Opinião

A Resolução nº 571/24 e a alienação de bens do espólio sem a necessidade de intervenção judicial

Autor

  • Victor Pasquale

    é advogado júnior do Amatuzzi Advogados formado em direito pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo e pós-graduado em Direito Notarial e Registral pelo Damásio Educacional e em Direito Negocial e Imobiliário pela Escola Brasileira de Direito.

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10 de outubro de 2024, 19h15

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou, em 27 de agosto de 2024, a Resolução 571/24¹ (Resolução 571), que, entre outros temas, regulamentou a alienação de bens de acervo hereditário antes da conclusão do inventário, sem a necessidade de intervenção do Poder Judiciário.

A alteração tem como objetivo simplificar a venda de imóveis em inventários extrajudiciais, seja por necessidade urgente das partes ou pela falta de recursos dos herdeiros para concluir a partilha.

Muitas vezes, os custos dos emolumentos e impostos do inventário dificultam a divisão do patrimônio ou levam à judicialização do processo, na tentativa de obter alvará judicial que autorize a venda de parte dos bens para gerar liquidez suficiente para cobrir essas despesas.

É bem verdade que este movimento já havia sido antecipado pela Corregedoria Geral da Justiça do estado do Rio de Janeiro, que, em 17 de outubro de 2022, editou o Provimento CGJ 77/22, dispondo sobre a alienação de bens do acervo hereditário, sem a necessidade de intervenção do Poder Judiciário no Rio de Janeiro.

Alienação dos bens do espólio

A alienação dos bens do espólio pelo inventariante não é uma inovação, na medida em que tal procedimento é previsto no artigo 619 do Código de Processo Civil² (CPC). Todavia, nesses casos era necessária a autorização judicial para tanto, o que afetava diretamente a celeridade dos procedimentos imobiliários que envolviam o patrimônio do espólio.

A Resolução 571 institui o artigo 11-A na Resolução CNJ nº 35/2007 (Resolução 35), autorizando o inventariante a alienar móveis e imóveis de propriedade do espólio através de escritura pública, em todo território nacional, independentemente de autorização judicial.

Spacca

A realização do procedimento exige que sejam respeitadas certas disposições que visam a salvaguardar, no todo ou em parte, que o saldo da venda seja suficiente para realizar o pagamento das despesas do inventário, custeando impostos de transmissão, honorários advocatícios, emolumentos notariais e registrais e outros tributos e despesas devidos pela lavratura da escritura de inventário dos bens do falecido.

Para que seja realizada a alienação dos bens de propriedade do espólio pelo inventariante, deverá ser prestada garantia, real ou fidejussória, pelo inventariante, quanto à destinação do produto da venda para o pagamento das despesas do inventário. Este pagamento deverá ocorrer em até 1 (um) ano a contar da venda do bem, sendo que a garantia prestada ficará extinta após o cumprimento da obrigação pelo inventariante. Deverá também ser observada a inexistência de indisponibilidade de bens em face de quaisquer dos herdeiros, cônjuge ou convivente sobrevivente.

Acervo hereditário

O parágrafo terceiro do artigo 11-A da Resolução prevê que o bem alienado será relacionado no acervo hereditário para fins de apuração dos emolumentos do inventário, cálculo dos quinhões hereditários, apuração do imposto de transmissão causa mortis, mas não será objeto de partilha, consignando-se a sua venda prévia na escritura do inventário.

A normatização do procedimento segue em linha com a desjudicialização que vem ocorrendo com relação a diversos procedimentos imobiliários que antes eram exclusivamente processados por meio do Poder Judiciário.

Apesar de a Resolução fixar que o inventariante será autorizado, através de escritura pública, a alienar móveis e imóveis de propriedade do espólio, ao menos que a autorização mencione expressamente o bem que será alienado, recomendamos que haja anuência dos sucessores em eventual ato de disposição de bens do acervo hereditário, seguindo em linha com os julgados recentes do tema que fixam a necessidade de concordância de todos os sucessores³. Isso pode evitar arguições posteriores de nulidade ou anulabilidade do negócio jurídico4.

O novo regramento serve para pacificar o tema no âmbito dos Oficiais de Notas e de Registro de Imóveis, criando um incentivo para que os herdeiros optem pela partilha extrajudicial de bens nos casos em que isso seja interessante. Além disso, a norma contribui para aliviar a carga do Judiciário e tornar o procedimento de alienação dos bens do espólio mais célere.

 


¹ CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Resolução n.º 571 de 26 de agosto de 2024. Disponível em: https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/5705. Acesso em: 04 set. 2024

² BRASIL. Lei n.º 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 04 set. 2024.

³ TJ-SP;  Agravo de Instrumento 2141707-82.2024.8.26.0000; Relator (a): Coelho Mendes; Órgão Julgador: 10ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível – 11ª Vara da Família e Sucessões; Data do Julgamento: 25/07/2024; Data de Registro: 25/07/2024.

4  TJ-SP;  Apelação Cível 1036098-92.2022.8.26.0002; Relator (a): Mônica Rodrigues Dias de Carvalho; Órgão Julgador: 1ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional II – Santo Amaro – 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 21/07/2024; Data de Registro: 21/07/2024

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  • é advogado júnior do Amatuzzi Advogados, formado em direito pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo e pós-graduado em Direito Notarial e Registral pelo Damásio Educacional e em Direito Negocial e Imobiliário pela Escola Brasileira de Direito.

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