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Ao insistir na falácia da equivalência patrimonial, o Brasil descumpre tratados contra a dupla tributação

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20 de novembro de 2024, 8h00

“Quem torto nasce nunca se endireita” (dito popular)

Em tempos de presidência do G20, buscando maior protagonismo internacional, o Brasil, candidato a membro da OCDE, ainda que tardiamente, tomou providências concretas para adequar sua legislação de preços de transferência aos padrões internacionais e submeteu ao Congresso medida provisória para criação da tributação mínima do Pilar 2.

No entanto, quando se fala em modificar a legislação de tributação de lucros de controladas no exterior, inaugurada com o artigo 25 da Lei 9.249/95, e atualmente regulada pelo artigo 76 e ss. da Lei n.º 12.973/2014, o Poder Executivo federal queda-se inerte, faz ouvidos moucos, e insiste na falácia da equivalência patrimonial, descumprindo compromissos solenes firmados com seus parceiros internacionais.

Com efeito, em sua cruzada arrecadatória, apoiada em ilegalidades e argumentos falaciosos, como o de ser o resultado de equivalência patrimonial o objeto da tributação previsto pelo artigo 74 da MP 2.158-35/01, o Executivo federal vem sistemática e acintosamente descumprindo tratados celebrados com estados soberanos que, de boa-fé, acreditaram no compromisso assumido pelo Brasil de não tributar os lucros de empresas situadas naqueles estados.

O exame da polêmica e conturbada evolução legislativa da matéria desnudará o engenhoso plano de reconfiguração, por atos administrativos desprovidos de qualquer base legal, do objeto da tributação inicialmente previsto na Lei 9.249/95, inalterado pelo artigo 74 da MP 2.158-35/01, de lucros de controlada e coligadas no exterior para o resultado positivo de equivalência patrimonial.

Como se verá, o resultado positivo de equivalência patrimonial só veio a ser adotado pelo legislador como base de cálculo do IRPJ e da CSLL quase 20 anos depois, quando editada a Lei 12.973/2014, e, como também se verá, sua adoção em nada altera a manifesta incompatibilidade da chamada tributação em bases universais brasileira (TBU) — uma exacerbada e indiscriminada tributação extraterritorial — com o artigo 7º dos tratados contra a dupla tributação celebrados pelo Brasil.

Lucros apurados como objeto da tributação do art. 25 da Lei 9.249/95

O artigo 25, §§ 2º e 3º da Lei 9.249/95 veio estabelecer que os lucros auferidos por controladas e coligadas no exterior, de pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil, serão computados na determinação do lucro real mediante a adição ao respectivo lucro líquido, na proporção da participação da pessoa jurídica no capital da controlada ou coligada.

Já o §6º do mesmo artigo é expresso em ressalvar que “os resultados da avaliação do investimento no exterior, pelo método da equivalência patrimonial, continuarão a ter o tratamento previsto na legislação vigente, (…)”, qual seja, “a contrapartida do ajuste do investimento no exterior, avaliado pelo método da equivalência patrimonial, não será computada na determinação do lucro real”. (artigo 11 da IN 38/96).

Assim, o lucro de 100 unidades de valor, auferido por uma empresa estrangeira, domiciliada, por exemplo, na Argentina, controlada por uma empresa brasileira que detivesse 60% do seu capital, seria automaticamente adicionado ao lucro real da controladora em 60 unidades de valor, convertidos para reais brasileiros pela taxa de câmbio para venda do dia da apuração no balanço estrangeiro (§ 4º).

Por sua vez, o resultado de equivalência patrimonial, correspondente ao reflexo do aumento ou diminuição de valor do patrimônio da controladora brasileira, decorrente da imposição legal de avaliação dos investimentos em controladas e coligada pelo MEP (artigo 248 da Lei das S/A), é composto não apenas pela conta de lucros (ou prejuízos) da investida, mas também pelo capital e reservas, ajustes de avaliação, variação cambial e lucros acumulados.

Esse resultado positivo — derivado, repita-se, de um método de avaliação de investimentos – jamais foi objeto de tributação pelo IRPJ e pela CSLL, sendo expressamente assegurada sua neutralidade fiscal pelo direito positivo (artigo 23, I do DL 1.598/77 e artigo 2º, § 1º, “a” da Lei 7.689/89), eis que, por óbvio, não se pode tributar pelo imposto de renda oscilações de valor de origens e naturezas diversas, refletidas no “espelho” em que o MEP se traduz.

A tributação automática de renda indisponível, correspondente ao lucro das investidas antes da deliberação de sua destinação por seus órgãos sociais (p. ex. distribuição, reinvestimento, capitalização, formação de reservas), encontrou, como é notório, uma barreira intransponível no art. 43 do CTN, lei complementar definidora do fato gerador do imposto de renda, que apenas permite à lei ordinária tributar acréscimos patrimoniais realizados e disponíveis.

Acresce que o regime do artigo 25 da Lei 9.249/95 é incompatível com o artigo 7º dos tratados contra a dupla tributação, que prescreve que “os lucros de uma empresa de um Estado Contratante só podem ser tributados nesse Estado, a não ser que a empresa exerça sua atividade no outro Estado Contratante por meio de um estabelecimento permanente”.

Assim, o Brasil não pode tributar os lucros de uma empresa argentina, ainda que controlada por uma empresa brasileira, salvo, na medida e na proporção em que esse lucro tenha sido obtido no Brasil, por meio de um estabelecimento permanente (uma filial, sem personalidade jurídica própria) da empresa argentina situado no Brasil.

O artigo 7º veicula uma norma de competência exclusiva, que comporta apenas uma exceção – a do estabelecimento permanente – para autorizar o exercício de competência cumulativa, como ensina o percuciente voto-vista do Ministro Ari Pargendler no Resp. n.º 1.325.709-RJ:

“Esmiuçando a norma, tem-se:
– a regra geral, que proíbe a tributação em mais de um Estado Contratante, com os seguintes elementos:
(i) os lucros de uma empresa; (ii) o respectivo domicílio em um dos Estados Contratantes; e (iii) a competência tributária exclusiva do Estado Contratante em que a empresa tem domicílio.
– a regra de exceção, que admite a tributação em mais de um Estado Contratante, com estes componentes:
(i) os lucros de uma empresa; (ii) o respectivo domicílio em um dos Estados Contratantes; e (iii) a existência de um estabelecimento permanente no outro Estado Contratante.
A regra geral supõe duas sociedades com personalidades jurídicas próprias, embora uma tenha o poder de controle sobre a outra.
A regra de exceção tem como alicerce uma única sociedade com um ou mais estabelecimentos permanentes no outro Estado Contratante”

Lucros disponibilizados como objeto da tributação do art. 1º da Lei n.º 9.532/97

O Fisco, visando compatibilizar o regime da Lei 9.249/95 com o artigo 43 do CTN, introduziu por ato administrativo — a IN 38/96 — o inovador conceito de “disponibilização” para passar a tributar, não mais o lucro apurado pela controlada ou coligada no exterior, mas sim “lucros pagos ou creditados”, ou seja, os dividendos efetivamente objeto de distribuição.

Spacca

A solução engendrada carecia, porém, de base legal e a sua “legalização” veio ocorrer com o artigo 1º da Lei 9.532/97 que reproduziu a sistemática da IN 38/96, passando a determinar que a adição do lucro das controladas e coligadas no exterior se desse no dia 31 de dezembro do ano-calendário em que tiverem sido disponibilizados para o sócio mediante pagamento ou crédito.

A tributação do lucro quando pago ou creditado, além de ser compatível com o artigo 43 do CTN, não colide com o artigo 7º dos tratados. É que, na verdade, um lucro que pode ser tornado disponível para o sócio nada mais é que o lucro distribuído como dividendo e, como é notório, os tratados (artigo 10) não impedem a tributação dos dividendos pelo Estado de residência do sócio.

Na verdade, os tratados asseguram competência cumulativa (i) para o Estado da fonte, que pode cobrar imposto de renda sobre os dividendos distribuídos, fixando-se apenas um “teto” máximo para tal retenção, e (ii) para o Estado de residência, que poderá submeter a imposto tal rendimento e deverá eliminar a dupla tributação creditando o imposto de renda retido (método do crédito) ou isentando de tributação o dividendos (método da isenção), podendo, em certos casos, considerá-los para fins de aplicação das alíquotas progressivas (isenção com progressividade).

Ilegal tributação da equivalência patrimonial por ato administrativo (IN 213/02)

Mas o Fisco seguia incansável no seu afã de tributar lucros indisponíveis de empresas situadas no exterior e, assim o fez, com uma engenhosa — na aparência — solução jurídica.

Em primeiro lugar tratou de adequar aos seus propósitos o texto do CTN, introduzindo um novo parágrafo ao artigo 43, nos termos do qual “na hipótese de receita ou rendimentos oriundos do exterior a lei estabelecerá as condições e o momento em que se dará a sua disponibilidade, para fins de incidência do imposto referido neste artigo”.

Ato contínuo, editou a MP 2.158-35/02, que previu em seu artigo 74 que “para fins de determinação da base de cálculo do imposto de renda e da CSLL, nos termos do artigo 25 da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, e do artigo 21 desta Medida Provisória, os lucros auferidos por controladas no exterior serão considerados disponibilizados para a controladora ou coligada no Brasil na data do balanço no qual tiverem sido apurados, na forma do regulamento”.

Com tal disposição passou-se, por ficção legal, a considerar disponíveis e, por conseguinte, tributáveis, os lucros de pessoas jurídicas controladas e coligadas no exterior na data de sua apuração.

Evidentemente, tal ficção equiparadora desbordava os limites fixados pelo novo parágrafo acrescido ao artigo 43 do CTN, que apenas permite ao legislador ordinário fixar e as condições e o momento da disponibilidade do lucro das empresas investidas estrangeiras, mas jamais a, por ficção legal, considerar disponível para o sócio algo que disponível não é.

Nesse momento inicia-se a falácia da equivalência patrimonial, inovadoramente arvorada como base de cálculo do IRPL e da CSLL pela IN 213/02, ato administrativo desprovido de qualquer respaldo legal:

Art. 7º A contrapartida do ajuste do valor do investimento no exterior em filial, sucursal, controlada ou coligada, avaliado pelo método da equivalência patrimonial, conforme estabelece a legislação comercial e fiscal brasileira, deverá ser registrada para apuração do lucro contábil da pessoa jurídica no Brasil.
1º Os valores relativos ao resultado positivo da equivalência patrimonial, não tributados no transcorrer do ano-calendário, deverão ser considerados no balanço levantado em 31 de dezembro do ano-calendário para fins de determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL. (…)”

A total e absoluta impertinência dessa regra foi, assim, magistralmente descrita por Alberto Xavier:

“A tese segundo a qual a equivalência patrimonial constitui o verdadeiro objeto da tributação pelo art. 74, enquanto renda própria disponível da controladora brasileira, constituindo um imposto sobre a produção do lucro e não sobre a sua distribuição, enfrenta desde logo o obstáculo do próprio teor literal do art. 25 da Lei 9.249/95 (para o qual o art. 74 remente expressamente como fonte reguladora da base de cálculo do imposto de renda e da CSLL) ser categórico ao esclarecer no seu §6º que “os resultados da avaliação dos investimentos no exterior, pelo método da equivalência patrimonial, continuarão a ter o tratamento previsto na legislação vigente, sem prejuízo do disposto nos §§ 1º, 2º e 3º”, disposição esta corretamente interpretada pelo art. 11 da Instrução Normativa n.º 38/96 no sentido de que “a contrapartida do ajuste de investimento no exterior, avaliado pelo método da equivalência patrimonial, não será computado na determinação do lucro real.
O objeto da tributação, segundo a Lei n.º 9.249/95, era o próprio lucro das controladas e coligadas no exterior, que para o efeito deveriam ser adicionados à base de cálculo do imposto incidente sobra a controladora brasileira, na proporção de sua participação.
Arvorar, pois, como objeto da tributação uma realidade que a própria lei determinou não fosse nela considerado, como a equivalência patrimonial, representa forçar a realidade normativa para lhe imprimir um significado e alcance que não tem. Tal assimilação jamais foi feita pela lei, representando inovação de mero ato administrativo a Instrução Normativa 213 (…)”. [1]

A questão da carência de autorização legal para tributação do MEP não passou despercebida pelo voto do ministro Ari Pargendler no REsp. nº 1.325.709-RJ:

“Assim integrados o núcleo e as disposições complementares da norma do art. 74 da Medida Provisória n.º 2.158-25, de 2001, fica claro que ela em nada alterou o regime fiscal vigorante desde o art. 23 do Decreto-lei n.º 1.598, de 1977.
Qual regime? O de que o método da equivalência patrimonial é neutro do ponto de vista fiscal, porque seu resultado positivo não é tributado.
Tudo a se resumir na conclusão de que o art. 7º, caput, e §1º da Instrução Normativa 213, de 2002, da Secretaria da Receita Federal (…), pretendendo regulamentar o art. 74 da Medida Provisória n.º 2.158-35, de 2001, dele extrapolou: (…)”.

O voto do ministro Arnaldo Esteves Lima, de forma inapelável, seguiu idêntico entendimento:

“Com efeito, o art. 74 da MP 2.158-35/01, a nosso ver, com as devidas vênias, não revogou o disposto no Decreto-Lei 1.598/77 e na Lei 7.689/88, de modo a autorizar a tributação pelo MEP na hipótese. A Medida Provisória sequer faz referência ao referido MEP. Tão somente considera que a data do balanço da controlada ou coligada será o momento em que se verificará a ocorrência do fato gerador (disponibilização do lucro) do IRPJ e da CSLL, devidos pela empresa controladora ou coligada no Brasil.
A meu juízo, não há conflito entre a Medida Provisória 2.158-35/01, o Decreto-lei 1.598/77 e a Lei 7.689/88 porque tratam de assuntos distintos. A Medida Provisória, sobre a tributação de lucros de coligadas e controladas no exterior. O Decreto-lei e a Lei sobre a vedação de tributar com base na utilização do MEP.
Em consequência, é ilegal o art. 7º, § 1º, da IN 213/02, porquanto amplia, sem amparo legal, a base de cálculo do IRPJ e da CSLL, ao prever a tributação sobre o resultado positivo da equivalência patrimonial, conforme vem decidindo a Segunda Turma.”

Evidenciada a inexistência de disposição legal permissiva de tributação de resultado de equivalência patrimonial, demonstrado que a lei ordinária tributa lucros de empresas estrangeiras e, abstraindo-se da discussão da constitucionalidade da tributação imediata, por ficção, de renda indisponível, é indiscutível que postos em contado lei interna (artigo 25 da Lei 9.249/95) e tratados (art. 7º), há uma inexorável incompatibilidade, devendo prevalecer, por força do artigo 98 do CTN, as disposições convencionais que limitam a competência tributária brasileira e impedem, por derrogação, a aplicação a lei interna.

Resultado positivo de equivalência patrimonial como base de cálculo do art. 77 da Lei n.º 12.973/2014

Após 20 anos de discussão e na sequência do julgamento pelo STF da ADI 2.588, em 10 de abril de 2013, o Executivo, finalmente repaginou a tributação automática dos lucros de controladas no exterior (abandonado as coligadas). Mas a disposição (artigo 77), matreiramente elegeu como base de cálculo do IRPJ e da CSLL “a parcela do ajuste do valor do investimento em controlada, direta ou indireta, domiciliada no exterior equivalente aos lucros por ela auferidos antes do imposto de renda, excetuando a variação cambial (…)”.

Passou a lei a prever a tributação da parte do reflexo no patrimônio da controladora da avaliação patrimonial da controlada correspondente aos seus lucros. Ou seja, com um engenhoso jogo de palavras, segue-se tributando no Brasil lucros de empresas estrangeiras.

A questão é que a proteção dos tratados segue sendo recusada, ao solerte argumento que esse lucro não pertence à empresa no exterior, mas sim faz parte do patrimônio da sócia brasileira, enquanto parte do resultado positivo do MEP (excluída a variação cambial), ainda que seu valor seja exatamente o valor do lucro antes de imposto da sociedade estrangeira, refletido no Brasil por força de um método contábil de avaliação de investimentos.

Ora, um jogo de palavras não pode prevalecer para driblar regra imperativa de um tratado internacional (artigo 7º), pois há comandos intransponíveis de lei complementar — artigo 98 do CTN — da Constituição — artigo 5º, § 2º — do Tratado sobre tratados internacionais — o artigo 27 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, promulgada no Brasil pelo Decreto 7.030/2009, que é categórico em estabelecer que “uma parte não pode invocar as disposições de seu direito interno para justificar o inadimplemento de um tratado”.

Art. 25 da Lei 9.249/95 e o art. 74 da MP 2.158-35/01 não são típicas normas CFC suscetíveis de afastar a aplicação do art. 7º dos tratados

Escapa aos limites desse artigo uma digressão detalhada sobre a natureza e alcance das normas tipo CFC, acrônimo da expressão inglesa Controlled Foreign Corporations amplamente estudadas e debatida na doutrina, especialmente para determinar em que hipóteses podem ser compatibilizadas com os limites impostos pelo artigo 7º dos tratados contra a dupla tributação.

Com efeito, se se admitir, como pensam alguns, que a norma brasileira do art. 25 da Lei 9.249/95 c/c o artigo 74 da MP 2.158-35/01 é do tipo CFC e, como tal, pode ser aplicada em detrimento da proteção do tratado, melhor é se rasgarem todos os tratados e encerrar a participação do Brasil na OCDE ou em qualquer outro organismo internacional.

Uma norma excepcional, que permite a tributação extraterritorial de lucros não distribuídos, provenientes indiscriminadamente de quaisquer atividades econômicas, significa a desconsideração total e absoluta da existência da personalidade jurídica autônoma das controladas, das finalidades estritamente antielisivas das normas CFC e a concessão de autorização para o exercício de poderes tributários pelo Brasil em terceiros estados.

As normas típicas CFC têm contornos idênticos àqueles recentemente adotados pela Lei nº 14.754, de 2023, cujo artigo 5º que veio prever a tributação automática de lucros de empresas controladas por pessoas físicas residentes no Brasil quando as investidas:

“I – estejam localizadas em país ou em dependência com tributação favorecida ou sejam beneficiárias de regime fiscal privilegiado de que tratam os arts. 24 e 24-A da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996; ou
II – apurem renda ativa própria inferior a 60% (sessenta por cento) da renda total.
6º Para fins do disposto neste artigo, considera-se:
I – renda ativa própria: as receitas obtidas diretamente pela entidade controlada mediante a exploração de atividade econômica própria, excluídas as receitas decorrentes exclusivamente de:
a) royalties;
b) juros;
c) dividendos;
d) participações societárias;
e) aluguéis;
f) ganhos de capital, exceto na alienação de participações societárias ou ativos de caráter permanente adquiridos há mais de 2 (dois) anos;
g) aplicações financeiras;
h) intermediação financeira;”

Trata-se, com efeito, de normas que se aplicam ou a jurisdições de baixa ou nula tributação — fenômeno que não ocorre em relação aos países que temos tratados celebrados — ou em relação a certos rendimentos de caráter passivo, cuja deslocalização e diferimento, por atos e negócios jurídicos, poderiam permitir uma fuga da tributação nacional.

Afora esses motivos, não há qualquer sentido econômico razoável para dar ao Brasil o direito de tributar um lucro que, eventualmente pode estar isento ou ter se sujeitado a um imposto menor que os 34% combinados de IRPJ e CSLL, apenas para possibilitar cumprir metas arrecadatórias. Metas essas que lamentavam não se escondem mais nos processos que, citam números da Receita, como argumento ad terrorem, alertando que o contencioso sobre lucros de controladas no exterior é da ordem de R$ 142,5 bilhões, levando em consideração os anos de 2017 a 2021, e de R$ 28,5 bilhões anuais futuros.

Votar de olho nos números, sem pensar nas graves consequências do desrespeito de compromissos internacionais, ignorar a ausência de base legal da falácia da equivalência patrimonial, afirmando sofisticamente ser a tributação permitida pelos tratados por se tratar de uma dupla tributação econômica e não jurídica, ainda que sua materialidade nada mais seja do que o lucro da empresa estrangeira refletido por força de um método de avaliação, causa desassossego para os contribuintes, afasta os interesses empresarias e expulsa investidores do país.

O STJ havia firmado precedente irrespondível quanto à incompatibilidade da legislação de TBU anterior à Lei 12.973/2014 com o artigo 7º dos tratados contra a dupla tributação, cabendo-lhe, nos termos literais do artigo 105, III, “a” julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, (…), quando a decisão recorrida contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência.

Ora, a solução da questão da incompatibilidade do artigo 25 da Lei 9.249/95, do artigo 74 da MP 2.158-35/01, já examinada pelo STJ, além da incompatibilidade do art. 77 da Lei 12.973/2014, ainda por analisar, com o artigo 7º dos tratados contra a dupla tributação não pode ser usurpada pelo STF, como aliás inúmeras vezes já foi reconhecido pela Corte (RE 460.320/PR, ARE 1.191.424-Agr-SP, AI 740.321-SP. AI 785-255-SP e ARE 955.262-RJ).

A comunidade internacional e os contribuintes brasileiros esperam que, com coerência, garantindo estabilidade e segurança jurídica, o STF não permita o descumprimento dos compromissos internacionais pelo Brasil e o poder executivo reconheça seus erros e proponha o debate parlamentar para a criação de uma verdadeira norma CFC, deixando de insistir na falácia da equivalência patrimonial como argumento para driblar a competência exclusiva do estado de residência assegurada pelo artigo 7º dos tratados.

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[1] Direito Tributário Internacional do Brasil, 7ª ed., 2010, p. 406

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