OAB-SP virou apenas um boleto para a advocacia, diz Renato Almeida
6 de novembro de 2024, 8h30
Renato Ribeiro de Almeida quer ser o presidente da seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP) no triênio 2025-2027 para dar voz aos advogados que “colocam a barriga no balcão”.
Em conversa com a revista eletrônica Consultor Jurídico, Almeida disse que a OAB-SP privilegia os grandes escritórios da capital e virou apenas mais um boleto para os demais advogados. Entre suas propostas, ele prevê como primeiro ato no cargo reabrir as salas dos advogados fechadas pela atual gestão.
A entrevista é a sexta e última de uma série promovida pela ConJur com os candidatos à presidência da OAB-SP, com eleição prevista para o dia 21 deste mês, em votação online. Entre segunda (4/11) e esta quarta-feira (6/11), foi publicada uma entrevista por dia, levando em conta a ordem alfabética dos nomes dos concorrentes. Na semana passada, outras três já haviam ido ao ar.
Quem é Ribeiro de Almeida?
Natural de Penápolis (SP), o entrevistado da vez é sócio da banca Ribeiro de Almeida & Advogados Associados. Formado pela Universidade de São Paulo (USP), obteve também doutorado em Direito do Estado na instituição. É ainda mestre em Direito Político e Econômico pelo Mackenzie.
Almeida atua também como conselheiro do Instituto Luiz Gama e coordenador acadêmico da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), área sobre a qual publicou livros e leciona em diferentes instituições. Na OAB-SP, ocupa o posto de membro efetivo da comissão especial de Direito Eleitoral.
Ele tem Adriana de Morais como candidata a vice-presidente em sua chapa. Ela dá aulas na Escola Superior de Administração, Marketing e Comunicação (Esamc) e preside a comissão de Igualdade Racial na OAB-Campinas.
Leia a entrevista
ConJur — Por que o senhor deseja ser presidente da OAB-SP?
Ribeiro de Almeida — Minha candidatura não é um projeto pessoal de poder. Ela surge de um sentimento coletivo de insatisfação com o mais do mesmo. Isso é muito perceptível porque meus adversários já estiveram juntos no passado. A cada nova eleição, por pura vaidade e sede de poder, eles se desentendem e montam chapas. Mas, no fundo, são os mesmos. Já a nossa candidatura parte de uma coletividade. Represento os advogados da periferia, do interior, aqueles que prestam serviços no convênio com a Defensoria, que “colocam a barriga no balcão”, que frequentam delegacias e têm suas prerrogativas violadas, que são maltratados pelas autoridades que insistem em confundi-los com seus clientes. Esses jamais tiveram vez ou voz na OAB-SP.
ConJur — Os últimos tempos foram marcados por violações das prerrogativas da advocacia, especialmente por parte de policiais. Como será a defesa dessas prerrogativas em sua gestão? O que pode melhorar?
Ribeiro de Almeida — Muitas autoridades policiais confundem os advogados e advogadas com os seus clientes. Todos os dias chegam relatos de verdadeiros absurdos que ocorrem nas delegacias de polícia por todo o estado de São Paulo. Infelizmente, a OAB-SP só faz alguma coisa quando um advogado famoso é achincalhado. Daí vira uma comoção. Mas e quando o advogado comum é a vítima? A garantia da ampla defesa e do contraditório é um pilar fundamental da sociedade. E somente com as prerrogativas da advocacia absolutamente valorizadas nós avançaremos. Os dirigentes da OAB-SP precisam sair dos seus castelos, dos seus pomposos escritórios, e visitar a base. Se fizessem isso, ficariam chocados. Meu grupo veio da base. Sabemos o que fazer.
ConJur — Os Tribunais de Ética e Disciplina da OAB têm julgado casos que extrapolam as suas competências e deixado de punir exemplarmente infrações sérias, como a apropriação de verbas de clientes. Como deve ser o TED em sua gestão?
Ribeiro de Almeida — O TED não pode ser um empecilho à prática da advocacia. As últimas duas gestões, as quais atravessaram a pandemia da Covid-19, especializaram-se em punir colegas que faziam pequenas lives, com o argumento de que estariam captando clientes ilegalmente. Mas fecharam os olhos para os chamados “tubarões da advocacia”, que postam obras cinematográficas em carrões, viagens em jatos de luxo e escritórios pomposos. O ditado precisa valer: “Pau que dá em Chico tem de dar em Francisco”. Se o TED é severo com a advogada da periferia que posta uma foto com uma cliente famosinha, precisa ser igualmente severo com quem faz do exibicionismo seu modo de vida.
ConJur — Como a OAB-SP deve agir com relação a avanços tecnológicos? Medidas como sessões via teleconferência, sustentações orais gravadas e julgamentos por colegiado virtual são benéficas ou prejudiciais aos advogados?
Ribeiro de Almeida — A tecnologia tem de estar a serviço da advocacia, e não o contrário. A defesa das prerrogativas comporta que os advogados tenham acesso aos juízes e aos tribunais de forma presencial, olho no olho. É um direito do advogado levar ao julgador as demandas de seus clientes. O próprio cliente espera que seu advogado faça essa conversa presencial. A OAB-SP precisa fiscalizar e cobrar os magistrados que simplesmente se recusam a receber advogados, um absurdo cada vez mais comum. Meus adversários: um está na gestão, outro foi presidente e outro presidiu o TED. Pergunto: alguma vez verdadeiramente se empenharam para que os colegas tivessem garantido o acesso aos julgadores? A resposta todos nós sabemos.
ConJur — Como a Caixa de Assistência pode ajudar mais os advogados?
Ribeiro de Almeida — A Caasp precisa ser repensada. Conheço pessoalmente mais de 600 municípios do estado de São Paulo. Nenhum candidato rodou o estado de São Paulo como eu. O que ouço frequentemente dos colegas é que os remédios estão cada vez mais caros, enquanto a Caasp se limita a fazer promoção de cosméticos. É preciso buscar novos fornecedores, cobrar por mais descontos e romper contratos, se for o caso. Não é possível que mais de 370 mil advogadas e advogados inscritos não sejam capazes de exercer pressão para que muito mais seja oferecido aos colegas. Mais uma vez: questão de prioridades. Quem está no topo só visita a Caasp na hora da eleição. Nunca foi lá comprar um remédio para o filho doente.
ConJur — Quais são as suas propostas para as salas dos advogados em tribunais?
Ribeiro de Almeida — As salas nos tribunais antes tinham um café horroroso, que parecia ter sido coado na meia. Mas a atual gestão teve criatividade para resolver o problema. Melhorou o café? Não. Fechou a sala. É um absurdo. Essa salas possibilitam a convivência, a troca de experiências e até a celebração de novas parcerias. Dou o exemplo do TRE-SP, em que a atual gestão fechou a sala. Um colega que sai de Presidente Prudente para entregar um memorial, se quiser acrescentar alguns pontos, tem de se aventurar pelo centro de São Paulo para achar uma lan house. Será que a OAB-SP, rica do jeito que é, teria mesmo de fechar a sala no TRE, que julga candidaturas de 645 municípios? Meu primeiro ato será reabrir as salas fechadas pela atual gestão.
ConJur — A OAB Nacional, em parceria com OABs locais, já inaugurou cerca de cem coworkings para facilitar a vida de advogados que não têm escritórios próprios. O senhor pretende investir nessa ideia?
Ribeiro de Almeida — Esses espaços são muito bem-vindos. Mas não basta apenas ter o coworking. Em São Paulo, nós temos a particularidade de estarmos prestes à implantação do sistema eproc. Eu tenho certeza absoluta de que muitos terão dificuldade com esse sistema, especialmente os colegas mais veteranos. Será necessário oferecer treinamentos nessas salas de coworking e também nas salas da OAB-SP nos fóruns e tribunais, que reabrirei.
ConJur — É preciso aumentar a transparência na OAB-SP?
Ribeiro de Almeida — Para a maioria das advogadas e advogados do estado de São Paulo, a OAB-SP é apenas mais um boleto. Funciona como se fosse mais um tributo que pagam no começo do ano, juntamente com o IPVA e o IPTU. O orçamento da OAB-SP é milionário. Portanto, é absolutamente imprescindível que haja transparência máxima sobre os gastos e prioridades da gestão. Infelizmente, esses gastos e prioridades estão pouco claros para quem não pertence à casta dos gestores. Os meus antecessores igualmente pouco fizeram para melhorar essa situação.
ConJur — Considerando que o número de advogados formados cresce a cada ano, como receber e apoiar a jovem advocacia?
Ribeiro de Almeida – A jovem advocacia não pode ser vista apenas como massa de manobra e um eleitor pobre, alguém a quem os candidatos oferecem migalhas. Sei como é isso porque sou o advogado mais jovem a concorrer à presidência, comecei do zero e não tive nenhum parente abrindo portas. Quando alguém é aprovado no concurso do Ministério Público ou na magistratura, vai para uma escola. Agora, quando o advogado ingressa na carreira, não tem um curso, ele recebe apenas uma tabela de honorários e uma série de proibições sobre propaganda e captação. É preciso modificar isso. Gostaria que os jovens advogados tivessem a oportunidade que eu não tive e aprendessem o empreendedorismo. Quero que todos consigam progredir na advocacia.
ConJur — A OAB-SP faz um bom trabalho de estimativas de honorários?
Ribeiro de Almeida — A OAB-SP não faz um bom trabalho nesse quesito. Pior: a OAB-SP hoje não entende absolutamente nada sobre estimativa de honorários. Para muitos, o valor da tabela é muito elevado, impraticável em um ambiente de concorrência selvagem. E, para os ricos, o valor é irrisório. Acontece que a OAB-SP nada faz contra quem pratica advocacia predatória, a valores módicos. Se existe uma tabela, que esses valores sejam minimamente observados e fiscalizados.
ConJur — Diversas decisões negam o pagamento de honorários a advogados dativos. O que pretende fazer sobre o assunto?
Ribeiro de Almeida — É uma absoluta vergonha o que acontece com os advogados dativos. Como a maior parte dos nossos atuais dirigentes e ex-dirigentes jamais teve um único processo como advogado dativo, nem faz ideia do que se passa na base. A certidão quase sempre vem errada. É uma verdadeira humilhação a trabalheira que dá para receber honorários de valores tão inexpressivos. Eu pretendo mudar essa realidade com a alocação de esforços e funcionários da OAB-SP para auxiliar os colegas e cobrar do Judiciário resoluções efetivas e rápidas quanto a esses problemas.
ConJur — Como o senhor gostaria que a sua gestão fosse lembrada?
Ribeiro de Almeida — Desejo que minha gestão seja lembrada como a primeira que trouxe um advogado da base, vindo do interior e filho de uma família de classe média-baixa para a presidência da OAB-SP. Eu venho junto com um grupo de pessoas que sempre foram invisibilizadas por aqueles que fazem da OAB-SP um trampolim político e que apenas perseguem os próprios interesses. A OAB-SP precisa mudar completamente. É uma questão de sobrevivência de milhares de colegas que não aguentam mais ter dupla jornada e exercer outra atividade para complementar a renda. A advocacia paulista se dividiu entre aqueles que ostentam uma vida de luxo e os que mal conseguem pagar as contas. Somente a nossa chapa, cujo nome é OAB Popular, pode mudar esse cenário.
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