AUGE DA PANDEMIA

STJ diverge sobre nova denúncia contra governador do Amazonas por desvio

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17 de outubro de 2024, 10h50

Um pedido de vista em decorrência da divergência dos ministros interrompeu, nesta quarta-feira (16/10), a análise da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça sobre o recebimento de nova denúncia contra o governador do Amazonas, Wilson Lima (União Brasil), e outros.

Lima é acusado de peculato na contratação do transporte para os respiradores adquiridos

O grupo é acusado de desviar verbas para transporte dos ventiladores pulmonares, de São Paulo (SP) a Manaus (AM), que foram comprados emergencialmente no auge da crise decorrente da pandemia de Covid-19.

Trata-se da segunda denúncia por supostos desvios durante a emergência sanitária. A primeira (Apn 993) foi recebida pela Corte Especial em 2021 e ainda não teve julgamento de mérito.

Naquele caso, o Ministério Público Federal sustentou que Wilson Lima e outras 12 pessoas formaram organização criminosa para praticar fraude licitatória na compra de 28 ventiladores pulmonares, fechando contrato de forma direcionada.

A nova denúncia aponta que esse contrato colocava sob responsabilidade da empresa contratada o transporte dos equipamentos adquiridos. Ainda assim, o governo pagou R$ 191,8 mil para que eles fossem levados de São Paulo (SP) a Manaus (AM).

Relator, o ministro Francisco Falcão votou por receber a denúncia pelo crime de peculato, previsto no artigo 312 do Código Penal. Revisora, a ministra Nancy Andrighi votou no mesmo sentido. A ministra Maria Thereza de Assis Moura também acompanhou os dois colegas.

Abriu a divergência o ministro Raul Araújo, para quem não há materialidade no caso diante do contexto emergencial e da forma como o transporte foi preparado e negociado. Votaram com ele os ministros Og Fernandes, Humberto Martins, Sérgio Kukina e Sebastião Reis Júnior. Pediu vista o ministro João Otávio de Noronha.

Melhor tramitar a ação penal

Na denúncia mais recente, a posição do Ministério Público Federal é de que os acusados, cientes da ilicitude da conduta, desviaram quantia dos cofres públicos em proveito da empresa fornecedora.

“Ela, que deveria suportar os custos do transporte, não pagou nenhum centavo para cumprir obrigação, porque custo foi suportado ilegalmente pelo estado do Amazonas”, disse o subprocurador da República Hindemburgo Chateaubriand Pereira Diniz.

A defesa de Wilson Lima, feita pelo advogado Nabor Bulhões, rejeitou a ocorrência de crime e explicou que a aeronave que fez o transporte foi a São Paulo para recolher doações de álcool em gel e aproveitou para acelerar a obtenção dos aparelhos. “E fez isso porque as pessoas estavam morrendo”, disse.

Relator, o ministro Francisco Falcão destacou que a denúncia só é rejeitada quando se referir a algum fato atípico certo, apreciável desde logo, sem a necessidade de qualquer produção de prova.

Assim, concluiu que existe justa causa para considerar o governador do Amazonas e outros como partícipes de peculato, conforme narrado na inicial. “Considero que a denúncia é apta e existe justa causa para prosseguir processo criminal”, disse.

Ação justificada

Abriu a divergência o ministro Raul Araújo, para quem a denúncia deve ser rejeitada sem depender de produção de prova. Segundo ele, o próprio MPF não indicou testemunhas por entender que fatos têm prova documental de natureza irrepetível.

Para ele, a dinâmica dos fatos mostra que não houve dolo nas ações dos denunciados. Isso porque, diante da crise sanitária, a ordem para providenciar o transporte foi dada em paralelo à negociação de compra dos ventiladores pulmonares.

Ou seja, antes de assinar um contrato que delegava à empresa contratada a responsabilidade por arcar com o transporte dos equipamentos, o governo já tentava viabilizar — como de fato ocorreu — uma aeronave que pudesse levá-los a Manaus o mais rápido possível.

Ao votar com a divergência, o ministro Og Fernandes destacou que os fatos são de abril de 2020, portanto antes da existência da vacina contra Covid-19 e em momento em que os olhos do país estavam voltados para a situação grave no Amazonas.

“As pessoas estavam morrendo sufocadas por falta de oxigênio. Chamo atenção para essas cenas, que são das mais difíceis de serem assistidas. As pessoas morreram porque não tinha oxigênio. Sufocadas”, relembrou.

Para o ministro Og, a compreensão do Direito há de ser feita a partir de uma visão da época em que os fatos ocorreram. Assim, classificou a segunda denúncia como “excesso acusatório”, já que carrega elementos da outra ação penal, mas sem justificativa.

Inq 1.746

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