Opinião

O desempenho dos Tribunais de Contas

Autores

  • é conselheiro substituto do TCE-PE professor adjunto IV da UFPE – Faculdade de Direito do Recife visiting scholar na Harvard Law School senior fellow na Harvard Kennedy School of Government e visiting scholar no Massachusets Institute of Technology (MIT).

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  • é auditor do TCU especialista sênior responsável por estudos e diagnósticos sobre políticas e regulação da infraestrutura no âmbito de cooperação internacional (GTInfra Olacefs) especialista em projetos complexos relacionados à gestão da qualidade ao aprimoramento da gestão processual e à identificação de riscos e controles internos ex-diretor de mobilidade urbana ex-especialista em regulação da Aneel e engenheiro com mestrado em engenharia pela USP.

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25 de outubro de 2024, 13h19

No acórdão 818/2024-Plenário, o Tribunal de Contas da União (TCU) expôs que o não-atendimento aos critérios de transparência pode comprometer ações de controle social e a credibilidade da sociedade na condução da ação estatal.

tcu tribunal de contas da união

A deliberação autorizou a realização de fiscalização para avaliar a transparência de portais de um conjunto de organizações federais no contexto do programa nacional de transparência pública (PNTP), referente ao ciclo 2024, coordenado pela associação dos membros dos tribunais de contas do Brasil (Atricon), criada em 1992. Vale destacar trecho do relatório do referido acórdão:

“[…] a transparência na gestão pública transcende a condição de um direito do cidadão, constituindo-se como uma medida prática essencial que efetivamente permite a supervisão e o controle por parte da sociedade, além de facilitar a inclusão da população nas decisões governamentais. Isso porque, para exercer o controle, é imprescindível ter acesso e compreensão das informações, especialmente no que tange à aplicação dos recursos obtidos por meio de impostos pelos Entes Governamentais.”

Qualidade e agilidade dos tribunais

A Atricon também elaborou o projeto qualidade e agilidade dos tribunais de contas (QATC). O objetivo é fortalecer o sistema nacional de controle externo e contribuir para que os tribunais aprimorem qualidade e agilidade, valorizando o controle social. Além dos avanços com o PNTP, a associação expõe regulamente e de forma organizada resultados do projeto.

Cada indicador possui a sigla QATC e o número correspondente. Nos resultados médios nacionais de 2022, os indicadores nº 9 (controle e garantia da qualidade de fiscalizações e auditorias), nº 10 (auditoria de conformidade), nº 12 (auditoria financeira) e nº 14 (acompanhamento das decisões) são menores do que 1,4 e no nº 12 menor que 1.

Tendo em vista que a pontuação “1” refere-se a práticas insatisfatórias [1] e a “2” a práticas não satisfatórias com indicativos de aperfeiçoamento, e considerando que alguns tribunais de contas devem ter os QATCs em níveis bons (pontuação 3) ou de excelência (pontuação 4), os baixos resultados médios nos indicadores citados sinalizam práticas insatisfatórias em alguns tribunais.

Spacca

Contudo, no regulamento do projeto QATC é vedada a utilização dos resultados das avaliações dos tribunais para fins de divulgação individualizada de dados, com exceção das instituições que queiram divulgar o seu próprio resultado – regra possivelmente criada para incentivar a adesão voluntária de tribunais com baixa maturidade institucional.

A título exemplificativo, o TCU divulgou espontaneamente o resultado do 4º ciclo (2019) da avaliação na dimensão corregedoria, expondo que em relação ao critério 2 (A corregedoria do tribunal realiza correições ordinárias anuais em unidades e gabinetes de membros) não houve pleno atendimento, visto que realizava inspeções ordinárias em unidades das secretarias de controle externo, mas não em gabinetes de membros (Ata 46/2020-Plenário).

Considerando que o projeto QATC valoriza e divulga boas práticas de cada instituição responsável pelo controle externo da administração pública e não divulga indicadores de desempenho insatisfatório de forma individualizada, surge um questionamento (natural) sobre como são viabilizados avanços (céleres ou não) na atuação destas relevantes instituições com base na avaliação realizada.

Necessidade de amplo debate

Por outro lado, e não menos relevante, artigo evidenciou que a priorização do diálogo eleva as chances da resolução de problemas no país por meio de uma tomada de decisão responsiva, inclusiva, participativa e representativa em todos os níveis.

Assim, é fundamental um “amplo debate junto às instituições que compõem o sistema de controle externo”, bem como “dialogar com as diversas entidades associativas e colegiados que representam membros e servidores, dos próprios Tribunais de Contas (TCs) e do Ministério Público de Contas (MPC)”, conforme ponderações recentes da Comissão de administração e serviço público da Câmara dos Deputados no Projeto de lei PLP 79/2022.

Além disso, as normas da organização internacional das instituições superiores de controle (Intosai) ressaltam:

“SAIs [Supreme Audit Institutions] manages their operations economically, efficiently, effectively and in accordance with laws and regulations and reports publicly on these matters. […] SAIs measure and report on the efficiency and effectiveness with which they use their funds. SAIs may also use audit committees, made up of a majority of independent members, to review and provide input to their financial management and reporting processes. SAIs may use performance indicators to assess the value of audit work for Parliament, citizens and other stakeholders.” (GUID 9040)

Diante da relevância do controle externo, das valiosas e tradicionais avaliações que vêm sendo realizadas no projeto QATC, da adesão voluntária de diversos tribunais, da falta (legítima) de divulgação das informações individualizadas e dos esforços para o efetivo controle social, cada tribunal pode prestar contas regulamente à sociedade brasileira sobre como vem aprimorando sua atuação em cada indicador QATC, em sintonia com as recomendações da Intosai e a essência do programa nacional de transparência pública.

 


[1] “Pontuação 1 – Nível de base: as práticas avaliadas ainda são insatisfatórias.

A prática avaliada existe, mas os seus aspectos são muito básicos. O Tribunal pode, por exemplo, ter deficiências estruturais, como nos controles internos e corregedoria; carecer de planos de ação estratégicos e de desenvolvimento, de estratégia sólida de gestão de pessoas ou de estratégia de comunicação; executar auditorias de conformidade sem o emprego de normas e técnicas modernas de auditoria e dar baixa abrangência às auditorias; a função da auditoria operacional pode não existir ou praticamente não ter sido desenvolvida; os relatórios de auditoria podem não ser elaborados adequadamente”. (Manual de procedimentos)

Autores

  • é professor da Faculdade de Direito do Recife (UFPE), conselheiro substituto do TCE-PE. Visiting Scholar Harvard Law School.

  • é auditor do TCU, especialista no aperfeiçoamento da administração pública e no desenvolvimento dos setores com equilíbrio entre os agentes envolvidos, mestre pela USP, pesquisador sobre a atuação do controle externo exercido pelos Tribunais de Contas, premiado pela Escola de Contas do TCE-RJ em 2021 (1° lugar) e 2023 (2° lugar) e ex-especialista em regulação da Aneel.

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