Prática Trabalhista

Novas regras e diretrizes para o Programa de Alimentação do Trabalhador

Autores

  • Ricardo Calcini

    é professor advogado parecerista e consultor trabalhista. Atuação estratégica e especializada nos Tribunais (TRTs TST e STF). Coordenador trabalhista da Editora Mizuno. Membro do Comitê Técnico da Revista Síntese Trabalhista e Previdenciária. Membro e Pesquisador do Grupo de Estudos de Direito Contemporâneo do Trabalho e da Seguridade Social da Universidade de São Paulo (Getrab-USP) do Gedtrab-FDRP/USP e da Cielo Laboral.

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  • Leandro Bocchi de Moraes

    é pós-graduado lato sensu em Direito do Trabalho e Processual do Trabalho pela Escola Paulista de Direito (EPD) pós-graduado lato sensu em Direito Contratual pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) pós-graduado em Diretos Humanos e Governança Econômica pela Universidade de Castilla-La Mancha pós-graduando em Direitos Humanos pelo Centro de Direitos Humanos (IGC/Ius Gentium Coninbrigae) da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra membro da Comissão Especial da Advocacia Trabalhista da OAB-SP auditor do Tribunal de Justiça Desportiva da Federação Paulista de Judô e pesquisador do núcleo O Trabalho Além do Direito do Trabalho da Universidade de São Paulo (NTADT/USP).

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17 de outubro de 2024, 10h19

Hodiernamente, os cuidados com a saúde dos trabalhadores estão na pauta das grandes maiores preocupações para o Direito do Trabalho, de sorte que o cuidado com a alimentação se revela ainda mais indispensável. Neste atual contexto, recentemente o Ministério do Trabalho e Emprego atualizou as regras concernentes ao Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT).

O que é o PAT (Programa de Alimentação do Trabalhador)?

O PAT é um programa governamental de adesão voluntária e que busca, sobretudo, a melhoria da situação nutricional dos trabalhadores, visando, ao final e ao cabo, a efetiva promoção da saúde e a prevenção de doenças profissionais, tudo isso por meio da concessão de incentivos fiscais destinados às empresas [1].

Ora, considerando que se trata de uma novidade e que este assunto traz impactos à sociedade, a temática foi indicada por você, leitor(a), para o artigo da semana na coluna Prática Trabalhista, da revista Consultor Jurídico (ConJur) [2], razão pela qual agradecemos o contato.

Legislação

Do ponto de vista normativo no Brasil, o artigo 458 da CLT [3] dispõe que além do pagamento em dinheiro, compreende-se no salário do trabalhador os valores pagos a título de alimentação. Entrementes, salvo nos casos previstos em norma coletiva ou naqueles em que conste disposição expressa no contrato de trabalho, o empregador não é obrigado a fornecer alimentação ao trabalhador.

Vale dizer, a adesão do empregador ao PAT é facultativa, contudo, uma vez feita a inscrição e o registro, em caso de descumprimento das regras do programa poderá haver naturalmente sanções daí decorrentes.

Spacca

À vista disso, impende destacar que o Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT) foi instituído pela Lei nº 6.321, de 14 de abril de 1976, e, atualmente, encontra-se regulamentado pelo Decreto nº 10.854, de 10 de novembro de 2021, com instruções complementares estabelecidas pela Portaria MTP/GM nº 672, de 8 de novembro de 2021 [4].

Frise-se que a legislação do PAT ao longo dos anos foi passando por uma verdadeira “metamorfose”, sendo que desde 1976 foram promulgados diversos decretos para a regulamentação da Lei 6.321/79 [5].

Lição de especialista

A propósito, oportunos são os ensinamentos do professor Carlos Henrique Bezerra Leite [6]:

“Nos termos dos §§ 3º e 4º do artigo 458 da CLT (cm redação dada pela Lei 8.860/94), a habitação e a alimentação fornecida como salário utilidade deverão atender aos fins a que se destinam e não poderão exceder, respectivamente, a 25% e 20% do salário contratual. No caso do empregado rural, os percentuais não podem exceder a 20% para moradia e 25% para alimentação (Lei 5.889/73. artigo 9º).

Os artigos 166 e 182 do Decreto 10.854, a parcela paga in natura pela pessoa jurídica beneficiária, no âmbito do PAT, ou disponibilizada na forma de instrumentos de pagamentos, vedado o seu pagamento em dinheiro:

I – não tem natureza salarial; II – não se incorpora à remuneração para quaisquer efeitos; e III – não constitui base de incidência de FGTS. A execução inadequada, o desvio ou o desvirtuamento das finalidades do PAT pelas pessoas jurídicas beneficiárias ou pelas empresas registradas no Ministério do Trabalho e Previdência, sem prejuízo da aplicação de outras penalidades cabíveis pelos órgãos competentes, acarretará, nos termos do artigo 179 do referido Decreto: I – o cancelamento da inscrição da pessoa jurídica ou do registro da empresa fornecedora ou facilitadora de aquisição de refeições ou gêneros alimentícios no PAT, desde a data da primeira irregularidade passível de cancelamento, conforme estabelecido em ato específico; e II – a perda do incentivo fiscal da pessoa jurídica beneficiária pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Economia”. 

Objetivos do PAT

É cediço que o PAT tem por objetivo atender os trabalhadores de baixa renda, de modo quem caso a empresa opte em participar de tal projeto, deve a companhia respeitar, por certo, alguns requisitos após ter o deferimento do seu requerimento atendido pela Diretoria de Segurança e Saúde do Trabalhador, da Secretaria de Inspeção do Trabalho.

E dentre os principais benefícios concedidos através do programa está o fornecimento de refeição pronta aos trabalhadores, tal como almoço e jantar, ou então a cesta de alimentos e o convênio para alimentação.

Aliás, de um lado, o PAT favorece cerca de 21.961.737 trabalhadores, sendo 86% deles com renda de até cinco salários-mínimos. Lado outro, o programa conta com 469.161 empresas participantes, 18.701 fornecedores de alimentação coletiva e 35.447 nutricionistas cadastrados [7].

Para as empresas beneficiárias do PAT a vantagem seria a isenção dos encargos sociais, assim como a dedução de parte das despesas relativas ao imposto de renda caso sejam optantes pela tributação no lucro real.

Quem pode utilizar o serviço?

Spacca

Impende destacar que o poderão se inscrever no programas [8]: i) Beneficiárias, que é a pessoa jurídica de direito público ou privado, e os empregadores que possuam Cadastro de Atividade Econômica da Pessoa Física (CAEPF) ou Cadastro Nacional de Obras (CNO), que contratem trabalhadores e concedam benefícios nos termos do PAT, seja por meio de alimentação propriamente dita, ou instrumentos de pagamento (vale-refeição e/ou vale-alimentação); ii) Fornecedora, que é a pessoa jurídica que forneça alimentos aos empregadores cadastrados no PAT como beneficiária; iii) Facilitadora, que é a empresa que possui como atividade a emissão de moeda eletrônica para atendimento dos pagamentos no PAT; e iv) Nutricionista, que é a pessoa física graduada em nutrição e com registro no Conselho Regional de Nutrição.

Portaria MTE nº 1.707, de 10 de outubro de 2024

Entrementes, com o intuito de evitar práticas irregulares, doravante as novas diretrizes traçadas pela Portaria MTE nº 1.717, de 10 de outubro de 2024 [9], proíbem as empresas de exigir ou receber descontos sobre o valor acordado ou qualquer outro benefício indireto, sob pena de serem multadas em valores que variam entre R$ 5 mil e R$ 50 mil reais, assim como terem contra si o cancelamento da inscrição no PAT, para além da perda do respectivo incentivo fiscal [10].

Além disso, pelas atuais regras, é desautorizado que seja concedido algum benefício que não se relacione diretamente com a saúde e segurança alimentar e nutricional, como, por exemplo, serviços ou produtos relativos a atividades físicas esportes, lazer, entre outros [11].

Mais a mais, de acordo com o artigo 5º da referida portaria ministerial, as empresas facilitadoras também não poderão antever: (i) qualquer tipo de deságio ou descontos sobre o valor contratado; (ii) prazos de repasse que descaracterizem a natureza pré-paga dos valores a serem disponibilizados aos trabalhadores; ou (iii) verbas e benefícios diretos ou indiretos de qualquer natureza não vinculados diretamente à promoção da saúde e segurança alimentar do trabalhador.

Conclusão

Em arremate, é forçoso ressaltar que este benefício alimentar não possui natureza salarial e, por conseguinte, não se incorpora à remuneração do trabalhador para quaisquer efeitos. Entretanto, em se tratando de benefícios concedidos em desacordo com a legislação do PAT, em tese há risco de integração ao salário. De resto, caso o empregador habitualmente forneça o benefício em dinheiro, ainda que força de norma coletiva, este não poderá se inscrever no Programa de Alimentação do Trabalhador.

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[1] Disponível em https://www.gov.br/trabalho-e-emprego/pt-br/servicos/empregador/programa-de-alimentacao-do-trabalhador-pat/faq-atualizacao-cgsst_ago23.pdf. Acesso em 15.10.2024.

[2] Se você deseja que algum tema em especial seja objeto de análise pela coluna Prática Trabalhista, entre em contato diretamente com os colunistas e traga sua sugestão para a próxima semana.

[3] CLT, Art. 458. Além do pagamento em dinheiro, compreende-se no salário, para todos os efeitos legais, a alimentação, habitação, vestuário ou outras prestações “in natura” que a empresa, por fôrça do contrato ou do costume, fornecer habitualmente ao empregado. Em caso algum será permitido o pagamento com bebidas alcoólicas ou drogas nocivas.

[4] Disponível em https://www.gov.br/trabalho-e-emprego/pt-br/servicos/empregador/programa-de-alimentacao-do-trabalhador-pat#:~:text=O%20Programa%20de%20Alimenta%C3%A7%C3%A3o%20do,8%20de%20novembro%20de%202021. . Acesso em 15.10.2024.

[5] Disponível em https://www.gov.br/trabalho-e-emprego/pt-br/servicos/empregador/programa-de-alimentacao-do-trabalhador-pat/legislacao-pat/legislacao-pat-decretos. Acesso em 15.10.2024.

[6] Curso de Direito do Trabalho. 14 ed. – São Paulo: SaraivaJur, 2022. Página 588.

[7] Disponível em https://www.migalhas.com.br/quentes/417371/portaria-estabelece-novas-regras-sobre-o-pat. Acesso em 15.10.2024.

[8] Disponível em https://www.gov.br/pt-br/servicos/cadastrar-se-como-beneficiaria-fornecedora-e-nutricionista-no-programa-de-alimentacao-do-trabalhador-pat. Acesso em 15.10.2024.

[9] Disponível em https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-mte-n-1.707-de-10-de-outubro-de-2024-589502338. Acesso em 15.10.2024.

[10] Art. 6º O descumprimento do disposto nesta Portaria sujeitará as pessoas jurídicas beneficiárias do PAT às seguintes sanções, previstas no art. 3º-A da Lei nº 6.321, de 14 de abril de 1976, sem prejuízo da aplicação de outras penalidades cabíveis pelos órgãos competentes:

I – aplicação de multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), a qual será aplicada em dobro em caso de reincidência ou de embaraço à fiscalização; II – cancelamento da inscrição no PAT, desde a data da primeira irregularidade passível de cancelamento; e III – perda do incentivo fiscal, em consequência do cancelamento previsto no inciso II deste artigo.

 

[11] Art. 4º São vedados quaisquer benefícios vinculados à saúde do trabalhador que não estejam diretamente relacionados à saúde e segurança alimentar e nutricional proporcionada pelo benefício, como serviços ou produtos relativos a atividades físicas, esportes, lazer, planos de assistência à saúde, estéticos, cursos de qualificação, condições de financiamento ou de crédito ou similares.

Autores

  • é professor, advogado, parecerista e consultor trabalhista, sócio fundador de Calcini Advogados, com atuação estratégica e especializada nos tribunais (TRTs, TST e STF), docente da pós-graduação em Direito do Trabalho do Insper, coordenador trabalhista da Editora Mizuno, membro do comitê técnico da revista Síntese Trabalhista e Previdenciária, membro e pesquisador do Grupo de Estudos de Direito Contemporâneo do Trabalho e da Seguridade Social, da Universidade de São Paulo (Getrab-USP), do Gedtrab-FDRP/USP e da Cielo Laboral.

  • é advogado de Calcini Advogados. Graduação em Direito pela Universidade Braz Cubas. Especialista em Direito Material e Processual do Trabalho pela Escola Paulista de Direito. Especialista em Direito Contratual pela PUC-SP. Especialista em Diretos Humanos e Governança Econômica pela Universidade de Castilla-La Mancha (Espanha). Especialista em Direitos Humanos pelo Centro de Direitos Humanos (IGC - IUS Gentium Coninbrigae), da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (Portugal). Pós-graduando em Direito do Trabalho pela Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo). Pesquisador do Núcleo de pesquisa e extensão: "O Trabalho Além do Direito do Trabalho" do Departamento de Direito do Trabalho e da Seguridade Social da USP, coordenado pelo professor Guilherme Guimarães Feliciano.

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