Opinião

Cessão de crédito trabalhista para enfrentar endividamento familiar

Autor

9 de outubro de 2024, 13h19

O endividamento das famílias brasileiras alcançou níveis alarmantes nos últimos anos, refletindo uma conjuntura econômica em que o crédito se torna indispensável para a subsistência. Em um cenário em que o comprometimento de renda com dívidas atinge aproximadamente 48% [1], o trabalhador brasileiro se vê cada vez mais vulnerável às altas taxas de juros das modalidades de crédito tradicional. Diante dessa realidade, a cessão de crédito trabalhista surge como uma solução inovadora de acesso ao crédito, capaz de mitigar os efeitos do endividamento e da inadimplência, oferecendo previsibilidade financeira.

Freepik

A prática da cessão de crédito trabalhista consiste na transferência do valor de um processo em andamento em que o trabalhador, como parte reclamante, tem potencial direito a receber, permitindo que ele antecipe esses recursos em discussão judicial. Em termos práticos, a cessão permite ao trabalhador obter liquidez mais rapidamente, mitigando o risco do processo, com taxas muito mais competitivas em relação às oferecidas pelo mercado tradicional de crédito.

A relevância da cessão de crédito torna-se evidente ao se considerar o cenário da Justiça do Trabalho no Brasil. Atualmente, são registrados mais de 10 milhões de processos trabalhistas ativos no país [2]. Esses números, além de refletirem uma sobrecarga no sistema judiciário, resultam, inevitavelmente, em longos prazos para a resolução dos litígios. Dados da Justiça do Trabalho indicam que a duração média dos processos trabalhistas contra as maiores empresas no país varia entre 33 e impressionantes 84 meses, dependendo da empresa envolvida e do tipo de causa.

Impacto com a demora da Justiça

A morosidade dos processos não só dificulta o acesso aos valores devidos, mas também amplia a insegurança financeira e emocional do trabalhador, que não tem previsibilidade sobre quando poderá contar com esses recursos. A falta de liquidez e a dependência de crédito de curto prazo têm impacto direto na qualidade de vida, comprometendo não apenas a saúde financeira, mas também o bem-estar mental e físico do trabalhador.

Nesse contexto, a cessão aparece como uma oferta de alívio imediato, permitindo que o trabalhador antecipe o recebimento de seu crédito, organize seus prazos de pagamento junto à previsão de pagamento e, assim, reduza sua exposição ao endividamento prolongado. Este último, vale a ênfase, é um dos principais fatores de corrosão da renda das famílias brasileiras.

Em muitos casos, o trabalhador que perdeu seu emprego já está endividado e, ao longo do processo judicial, acaba sendo forçado a recorrer a linhas de crédito com taxas elevadas e piores condições, resultando em um ciclo de endividamento, em que o trabalhador toma novos empréstimos para cobrir dívidas anteriores, agravando sua situação financeira, numa espiral de corrosão de renda.

Spacca

A análise dos dados do Sistema Financeiro Nacional (SFN) reforça a necessidade de alternativas mais favoráveis ao trabalhador. O saldo das operações de crédito às famílias brasileiras atingiu R$ 4 trilhões (sim, trilhões) no primeiro semestre de 2024, o que representa 35,7% do PIB, com crescimento de 12,2% em 12 meses [3]. Embora esses números mostrem uma maior acessibilidade ao crédito, eles também indicam dependência crescente das famílias em relação às linhas de crédito para manter consumo e arcar com despesas básicas.

Perdas com taxas de juros

No entanto, esse aumento no volume de crédito não se traduz em melhores condições financeiras para os trabalhadores; pelo contrário, dado que a taxa média de juros para pessoas físicas em crédito livre, no primeiro semestre de 2024, foi de 51,2% a.a., com o cheque especial atingindo 127,6% a.a., e o rotativo de cartão de crédito alcançando impressionantes 442% a.a. [4]. Esses números demonstram o quão caro é para o trabalhador comum acessar crédito tradicional.

Outro fator que torna a cessão de crédito trabalhista uma alternativa atraente é a segurança jurídica. A cessão não impõe risco ao trabalhador, dado que o risco da transação é assumido pela empresa cedente e não é repassado ao trabalhador. Assim, mesmo que o reclamante que cedeu o crédito não vença o caso na Justiça do Trabalho, isso não afetará a transação, dada a natureza não-recuperável da cessão para o trabalhador.

Ao oferecer liquidez imediata a taxas mais competitivas, com segurança jurídica e previsibilidade, esse instrumento se destaca como uma alternativa mais vantajosa em um mercado de crédito saturado por taxas elevadas e riscos consideráveis. A proteção financeira, a redução da insegurança e o bem-estar promovidos pela cessão de crédito são aspectos fundamentais para a construção de uma economia mais equilibrada e inclusiva, que reconhece e atende às necessidades dos trabalhadores em tempos de vulnerabilidade.

 


[1] Banco Central do Brasil. Estatísticas monetárias e de crédito. Nota para a imprensa, Ago/2024. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/estatisticas/estatisticasmonetariascredito.

[2] Datalawyer

[3] Banco Central do Brasil. Estatísticas monetárias e de crédito. Nota para a imprensa, Ago/2024. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/estatisticas/estatisticasmonetariascredito.

[4] G1. Cartão de crédito: juro volta a subir em março, mesmo com medida que limita dívida no rotativo. 2024. Disponível em: https://g1.globo.com/economia/noticia/2024/05/03/cartao-de-credito-juro-volta-a-subir-em-marco-mesmo-com-medida-que-limita-saldo-devedor-no-rotativo.ghtml.

Autores

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!