Impenhorabilidade da quantia depositada em caderneta de poupança
19 de novembro de 2024, 16h13
A impenhorabilidade da quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 salários mínimos, prevista no artigo 833, inciso X, do Código de Processo Civil de 2015 [1], tem gerado debates no meio jurídico. A questão central é determinar se essa impenhorabilidade é matéria de ordem pública, podendo ser conhecida, de ofício, pelo juiz, ou se depende de arguição pelo executado, sob pena de preclusão.
O artigo 833 do Código de Processo Civil de 2015 elenca os bens considerados impenhoráveis, ou seja, aqueles que não podem ser constritos para satisfazer o crédito do exequente. O inciso X especifica que é impenhorável a quantia depositada em caderneta de poupança até o limite de 40 salários mínimos.
A discussão sobre a natureza jurídica dessa impenhorabilidade é fundamental. Se considerada matéria de ordem pública, o juiz poderia conhecê-la, de ofício, independentemente da manifestação do executado. Por outro lado, se for um direito disponível, caberia ao executado alegá-la no momento oportuno sob pena de preclusão.
O Código de Processo Civil de 2015 trouxe mudanças em relação ao Estatuto Processual Civil de 1973 [2]. Uma das alterações foi a supressão do termo “absolutamente” no caput do artigo 833, que antes declarava os bens “absolutamente impenhoráveis” no caput do artigo 649.
A retirada do termo “absolutamente” indica uma alteração na compreensão da impenhorabilidade. Essa mudança demonstra que a impenhorabilidade passou a ser relativa e disponível, e não mais uma vedação absoluta que poderia ser conhecida, de ofício, pelo juiz.
Direito ao executado
Com a nova redação, a impenhorabilidade prevista no artigo 833, inciso X, do Código de Processo Civil de 2015 é entendida como um direito atribuído ao executado, que pode optar por exercê-lo ou não. Dessa forma, o executado tem a faculdade de alegar a impenhorabilidade para proteger os seus bens, até o limite estipulado.
Em virtude de ser um direito disponível, cabe ao executado alegar a impenhorabilidade. Se o executado não o fizer no momento adequado, perde a oportunidade de invocar essa proteção, ocorrendo a preclusão.
O executado deve alegar a impenhorabilidade no primeiro momento em que lhe couber falar nos autos, seja na impugnação ao cumprimento de sentença, nos embargos à execução ou no incidente de desbloqueio de valores. A falta de manifestação tempestiva resulta na impossibilidade de discutir, posteriormente, a questão.
O artigo 854 do Código de Processo Civil de 2015 disciplina o procedimento de penhora de dinheiro em depósito ou aplicação financeira. Após o bloqueio de valores, o executado é intimado e tem o prazo de cinco dias para comprovar a impenhorabilidade ou excesso na constrição. Se não o fizer, a indisponibilidade se converte em penhora.
O Código de Processo Civil de 2015 não autoriza o juiz a conhecer, de ofício, a impenhorabilidade prevista no artigo 833, inciso X. Diferentemente do cancelamento da indisponibilidade excessiva, previsto no § 1º do artigo 854, não há previsão para o magistrado agir, sem provocação, neste caso específico.
Executado deve manifestar interesse
No Agravo em Recurso Especial nº 2.220.880/RS [3], julgado em 26 de fevereiro de 2024, o Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que a impenhorabilidade da quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 salários mínimos, não é matéria de ordem pública e não pode ser conhecida, de ofício, pelo juiz.
O Superior Tribunal de Justiça observou que a impenhorabilidade é um direito posto à disposição do executado, que deve manifestar interesse na sua aplicação. Ao não alegar a impenhorabilidade no momento oportuno, o executado renuncia, tacitamente, a essa proteção, cujo juiz não pode suprir essa omissão.
A decisão do Superior Tribunal de Justiça estabelece um importante precedente, orientando os juízes a não conhecerem, de ofício, a impenhorabilidade prevista no artigo 833, inciso X, do Código de Processo Civil de 2015, reforçando a necessidade de atuação ativa do executado na defesa dos seus direitos.
Esse entendimento busca equilibrar os interesses do exequente, que almeja a satisfação do seu crédito, e os direitos do executado, que possui garantias legais, mas deve exercê-las de forma adequada no processo.
Com efeito, o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça reflete os princípios do contraditório e da ampla defesa, que exigem a participação efetiva das partes no processo. Também está em conformidade com o princípio da segurança jurídica, evitando decisões surpresas ou não fundamentadas nas alegações das partes.
Atuação do juiz
O juiz, conforme estabelecido pelo STJ, deve atuar de forma imparcial, respeitando a iniciativa das partes. Não lhe cabe suprir a falta de manifestação do executado quanto à impenhorabilidade, sob pena de violar o princípio da demanda e a natureza disponível do direito em questão.
Essa orientação reforça a segurança jurídica, pois as partes podem prever os desdobramentos processuais com base nas suas ações ou omissões. O exequente não será surpreendido por decisões que obstaculizem a execução, sem que o executado tenha se manifestado.
Para o executado, a decisão implica na necessidade de estar atento aos prazos e oportunidades processuais. Deve agir prontamente para alegar a impenhorabilidade, sob o risco de perder essa proteção legal e ter os seus bens penhorados.
Nessa ordem de ideias, para o exequente, a decisão traz maior previsibilidade na execução. Ele pode prosseguir com os atos executivos, sabendo que a impenhorabilidade não será um obstáculo inesperado, a menos que seja alegada, oportunamente, pelo executado.
Assim sendo, conforme decidido pelo STJ, no julgamento do Agravo em Recurso Especial nº 2.220.880/RS, a impenhorabilidade da quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 salários mínimos, prevista no artigo 833, inciso X, do Código de Processo Civil, não é matéria de ordem pública e não pode ser conhecida, de ofício, pelo juiz. Deve ser arguida pelo executado no momento oportuno, sob pena de preclusão.
[1] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm
[2] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5869.htm
[3] https://processo.stj.jus.br/processo/julgamento/eletronico/documento/mediado/?documento_tipo=5&documento_sequencial=230901130®istro_numero=202203102560&peticao_numero=202200995947&publicacao_data=20240229&formato=PDF
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