Opinião

Vinicius Gritzbach jogou pôquer com o PCC, errou a mão e acabou perdendo

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13 de novembro de 2024, 11h21

Se o crime fosse um jogo de pôquer, Vinicius Gritzbach daria as cartas. Era um manipulador nato, bem-sucedido em jogadas de duvidosa legalidade, conheceu o jogador número um do PCC (Primeiro Comando da Capital), Cara-Preta (Anselmo Becheli Santa Fausta), cabeça do tráfico e milhões no bolso, muitos milhões, dos quais disse saber como manter e usar sem correr risco nenhum, usando truques com laranjas, criptomoedas, etc.

Reprodução/TV Globo

Não que ele fosse um expert no mercado financeiro. Não era, sua expertise era o crime. Mas o dinheiro era tanto que não resistiu, desviou para si o que não devia. Nem todo criminoso é burro. Barões do tráfico com certeza não são. Ou estariam mortos há muito.

Veio a cobrança e Vinícius viu o relógio da vida marcar o tempo mais rápido. Segundo a acusação feita em juízo, na base do antes ele do que eu, contratou a morte da Cara-Preta, que foi assassinado em 2021.

Vinícius subiu um degrau na hierarquia do crime: lavagem de dinheiro, falsificações, tráfico. Acrescentou homicídio ao seu borderô. Só que passando de fase chegou a outro nível do jogo e não se deu bem, deixou rastros que levaram até ele e acabou sendo identificado e processado pelo assassinato do ex-patrão.

Preso, contou com bons advogados, óbvio, e saiu pela porta da frente, mercê de decisão dos tribunais superiores. Mas, livre, viu o relógio correndo cada vez mais rápido e virou o jogo em uma aposta arriscada: fez uma delação premiada entregando os esquemas de lavagem de dinheiro que eram de Cara-Preta e outros membros da facção.

Objetivo: livrar-se das novas investigações de lavagem de dinheiro e tentar escapar da acusação de homicídio, que poderia lhe render uma pena provável e mais de 20 anos de reclusão. Morte certa no presídio. E assim fez: negociou longamente, usou todos os seus dons de manipulação e conseguiu a delação, entregou os anéis. Ficariam os dedos, por enquanto.

Mas ele tinha que se livrar da acusação do homicídio. Sobre esta não tem acordo. Espertamente, incluiu na delação acusações aos policiais que o identificaram. Desta forma, atingira a prova produzida contra si no homicídio. Pode ser verdade ou não, mas fica a questão quanto ao tal suborno não ter dado certo, já que, ao final, foi responsabilizado pelo crime, não é?

Vinícius jogava para todos os lados

Recusou a proteção de delator, que no Brasil é uma lástima, mas por um motivo muito simples, ele continuava praticando crimes, movimentando quantias. Tinha R$ 1 milhão em joias consigo no momento de sua morte.

Ele jogou pôquer e errou a mão, acabou perdendo. Foi morto no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos, pelo simples fato de que era o local mais propício para a execução. Em casa estaria protegido. Em deslocamentos rápidos se torna difícil também. No aeroporto estaria à pé e em local de acesso público, onde a ação poderia se desenrolar livremente.

Não é mensagem e nem recomendação. É uma ação planejada em detalhes que deu certo e foi executada quase perfeitamente, quase porque o carro usado para a fuga foi apreendido. Deveria ter sido queimado para destruição de vestígios. Não foi porquanto não sabemos a razão. Algo que naquele momento impediu. É o vestígio físico mais evidente.

Planejamento, execução e meios típicos de uma ação militar

A escolta de policiais agiu suspeitosamente. Os assassinos sabiam exatamente onde Vinícius estava atravessando a rua, por qual portão havia saído e em qual momento. O impacto midiático veio do fato da execução ter sido feita no aeroporto.

Fato inédito e inesperado, local frequentado por grande parte da população que se viu insegura. Se Vinícius tivesse sido morto perto de uma biqueira, sua morte teria outro significado? Mas a morte do delator não se compara com a do juiz Machado [Antônio José Machado Dias foi assassinado em 2003 quando deixava o Fórum de Presidente Prudente (SP)], que decidia a execução das penas dos líderes do PCC. Esta sim uma afronta ao Estado. Muito menos aos atentados de 2006, que paralisaram São Paulo e resultou na morte de 70 policiais. Isto nem de perto é tão afrontoso à sociedade e sobretudo ao Estado.

E nem se fale que estamos perto de fazer do Brasil um narcoestado. Estamos muito longe do México, onde os carteis existem há mais e um século e enfrentam as forças de segurança e igual para igual. E muito menos a Bolívia, que teve como Evo Morales, líder cocaleiro, como presidente. Nem temos uma guerra civil como as Farc opuseram na Colômbia de Pablo Escobar.

À exceção do Rio de Janeiro, no Brasil, o tráfico não se opõe às polícias de igual para igual desafiando as forças de segurança. Portanto, falar em narcoestado é estar fora dos parâmetros da razoabilidade.

O que falta ao Brasil é uma decisão a ser tomada no combate ao tráfico de drogas, pondo fim a uma esquizofrenia legal e decidindo de uma vez por todas se este combate deve ser feito ou não, porque, enquanto isto, as facções vão continuar a existir porque são, essencialmente, traficantes.

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