Essencialidade de bem na recuperação judicial exige decisão detalhada, decide TJ-MT
28 de novembro de 2024, 18h09
A declaração de essencialidade de um bem no processamento da recuperação judicial deve ser detalhada para permitir a revitalização da empresa sem prejudicar o direito dos credores de obter prestação jurisdicional motivada.
Com esse entendimento, a 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso decidiu, por unanimidade, afastar a declaração de essencialidade de três caminhões de uma transportadora em recuperação. O acórdão atendeu ao agravo de um banco que havia viabilizado a compra dos veículos pela transportadora mediante um financiamento, três meses antes de ela ingressar com a recuperação judicial.
Na perícia prévia, o administrador judicial relatou que a maior parte dos bens móveis, o que inclui os caminhões, não havia sido encontrada nos pátios da empresa porque estava em rota.
Considerando isso e o perfil operacional dela, o administrador propôs, então, ser “possível afirmar a essencialidade de 25 veículos e 87 reboques e semi-reboques”, para que fossem mantidos sob posse da empresa, a fim de que ela pudesse dar continuidade à operação enquanto estivesse submetida ao processo de recuperação.
Já a transportadora, na altura em que requereu o processamento da RJ, argumentou que, em razão da suspensão das execuções de um outro grupo em recuperação judicial para o qual prestava serviços, teve prejuízo de R$ 4 milhões em fevereiro deste ano. Ainda assim, no mês seguinte, fez a compra financiada dos caminhões por R$ 3 milhões.
Para o relator do agravo, desembargador Rubens de Oliveira Santos Filho, ficou claro, portanto, que não há como reconhecer a essencialidade desses bens. “O relatório do administrador judicial trouxe somente elementos genéricos, e os recuperandos não se desincumbiram do ônus de produzirem prova inequívoca a esse respeito”, escreveu.
Suspeita de fraude
O TJ-MT ainda determinou a instauração de um incidente em autos separados para apurar uma possível fraude perpetrada pela transportadora, conforme suspeita levantada pelo banco no agravo. A instituição financeira identificou que, desde 2022, a empresa adquiriu uma enorme frota de caminhões, fazendo seu endividamento saltar de cerca de R$ 760 mil para quase R$ 19 milhões.
Além disso, em documento apresentado ao banco para obter o financiamento, a empresa havia declarado lucro de R$ 2,3 milhões em 2023, enquanto, no processamento da recuperação, declarou prejuízo de R$ 2,2 milhões no mesmo ano. Ou seja, a suspeita é de que a transportadora teria usado uma estratégia de alavancagem patrimonial mediante o endividamento premeditado, já com a finalidade de pleitear a recuperação judicial posteriormente.
“Em verdade, suspeita-se que a recuperanda tenha agido desta forma para obstar que os credores extraconcursais, detentores das garantias com alienação fiduciária, possam praticar o exercício regular do seu direito, ajuizar as respectivas ações de busca e apreensão e retomar as garantias”, argumentou o banco.
O relator no TJ-MT destacou que a alavancagem patrimonial não havia sido suscitada no juízo de primeiro grau e não poderia ter o mérito analisado na via do agravo de instrumento, sob pena de supressão de instância. “No entanto, não há como não se atentar para a gravidade dos fatos narrados pelo agravante, os quais devem ser apreciados, obviamente com a garantia da ampla defesa e do contraditório pelos recuperandos”, escreveu o relator ao determinar a análise da suspeita em autos apartados da recuperação judicial.
Atuaram em prol do banco os advogados Marcelo Carvalho e Kildare Moraes, sócios do escritório Queiroz Cavalcanti Advocacia.
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Processo 1026656-57.2024.8.11.0000
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