Opinião

Carta de Carlos Kauffmann (Chapa 18) aos eleitores da OAB-SP

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19 de novembro de 2024, 7h03

Ainda adolescente, vivendo na cidade onde nasci, Mogi das Cruzes (SP), era muito claro para mim que o respeito, a segurança e o acolhimento de que minha família gozava na sociedade local eram fruto essencialmente da atividade profissional do meu pai, um advogado que sempre militou na área trabalhista. Por tanto acreditar na advocacia como meio digno de vida e instrumento de transformação social, meu pai resolveu ensiná-la na universidade e engajar-se na direção da subseção da cidade. Esse ambiente moldou a minha personalidade e determinou meu futuro.

carlos kauffmann

Confiando nos passos do meu pai, resolvi segui-los. Primeiro, busquei uma sólida capacitação jurídica, que me foi propiciada, na sua base, pelos cursos de graduação e pós-graduação da PUC-SP. Passei, então, a militar na advocacia criminal em São Paulo, o que venho fazendo há 32 anos, e a compartilhar minha perspectiva como advogado com meus alunos na Faculdade de Direito da PUC-SP, onde ministro a disciplina de direito processual penal há 29 anos.

Logo no início da minha carreira, já tinha como certo que os bons frutos colhidos por um profissional não dependem apenas das suas qualidades e empenho individual. A profissão, em si, precisa ser um terreno fértil para produzi-los. Tratei de contribuir para o cultivo desse solo por meio da OAB-SP, onde fui membro da Comissão de Prerrogativas, membro do Conselho de Prerrogativas, três vezes conselheiro seccional e presidente do Tribunal de Ética.

Vivo intensamente a advocacia e, diria, em tempo integral, considerando ser minha esposa, advogada, e meus dois filhos estarem cursando a faculdade de direito.

Mas chego aos 54 anos com uma insatisfação profunda e incômodo permanente ao constatar que, a despeito da dedicação de muitos competentes e dignos colegas, a advocacia, terreno no qual um dia germinou e fez prosperar a vida do meu pai e a minha, hoje é um vasto e árido sertão. Meus olhos não conseguem se fechar a essa triste realidade!

Quem conhece nosso país sabe que há “Brasis” dentro do Brasil. E quem vive a advocacia, sabe que nela há várias “advocacias”. Vou me referir aqui à grande maioria dos 390.456 advogados do estado de São Paulo, em que:

(1) aproximadamente 60% são “jovens advogados”, assim entendidos os inscritos na OAB há menos de cinco anos, e que não conseguem engajamento num exigente e competitivo mercado de trabalho;
(2) quase 52% são advogadas, e que concorrem em condições desiguais com os advogados, por conta de ambientes de trabalho preconceituosos e até misóginos;
(3) cerca de 40% têm sua subsistência atrelada aos pífios honorários vindos da prestação de assistência judiciária aos economicamente hipossuficientes, e que, por isso, são obrigados a ter uma fonte de renda secundária;
(4) muitos não dispõem de infraestrutura ou conhecimento sobre informática, em tempos em quase todos os atos da advocacia são digitais etc.

Esse cenário tem uma dimensão aproximada. Sequer temos informações confiáveis para retratar a exata realidade da grande advocacia. Por quê? Porque ela não é ouvida. Ela não é vista. Ela está esquecida…

Minhas preocupações com a advocacia não são circunstanciais, voltadas apenas a solucionar os problemas contemporâneos. As dificuldades são crônicas e se agravarão no futuro próximo. Basta olhar o aumento dos números e dos acontecimentos dos últimos anos: represamento do número de reprovados no Exame de Ordem, revelando a deficiência técnica na formação dos participantes; expansão da advocacia predatória, fruto da fiscalização ineficiente da profissão; perda do valor real dos honorários decorrentes da assistência judiciária, obrigando o(a) advogado(a) a buscar rendimentos alternativos; submissão aos abusos de autoridade dos órgãos judiciais, pela omissão da entidade que deveria representar e defender nossa classe; advogadas e advogados sem colocação no mercado de trabalho e os que são alijados desse ambiente por falta de infraestrutura mínima para exercício da advocacia. Ainda que essa seja apenas uma amostragem, ela é capaz de prenunciar o crepúsculo da profissão.

Organizar os interesses dos advogados

À medida em que fui me inteirando sobre a diversidade e complexidade dos problemas da advocacia, fui me convencendo de que a principal origem ou agravamento deles está na má gestão e omissão do órgão responsável direto em organizar, fiscalizar e tutelar os interesses dos advogados no âmbito do nosso estado: o Conselho Seccional da OAB.

Ao mesmo tempo, a minha natureza otimista e proativa me convenceu de que a superação dessas dificuldades é possível, se feita por um grupo talentoso, resiliente e compromissado a mudar e com uma ferramenta adequada. O amadurecimento dessa ideia foi longo e, só agora, começou a ganhar corpo.

O grupo foi formado. Conseguimos arregimentar advogadas e advogados com os atributos que reputamos necessários. São profissionais com vivências, áreas de atuação, origens e expertises diferentes. Alguns são líderes de setores organizados da advocacia, como os negros, as mulheres, os advogados públicos, os advogados empregados, as sociedades de advogados. Tenho muito orgulho dessa composição de vários diferentes que se uniram e dialogam pelo interesse comum de restaurar a solidez da nossa profissão e que, importante que se diga, é apartidário. Hoje, esse grupo leva o nome de Chapa 18 — Kauffmann e Lucineia — OAB Unida. Para saber mais sobre os integrantes, convido-o(a) a acessar o site.

Os colegas do grupo, sem exceção, são observadores atentos da advocacia. Muitos deles, como eu, apuraram sua visão crítica a partir das experiências que colheram em posições de gestão no Conselho Seccional, em subseções e em instituições que representam os interesses da nossa classe. De uma maneira ou de outra, são conhecedores das fragilidades da profissão e por isso souberam apontar ações que as mitigarão ou as eliminarão.

Propostas de gestão

Visando, de imediato, a tirar a advocacia da rota de colisão em que está, idealizamos 37 medidas. Elas estão descritas no site que mencionei logo acima. Convido-o(a) novamente a acessá-lo. Conhecendo nossas propostas iniciais de gestão, você dimensionará melhor as dificuldades e perceberá que nosso grupo está preparado para assumir a difícil missão de resgatar nossa profissão.

De qualquer forma, gostaria de lhe apresentar nossas sete principais frentes de atuação:

1. Ouvindo e acompanhando a advocacia: a OAB-SP está territorialmente organizada em Subseções, que estão distribuídas em 21 regiões administrativas. Pretendemos criar uma Coordenadoria em cada Região, que trabalhará em conjunto com as respectivas Subseções, sob as diretrizes de uma Coordenação Geral. Essa estrutura permitirá ao Conselho Seccional mapear, acompanhar e atender as demandas locais do dia a dia e especificidades de cada região da advocacia paulista.

2. Fortalecimento da advocacia

  • Protagonismo público: retomaremos a histórica participação dos advogados no debate das grandes questões de interesse público e social.
  • Diretora de Relações Institucionais: órgão a ser criado para restabelecer o relacionamento com as lideranças dos poderes públicos, especialmente com as do Poder Judiciário, para assim vermos respeitadas as prerrogativas legais da nossa profissão.
  • Especialistas na defesa judicial das prerrogativas: composição de corpo de advogados(as) contratados e remunerados pela OAB-SP para atuar nos plantões e processo em que colegas tenham sido prejudicados no exercício das nossas prerrogativas.
  • Otimização do canal de atendimento à violação de prerrogativas: criação de redes regionais que serão conectadas a um sistema mais eficiente de comunicação para tutelar imediatamente os advogados(as) que tiverem afrontadas as prerrogativas profissionais.
  • Fiscalização da atividade de advocacia: criação da Controladoria da Atividade de Advocacia, que atuará em conjunto com as Subseções para fiscalizar e combater as práticas profissionais ilícitas e abusivas.
  • Antecipação de créditos de honorários: em parceria com empresas especializadas, serão antecipados o desembolso dos honorários, mediante apresentação de documentos comprobatórios do crédito.

3. Formação do advogado

  • Contenção de faculdades deficientes por meio da implementação de parecer vinculante da OAB sobre a aprovação e manutenção de cursos jurídicos.
  • Diretoria de Ensino Jurídico: órgão a ser composto por diretores de faculdades de direito para intercâmbio de experiências acadêmicas e de gestão visando a melhora de modelos educacionais.
  • OAB na Faculdade: palestras periódicas ministradas por advogados(as) sobre temas jurídicos e o papel da advocacia no Estado e na sociedade, com distribuição de material didático de apoio.

4. Apoio ao profissional

  • Processos eletrônicos eficientes: criação de comitê que acompanhará e sugerirá melhorias aos poderes públicos sobre essa tecnologia e que produzirá material e cursos de auxílio aos advogados(as).
  • Plataforma digitais de apoio, via web, que auxiliarão nas demandas diárias do advogado(a) e darão publicidade à advocacia por ele(a) exercida.
  • Ferramentas didáticas digitais de aprendizado para auxiliar o público menos familiarizado com a tecnologia.
  • Espaços gratuitos de trabalho e convivência profissional nas Subseções.
  • Final de semana com a OAB: workshops sobre temas diversos, voltados aos profissionais que não dispõem de tempo para atualizações durante a semana útil.
  • Feira estadual de empregabilidade: evento que propiciará oportunidades para quem procura ingressar ou se reposicionar no mercado de trabalho.
  • Linhas especiais de crédito: a partir de convênios com instituições financeiras, será facilitada a concessão de linhas de créditos mais vantajosas aos advogados(as).
  • Programa “Remédio para Todos”: ao custo mensal de R$ 30,00, integrantes da Advocacia poderão dispor de até R$ 300,00 em medicamentos genéricos em qualquer farmácia do Brasil

5. Grupos da Advocacia: atendimento às demandas específicas e já apuradas das seguintes parcelas da advocacia:

  • Jovem Advocacia
  • Advocacia Pública
  • Advocacia de Mulheres
  • Diversidade racial
  • Advocacia LGBTQIA+
  • Advocacia com Deficiência
  • Conveniados da Assistência Judiciária

6. Gestão interna

  • Contratação de empresa independente para realizar a auditoria das contas do Conselho Seccional.
  • Implementação de política ESG para promoção de melhores práticas de gestão e governança no Conselho Seccional.
  • Retomada, pela Tesouraria da OAB-SP, da análise e negociação das anualidades inadimplentes.
  • Maior efetividade das Comissões Permanentes e Temporárias por meio de uma sistemática de multidisciplinariedade, metodologia e de inter-relação entre elas, visando melhor produção e aproveitamento.
  • Revisão das regras sobre inscrição suplementar, junto ao Conselho Federal da OAB-SP, especialmente envolvendo cobrança de anuidade.
  • Correção da representação dos advogados paulistas no âmbito nacional, mediante a implantação do sistema proporcional de representação.

7. Cidadania

  • OAB na Educação: palestras às redes privada e pública de ensino estadual e municipal sobre o papel da advocacia no Estado e na sociedade, com distribuição de material didático de apoio, a fim de conscientizar e abrir novos horizontes para o jovem cidadão.
  • OAB na Escola: palestras às redes privada e pública de ensino estadual e municipal abordando noções básica de Direito, com distribuição de material didático, destinadas aos estudantes e seus familiares.

Temos um grupo competente e comprometido. Temos um plano de ação consistente. Falta-nos a ferramenta adequada, a que me referi acima. Mudanças e ajustes da dimensão e profundida que idealizamos só podem ser implementados por um instrumento com a estrutura, alcance, competências, recursos humanos e financeiros próprios do Conselho Seccional.

Mas, para manusearmos essa ferramenta sem igual, precisamos do seu consentimento. Por isso, pedimos a sua anuência por meio do seu voto no próximo dia 21/11 à nossa Chapa 18 — Kauffmann e Lucineia — OAB Unida. Se tiver alguma dúvida sobre como votar na primeira eleição on-line da OAB-SP, acesse o tutorial no link. Contar com a sua concordância é a melhor e mais verdadeira indicação de que estamos no caminho certo.

Sou grato por sua leitura a esta carta. Se, por meio dela, conseguimos aguçar sua percepção sobre a crise que a nossa profissão enfrenta, já considero um grande progresso. Mas se o que ela lhe provocou foi um sentimento de necessidade de mudanças, estamos receptivos a ouvir suas ideias e a acolhê-lo(a) em nosso grupo.

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