Ministério da Justiça apresenta plano Pena Justa no G20 Social, no Rio
18 de novembro de 2024, 21h16
A Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen), do Ministério da Justiça e Segurança Pública, apresentou no G20 Social, no Rio de Janeiro, na última quinta-feira (14/11), o processo de criação do plano Pena Justa.
O programa, que recebeu cerca de seis mil sugestões por meio de audiências e consultas públicas, é um conjunto de ações para enfrentar violações de direitos humanos no sistema prisional brasileiro, e foi construído com a colaboração de representantes do setor público e da sociedade civil. O Pena Justa é o Plano Nacional para Enfrentamento do Estado de Coisas Inconstitucional nas Prisões Brasileiras, que está sob análise do Supremo Tribunal Federal.
De acordo com o secretário Nacional de Políticas Penais, André Garcia, a apresentação do Pena Justa no G20 Social reflete o compromisso da pasta em transformar o sistema prisional brasileiro.
“Essa discussão não é apenas técnica, mas uma pauta de cidadania e direitos humanos que diz respeito a toda a sociedade. Envolver a população nesse processo é fundamental para garantir que as mudanças propostas sejam compreendidas, apoiadas e acompanhadas por todos.”
Para Garcia, a sociedade precisa participar desse debate para assegurar a transparência e a corresponsabilidade no enfrentamento das violações de direitos no sistema prisional. “Esse engajamento fortalece a fiscalização e o compromisso do poder público, além de contribuir para um ambiente de justiça e respeito à dignidade humana.”
A elaboração do plano responde a uma decisão do STF para combater o estado de inconstitucionalidade nas prisões brasileiras, decretado no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 347.
Prioridade global
A diretora de Cidadania e Alternativas Penais da Senappen, Mayesse Parizi, explicou que a inclusão do Pena Justa no G20 Social permite que a humanidade das pessoas privadas de liberdade, egressas do sistema prisional e suas famílias seja condição para a construção de um mundo mais justo, mostrando que a transformação do sistema prisional é uma prioridade global e uma responsabilidade coletiva.
“A troca de experiências no G20 Social também destaca o quanto a dignidade e a cidadania das pessoas privadas de liberdade são prioridades universais e que, ao tratarmos desse tema, estamos reforçando o compromisso do Estado brasileiro com o enfrentamento, a superação e a não repetição do estado de coisas inconstitucional das prisões, ampliando os modos de responsabilização penal extra muros e de alternativas ao cárcere”, defendeu ela.
Mayesse ainda afirmou que o Pena Justa não é apenas uma resposta interna, mas um chamado para que a política penal esteja na pauta global.
“Todo o investimento é no sentido de que os diálogos internacionais abram possibilidades inovadoras, eficientes e concretas de promoção de uma sociedade mais segura, mais humana e mais justa para todas as pessoas.”
Julgamento no STF
O Plenário do Supremo Tribunal Federal analisa o Pena Justa. O ministro Luís Roberto Barroso, presidente da corte, votou pela homologação do plano, e foi seguido até o momento pelos ministros André Mendonça e Edson Fachin. O julgamento foi interrompido por pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes.
Em seu voto, Barroso determinou que os estados formulem, em até seis meses, seus próprios planos de ação, tendo como baliza a política apresentada pela União. Ele propôs o prazo de três anos para que o estado de coisas inconstitucional seja superado, depois de formulados os planos estaduais.
Em 2015, na ADPF 347, foi reconhecido o estado de coisas inconstitucional nos presídios e determinada a elaboração de planos nacional, estaduais e distrital para solucionar os problemas dos presídios.
A decisão liminar, do ministro Marco Aurélio (hoje aposentado), foi confirmada pelo Plenário do Supremo em outubro de 2023. Desde então, a União, por meio do Ministério da Justiça, e o Conselho Nacional de Justiça passaram a coordenar a elaboração de um plano nacional para conter as violações de direitos humanos nos presídios.
“Considero que o Pena Justa atende aos critérios de razoabilidade fixados na primeira parte do voto que prevaleceu aqui no STF, servindo de referência para planos a serem elaborados por gestores públicos em outras ações estruturais”, disse Barroso.
Segundo ele, o plano apresentado foi bem formulado. “A qualidade se deve ao esforço e colaboração da sociedade civil e de todos os atores envolvidos, especialmente o Ministério da Justiça e Segurança Pública e o Conselho Nacional de Justiça.”
O que diz o plano
O monitoramento da execução do plano será feito pelo CNJ. O Pena Justa prevê quatro eixos para enfrentar o estado de coisas inconstitucional nos presídios:
1) Controle de entrada e das vagas no sistema prisional;
2) Qualidade da ambiência, dos serviços prestados e da estrutura prisional;
3) Processo de saída da prisão e da reintegração social; e
4) Políticas de não repetição do estado de coisas inconstitucional.
Entre as ações previstas, estão as seguintes:
1) A implantação de núcleos/centrais ou varas de garantias qualificadas nas capitais e interior com estrutura de serviços integrados;
2) A adoção de modelo nacional de audiências de custódia nos núcleos/centrais ou varas de garantias, de forma presencial, sempre que possível, e em até 24 horas;
3) Ampliar medidas diversas da prisão, como penas alternativas e monitoramento eletrônico;
4) Ampliar o acesso à defesa, com o fortalecimento das defensorias públicas;
5) Direcionar políticas de drogas para ações de saúde.
Entenda o caso
Em 4 de outubro do ano passado, o Plenário do STF entendeu que há um estado de coisas inconstitucional no sistema carcerário brasileiro, o que exige a atuação conjunta de diversas autoridades para a construção de uma solução satisfatória.
Na ocasião, Barroso afirmou que a situação prisional compromete a ressocialização e a garantia da segurança pública. A superlotação, disse ele, inviabiliza a prestação de serviços essenciais que integram o mínimo existencial.
Por fim, o ministro considerou que o fato de os presos estarem sob a custódia do Estado suspende apenas a sua liberdade, devendo ser assegurado a eles o acesso à saúde, à educação e ao trabalho.
“As demandas por melhores condições nas prisões são extremamente impopulares junto à opinião pública. Há uma certa resistência à ideia de que um país com recursos escassos e demandas sociais infinitas destine parte de tais recursos às pessoas que entraram em conflito com a lei, em prejuízo de outros grupos vulneráveis. Há, contudo, duas razões essenciais para dar atenção aos direitos dos presos: a primeira, ligada ao respeito aos direitos fundamentais protegidos pela Constituição e por outros diplomas. E a segunda, relacionada ao impacto que o sistema prisional produz sobre a sociedade em geral”, disse Barroso.
Há um ano, o tribunal estabeleceu a seguinte tese:
1) Há um estado de coisas inconstitucional no sistema carcerário brasileiro, responsável pela violação massiva de direitos fundamentais dos presos. Tal estado de coisas demanda a atuação cooperativa das diversas autoridades, instituições e comunidade para a construção de uma solução satisfatória;
2) Diante disso, União, estados e Distrito Federal, em conjunto com o Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Conselho Nacional de Justiça (DMF/CNJ), deverão elaborar planos a serem submetidos à homologação do Supremo Tribunal Federal, nos prazos aqui fixados, observadas as diretrizes e finalidades expostas no presente voto, especialmente voltados para o controle da superlotação carcerária, da má qualidade das vagas existentes e da entrada e saída dos presos;
3) O Conselho Nacional de Justiça realizará estudo e regulará a criação de número de varas de execução proporcional ao número de varas criminais e ao quantitativo de presos.
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