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Código Civil deve proteger herança digital e assegurar neurodireitos

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19 de outubro de 2024, 8h54

A reforma do Código Civil deve dar especial atenção à proteção dos direitos fundamentais na internet. Além disso, deve proteger a herança digital de quem morre e assegurar que as big techs não usem neurotecnologias para estimular as pessoas a adotar determinados comportamentos.

Laura Porto, Elton Leme e Dierle Nunes em evento da FGV Justiça

Foi o que afirmaram especialistas no assunto nesta sexta-feira (18/10), no primeiro encontro da série “Reforma do Código Civil em Foco”, ocorrido na FGV do Rio de Janeiro. O anteprojeto da reforma do código foi apresentado em abril deste ano por uma comissão de juristas criada pelo Senado.

Mediador do painel “Direitos fundamentais e a tutela da personalidade na reforma do Código Civil”, Elton Leme, desembargador do Tribunal de Justiça do Rio e coordenador adjunto da FGV Justiça, apontou que a reforma deve enfrentar duas realidades intransponíveis dos dias atuais: a mudança climática e a comunicação em tempo real, proporcionada pela tecnologia.

“O grande desafio é como enfrentar a imensa velocidade das novas tecnologias e como o Direito, sempre reativo, consegue se adequar a essa realidade, evitar e desestimular os conflitos”, avaliou Leme.

Neurodireitos

A advogada Laura Porto, sub-relatora da Subcomissão de Direito Digital para a Reforma do Código Civil, destacou que o anteprojeto cria um novo livro para tratar de Direito Digital. Um dos pontos tratados pela proposta é a responsabilização das big techs.

O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luís Roberto Barroso, anunciou na quarta-feira (16/10) que o Plenário da corte vai julgar, na sessão de 27 de novembro, o conjunto de ações que discute o Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014) e a possibilidade de responsabilização de plataformas por conteúdos publicados por usuários.

Outro aspecto importante do anteprojeto, segundo Laura, é o regramento das neurotecnologias. Trata-se do conjunto de tecnologias que interagem diretamente com o cérebro ou o sistema nervoso central, seja para monitorar, registrar, modificar ou simular atividades neurais.

Em tese, as neurotecnologias são neutras. Porém, elas podem ser usadas para estimular emoções, como a vontade de comprar ou até de matar outras pessoas, destaca a advogada.

Nesse contexto, surgem os neurodireitos, estabelecidos na proposta. O texto visa à proteção de alterações não autorizadas no cérebro ou atividades cerebrais, assim como a garantia contra práticas discriminatórias ou enviesadas a partir de dados cerebrais.

Herança digital

Dierle Nunes, membro da Subcomissão de Direito Digital para a Reforma do Código Civil e professor da Universidade Federal de Minas Gerais, afirmou que a intensificação da vida digital alterou a autonomia privada.

Os ambientes das plataformas digitais não são praças públicas, mas modelos de negócios, declarou Nunes. Segundo ele, as big techs coletam nossos dados e os usam para nos induzir a determinados comportamentos. Isso altera a autonomia privada.

“Antes, o sistema jurídico era baseado no Estado. Mas hoje é preciso pensar também nas big techs. Será que nós estamos realmente escolhendo as coisas no mundo digital?”, perguntou ele.

Recentemente, o Tribunal de Justiça de São Paulo reconheceu o direito de uma mãe ao patrimônio digital da filha que morreu, o que inclui o desbloqueio do celular dela. “Você se sentiria confortável com seus familiares tendo acesso a toda a sua vida digital após você morrer? É preciso pensar nisso”, questionou Nunes, defendendo a regulamentação da herança digital.

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