Duas correntes

STJ diverge sobre reenquadrar réu no artigo 11 da LIA em recurso da defesa

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24 de outubro de 2024, 14h32

Está em julgamento na 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça a possibilidade de, em recurso exclusivo da defesa, o julgador reenquadrar a conduta do réu em um dos incisos da redação atual do artigo 11 da Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.492/1992).

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Prefeito foi condenado com base em artigo genérico da antiga LIA

O colegiado já tem duas posições. Relator, o ministro Paulo Sérgio Domingues defendeu o reenquadramento da conduta. Abriu a divergência o ministro Mauro Campbell, para quem a ação deve ser extinta. O julgamento foi interrompido por pedido de vista do ministro Afrânio Vilela.

O caso trata de ação ajuizada contra Mauro Gilberto Fantini, o Katiazão (PSD), atual prefeito de General Salgado (SP). Ele foi acusado de improbidade por dispensar licitação para contratar uma banda para o carnaval da cidade em 2011, quando também ocupava o cargo.

Katiazão foi condenado com base no artigo 11 da LIA, que definia, de forma genérica, como ilícito o ato ou omissão que atentasse contra os princípios da administração pública.

Em 2021, a chamada nova Lei de Improbidade Administrativa (Lei 14.230/2023) alterou a redação do dispositivo. A condenação agora exige que se aponte qual conduta específica foi praticada, entre as opções listadas nos incisos do artigo 11.

A mudança passou a retroagir para casos não definitivos, conforme interpretação do Supremo Tribunal Federal e do próprio STJ.

O tribunal passou a se deparar com um dilema. Se a condenação se deu com base na redação anterior do artigo 11, a conduta do réu pode ser reenquadrada para a redação atual da norma? Ou isso deve levar à extinção da ação?

No caso de Katiazão, há um agravante: o Ministério Público de São Paulo, autor da ação de improbidade, não recorreu. A única análise que pode ser feita no STJ é com base nas alegações da defesa do prefeito.

Reenquadrar o ilícito

O ministro Paulo Sérgio Domingues propôs que a 1ª Seção declare a possibilidade de reenquadrar a conduta de Katiazão a algum dos incisos da atual redação do artigo 11 da LIA — no caso, o inciso V, que trata de frustrar licitação.

Ele replicou uma solução que já foi dada em julgamento recente da 1ª Turma, que adotou a tese da continuidade típico-normativa, que ocorre quando uma conduta tem sua tipificação em lei revogada, mas continua sendo ato ilícito em uma nova norma.

Até o momento, esse entendimento foi acompanhado pelo ministro Benedito Gonçalves, que leu voto-vista na sessão desta quarta-feira (23/10).

Em aditamento ao voto, Domingues defendeu que essa interpretação está de acordo com posição do Supremo Tribunal Federal, que tratou do tema no julgamento em que definiu as hipóteses de aplicação retroativa da nova LIA.

A terceira tese firmada pelo STF diz que a nova LIA, ao excluir a modalidade culposa da improbidade, se aplica aos atos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado.

E que, nesses casos, cabe ao juiz competente analisar se existe dolo por parte do agente para justificar a condenação. Para o relator, isso abre três possibilidades:

1) Se os fatos descritos no acórdão indicarem o dolo específico do réu, o STJ pode manter a condenação, aplicando a continuidade típico-normativa;

2) Se essa análise depender de fatos e provas, caberá a devolução do processo ao tribunal de origem;

3) Se os fatos descritos no acórdão descartarem o enquadramento da conduta à nova redação do artigo 11 da LIA, caberá reconhecer a atipicidade e a extinção da ação.

“Com isso, privilegia-se a vontade expressa do legislador de que a conduta antes abarcada pelo caput ou dos incisos I e II do artigo 11 permaneça ímproba, agora expressamente prevista em seus demais incisos”, analisou.

Extinguir a ação

Abriu divergência o ministro Mauro Campbell, hoje corregedor nacional de Justiça, mas que integrava a 1ª Seção quando o julgamento foi iniciado, em 28 de agosto. Ele defendeu a extinção da ação.

Isso porque o recurso analisado é exclusivo da defesa. Para a acusação, o enquadramento da conduta é questão preclusa. Assim, a condenação pela nova capitulação do artigo 11 ofenderia o contraditório, a ampla defesa e o devido processo legal.

Além disso, ele defendeu que reconhecer a continuidade-típico normativa da conduta atribuída ao réu ultrapassa a função do STJ, que é de conferir unidade ao Direito Federal.

“Cabe notar que o processo é um caminhar para frente. A questão da análise do elemento subjetivo está preclusa e o que foi devolvido a esta corte é suficiente para extinguir o processo, em razão da abolição da conduta até então prevista ano artigo 11”, disse.

EAREsp 1.748.130

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