira o comando da Usiminas.
No entanto, a companhia continua afirmando em processos que não assumiu o controle que admitiu deter publicamente.
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