Filiação socioafetiva entre avós e netos maiores de idade pode ser reconhecida
21 de novembro de 2024, 18h55
É juridicamente possível o pedido de reconhecimento de filiação socioafetiva entre avós e netos maiores de idade nos casos em que a relação entre eles supera a mera afetividade. Nessas hipóteses, a declaração de filiação — com efeitos diretos no registro civil do filho socioafetivo — não encontra qualquer impedimento legal.
Esse entendimento foi estabelecido pela 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça no âmbito de uma ação ajuizada por neto para ser reconhecido como filho socioafetivo de seus avós maternos, mantendo-se em seu registro civil, contudo, o nome da mãe biológica, com quem ele também convivia.
Em primeiro grau, o processo foi extinto sem resolução do mérito, sentença mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. Para a corte paulista, é aplicável ao caso a previsão do artigo 42, parágrafo 1º, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que proíbe a adoção de netos pelos avós.
Institutos diferentes
Porém, a ministra Nancy Andrighi, relatora no STJ, apontou que o artigo 42, inciso 1º, do ECA se aplica ao instituto da adoção, não ao da filiação socioafetiva, especialmente no caso de reconhecimento de filiação de maior de 18 anos.
Segundo a ministra, a socioafetividade não pode ser confundida com a adoção, tendo em vista que, na relação socioafetiva, não há destituição do poder familiar de vínculo biológico anterior, como ocorre na adoção de menor de idade.
“Trata-se, em verdade, do reconhecimento de uma situação fática já vivenciada, que demanda o pronunciamento do Poder Judiciário acerca da existência de um vínculo já consolidado”, explicou a ministra.
Reconhecimento admitido
Nancy enfatizou que o reconhecimento da filiação socioafetiva é admitido mesmo que o filho tenha a paternidade ou a maternidade regularmente registrada no assento de nascimento, tendo em vista a possibilidade da multiparentalidade, conforme estabelecido pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 622 da repercussão geral.
A relatora também apontou que o artigo 505, parágrafo 3º, do Provimento 149/2023 do Conselho Nacional de Justiça tem aplicação nas hipóteses de reconhecimento voluntário de filiação socioafetiva perante os oficiais de registro civil de pessoas naturais.
Sobre o interesse processual do pedido de reconhecimento de filiação socioafetiva, a ministra apontou que ele deve ser verificado segundo a teoria da asserção, ou seja, a partir das afirmações do autor na petição inicial. Assim, basta que o pedido apresente informações suficientes sobre a possível existência de laços de socioafetividade entre as pessoas cujo vínculo parental se busca reconhecer para autorizar o regular processamento da ação.
“A filiação socioafetiva, que encontra alicerce no artigo 227, parágrafo 6º, da Constituição Federal, envolve não apenas a adoção, mas também parentescos de outra origem, conforme introduzido pelo artigo 1.593 do Código Civil de 2002, além daqueles decorrentes da consanguinidade oriunda da ordem natural, de modo a contemplar a socioafetividade surgida como elemento de ordem cultural.”
Com o provimento do recurso especial, a ministra determinou o retorno do processo à origem para que ele tramite regularmente, a fim de que seja retomada a necessária instrução probatória, com a citação da mãe biológica e a produção de provas sobre a relação de socioafetividade por todos os litigantes. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.
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