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Pedido de extinção de ações criminais contra Trump é estratégia para salvá-las

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27 de novembro de 2024, 21h33

O pedido de trancamento dos dois processos criminais contra o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, que correm na Justiça Federal foi o melhor que o Departamento de Justiça (DOJ) poderia fazer, diante das circunstâncias.

Donald Trump em 2024.

DOJ ainda tenta salvar dois processos criminais contra Donald Trump

Trump declarou que, ao assumir a presidência, a nova direção do DOJ, sob seu comando, demitirá o procurador especial do órgão, Jack Smith, e pedirá a extinção dessas duas ações criminais — de uma maneira que as faça desaparecer para sempre.

Nem uma coisa, nem outra, vai acontecer. Em primeiro lugar, Smith anunciou que vai se demitir antes da posse de Trump. Em segundo, ele se antecipou à ação anunciada pelo presidente eleito e pediu, ele mesmo, o trancamento dos processos — e o fez de uma maneira que pode evitar que as ações desapareçam para sempre.

Um dos processos se refere às tentativas do então presidente de subverter o resultado das eleições de 2020, que ele perdeu para o presidente Joe Biden. Trump foi acusado de fraudar os Estados Unidos, obstruir um procedimento oficial, conspirar contra direitos (dos eleitores) e conspirar para obstruir um procedimento oficial.

Nesse caso, o resultado esperado pelo DOJ foi imediato. No mesmo dia, a juíza Tanya Chutkan, de um tribunal federal em Washington, DC., decidiu “extinguir o processo sem julgamento do mérito” (dismiss the case without prejudice).

Nos EUA, faz toda a diferença do mundo extinguir uma ação with prejudice ou without prejudice.

Extinguir um processo with prejudice significa que o caso é encerrado permanentemente. É “finito”, não pode ser ressuscitado em qualquer corte.

No entanto, extinguir um processo without prejudice significa que o caso pode ser reaberto em algum tempo no futuro. Há algumas razões que sustentam um pedido para colocar um processo para “dormir” temporariamente, em vez de matá-lo.

Nesse caso específico, a razão é que há um impedimento fundamental, que foi alegado pelo procurador especial, para continuar com o processo:

“A posição do Departamento de Justiça é a de que a Constituição requer que esse caso seja extinto antes da posse (do presidente eleito). Esse pedido não se baseia no mérito ou na força do caso contra o réu”, escreveu Smith em sua petição.

Além disso, há uma política de longa data do Departamento de Justiça que proíbe processar um presidente em exercício. Essa política foi reforçada pela recente decisão da Suprema Corte de que presidentes têm um alto grau de imunidade contra ações criminais porque suas funções executivas não podem ser perturbadas por elas, justifica Smith.

Prazo de prescrição é uma dúvida

A decisão da juíza de extinguir o processo sem julgamento do mérito significa que o futuro DOJ de Trump não poderá pedir, de acordo com suas conveniências, a extinção de um caso que já está extinto. Mas poderá “criar um caso”, que poderá terminar na Suprema Corte.

A regra sobre extinção de processo without prejudice traz uma limitação, que certamente será objeto de contestação: ela só vale — isto é, o caso só poderá ser reaberto — se o prazo de prescrição não estiver expirado.

Nos EUA, o prazo de prescrição é de cinco anos para a maioria dos crimes federais. Porém, nos casos de alguns crimes considerados sérios, como sedição ou conspiração contra direitos, o prazo pode se estender para até dez anos.

O prazo de cinco anos também pode ser estendido se houver algum fator que interrompa a contagem. Alguns juristas opinam que o período de quatro anos que Trump passará na Casa Branca é um dos casos que pausam a contagem desse prazo.

O outro processo, que corre em um tribunal federal na Flórida, refere-se aos documentos sigilosos (entre eles documentos secretos e supersecretos) que Trump subtraiu da Casa Branca quando deixou o governo.

Essa ação já foi trancada pela juíza Aileen Cannon, que foi nomeada por Trump, em julho. Ela justificou a medida com o argumento de que a nomeação de Jack Smith como procurador especial foi incorreta porque o DOJ não obteve aprovação do Senado para fazê-la.

O DOJ recorreu ao Tribunal Federal de Recursos da 11ª Região argumentando que precedentes da Suprema Corte e fatos históricos dão ao procurador-geral autoridade para nomear procuradores especiais sem autorização do Senado.

Agora, diante das circunstâncias, o DOJ pediu ao tribunal de recursos para suspender o julgamento do caso. Assim, o processo referente ao desvio de documentos sigilosos, que inclui acusações de violação da Lei da Espionagem e obstrução da Justiça (por Trump tentar impedir a recuperação dos documentos pelo FBI), continua em uma espécie de limbo.

Para essa estratégia dar uma sobrevida a esses dois processos criminais contra Trump, o DOJ terá de contar com um fator imprevisível: um candidato democrata terá de ganhar as eleições presidenciais de 2028. E o então presidente eleito terá de nomear um procurador-geral com ganas de obter a condenação de Trump.

Trump perdoa Trump

E há mais um possível empecilho a considerar: Trump pode cumprir a promessa de se autoconceder perdão presidencial. Ele declarou que tem “o direito absoluto” de se perdoar, mas isso está sujeito a debate.

Não há precedente jurídico ou histórico para essa situação — a de um presidente perdoar a si mesmo. Tecnicamente, um presidente só tem poder executivo para perdoar pessoas que foram condenadas pelo cometimento de um ou mais crimes, exceto em caso de impeachment.

Mas há um precedente histórico de um presidente conceder “perdão preventivo” a um ex-presidente. Esse foi o caso do perdão que Gerald Ford concedeu a Richard Nixon “por qualquer crime que ele possa ter cometido durante o escândalo de Watergate”. Com informações adicionais de CNN, The Hill, ABC News, National Constitution Center e Illinois Legal Aid Online.

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