Opinião

Resolução da CMN aprimora governança corporativa das cooperativas de crédito

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  • é sócio na área de direito societário de Silveiro Advogados é mestrando em Direito Societário pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e especialista em Direito Internacional pela mesma instituição.

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12 de novembro de 2024, 17h24

A Resolução CMN nº 5.051/22 foi um marco relevante no âmbito do Conselho Monetário Nacional para reforçar a organização e o funcionamento das cooperativas de crédito, estabelecendo padrões superiores em comparação com outros tipos de sociedades cooperativas. O panorama regulatório do cooperativismo de crédito, no entanto, é distinto.

A recente Lei Complementar nº 196/22, que alterou a Lei Complementar nº 130/09, trouxe aprimoramentos relevantes, especialmente para temas de governança e gestão, em conformidade com as melhores práticas adotadas internacionalmente no segmento cooperativista de crédito. Tais questões ainda não haviam sido plenamente regulamentadas pelo CMN, até finalmente ter sido publicada a Resolução nº 5.131/24, para efetiva aplicação dessas novas regras.

Conselho de administração: renovação e sucessão

Uma das mudanças relevantes diz respeito à renovação dos membros do conselho de administração. Apesar de já existir regra de renovação de um terço dos membros do conselho de administração, na prática, a norma não era efetiva para impor a rotatividade dos conselheiros, o que gerava a permanência de pessoas por prazos excessivamente longos, gerando riscos para as entidades.

Em linha com as melhores práticas de governança corporativa, a alteração proposta pela resolução busca impedir a vitaliciedade dos membros do conselho de administração, impondo que as cooperativas de crédito implementem uma política de renovação que deve: estabelecer um limite de permanência dos conselheiros; ser consistente com a política de sucessão de administradores; e considerar riscos, especialmente o de continuidade da cooperativa.

A política de renovação deve ser implementada até 1º de janeiro de 2026 e será fiscalizada pelo Banco Central, que poderá solicitar alterações e aprimoramento a depender do grau de risco de exposição de cada entidade. Até essa data e enquanto a entidade não implementar a política, o período máximo de permanência dos membros no conselho de administração será de 12 anos consecutivos, independentemente do prazo do mandato.

É importante ressaltar a indicação da necessidade de planejamento sucessório, que é fundamental para mitigar riscos, garantir a continuidade da gestão e preservar o valor das cooperativas. A ausência de um processo estruturado para a substituição de lideranças pode resultar em lacunas de gestão e na continuidade de políticas e estratégias organizacionais. Portanto, ter políticas de sucessão tanto a nível local quanto nacional (quando aplicável) fortalece a estrutura de governança, garantindo a preparação de novos líderes para assumir responsabilidades de forma eficaz.

Spacca

Por fim, destaca-se a exceção das cooperativas de 2º e 3º grau: a resolução dispensou a renovação periódica de um terço dos membros do conselho de administração de um terço dos membros dos conselhos de administração de cooperativa de cooperativas centrais de crédito e confederações de crédito cujos conselhos de administração tenham participação equitativa de todas as suas cooperativas associadas.

Essa mudança é relevante, pois simplifica o processo de renovação de tais conselhos de administração e mantém a representatividade das cooperativas singulares associadas. Mas fica o alerta: é recomendável que também exista política de renovação também aplicável às cooperativas de crédito de 2º e 3º grau, para que se mantenha o nível de boas práticas de governança em todo o sistema cooperativo.

Conselheiros independentes

Outra alteração proposta pela resolução, de forma a regulamentar alteração introduzida na Lei Complementar nº 130/09, diz respeito sobre a possibilidade de contratação de conselheiro de administração independente não associado. Observadas as condições e exigências para exercício do cargo, poderão as cooperativas de crédito considerar profissionais de fora das cooperativas, devendo dispor sobre as diretrizes para sua contratação; o número máximo desses conselheiros; e as condições para sua recondução.

Esta regra amplia o nível de governança e de especialização das cooperativas, permitindo que as cooperativas acessem conhecimento técnico e visão externa. Em linha com as recomendações internacionais e as melhores práticas e regras aplicadas a sociedades por ações, a presença de conselheiros independentes proporciona uma gestão mais neutra e estratégica.

Diretoria executiva: acúmulo de cargos

Outro ponto de destaque diz respeito ao acúmulo de cargos na diretoria executiva, limitado para funções técnico-operacionais e desde que não haja conflito de interesses. Essa medida também decorrente do processo de regulamentação e aplicação da Lei Complementar nº 130/09 e visa a promover sinergia e economicidade dentro do sistema cooperativo, especialmente para cooperativas de menor porte.

Contudo, é fundamental que cada cooperativa implemente políticas rigorosas para prevenir conflitos de interesse. A transparência e a ética devem nortear a atuação de diretores que, porventura, ocupem cargos em mais de uma cooperativa do sistema, assegurando a independência necessária em suas funções, principalmente em caso de exercício simultâneo em diferentes graus de um sistema cooperativo. Por isso, é recomendável a implementação de políticas claras e rigorosas para identificar, gerenciar e mitigar conflitos de interesse, garantindo transparência e promovendo um ambiente ético e responsável.

Assembleia geral: representação por delegados

Por fim, a resolução expressamente permite a representação de associados por delegados nas assembleias gerais. Essa medida reforça os princípios cooperativistas de gestão democrática, autonomia e independência.

Assim, poderão ser realizadas reuniões seccionais de associados para deliberar sobre matérias incluídas na pauta para decisão em assembleia geral, que vinculará aqueles associados representados no conclave. O delegado exercerá um voto com valor proporcional à quantidade de associados vinculados à seccional representada por ele na assembleia geral.

Esses dispositivos promovem uma governança mais inclusiva, ao assegurar que os associados, independentemente de sua localização ou número, sejam representados de forma transparente e eficaz por delegados nas deliberações da cooperativa.

Ao introduzir medidas sobre rotatividade de conselheiros, a inclusão de conselheiros independentes, a definição de critérios para o acúmulo de cargos e a representação democrática de associados por delegados, o cooperativismo de crédito tem suas normas de governança e gestão reforçadas, alinhado com as melhores práticas sobre a matéria. Devem, entretanto, as cooperativas de crédito observar os prazos e regras atualmente em vigor para se adequarem à resolução, aprimorando suas regras internas de governança.

Autores

  • é advogado nas áreas de Direito Societário, Contratos, ESG, M&A e Private Equity do escritório Silveiro Advogados, graduado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), especialista em Direito Internacional Privado e Público pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e mestre em Direito pela UFRGS.

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