Opinião

Incra toma decisão histórica no caso da Eldorado Celulose

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  • é colunista do 247 foi subeditor de Veja e repórter do Jornal Nacional entre outros veículos. Ganhou os prêmios Esso (equipe 1992) Vladimir Herzog e Jornalismo Social (revista Imprensa).

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5 de novembro de 2024, 11h00

A decisão do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) sobre a Eldorado Brasil Celulose é uma vitória da soberania do país e deve ser comemorada não como o ponto final de uma disputa entre empresas, mas como a proteção de um patrimônio imaterial, que é a atividade econômica que leva em consideração a nacionalidade de seus controladores.

Eldorado Celulose

Incra confirmou que transferência da Eldorado Brasil Celulose para a Paper contraria a lei

O Incra decidiu que a transferência do controle acionário da Eldorado para um grupo controlado por um controverso empresário indonésio contraria a lei. Não por conta da atividade empresarial, que é permitida ao capital estrangeiro. Nem por conta das polêmicas que envolvem o controlador do grupo indonésio, protagonista de escândalos ambientais e corporativos.

Mas porque a transferência do controle acionário da Eldorado significa a alienação para um empresário estrangeiro de grandes áreas de terras do Brasil, que somam mais de 400 mil hectares, maior do que os municípios de São Paulo e Rio de Janeiro somados. A Eldorado utiliza essas áreas para o plantio de eucalipto, matéria-prima da celulose.

De acordo com a legislação, a transferência de terras nessa proporção para o capital estrangeiro deve ser precedida de autorização formal do Incra e também do Congresso Nacional, o que o grupo indonésio nunca teve.

Mesmo assim, em 2017, contando com o apoio do então presidente, Michel Temer (MDB), a Paper Excellence tentou fechar o negócio, na mesma época em que o governo federal procurava emplacar um projeto de lei ou uma medida provisória para permitir a desnacionalização de grandes áreas rurais. O tema, no entanto, não andou.

Reprodução/Facebook

Em 2019, no governo Bolsonaro (PL), o grupo indonésio manteve a ofensiva e , com apoio do Eduardo, filho do presidente, tentou manipular a opinião pública, com a farsa do checão sem fundo, no caso sem fundo de verdade.

Depois que deixou o governo, Temer foi contratado como consultor do grupo indonésio e hoje, segundo o Radar Econômico, da revista Veja, ele atua nos bastidores para tentar reerguer a proposta, e estaria até escrevendo um livro para defender a tese. Dificilmente, no entanto, uma proposta como esta teria êxito, sobretudo porque os ventos da política (e não só no âmbito interno) mudaram, e a sociedade não aprovaria a alienação do território brasileiro.

‘Escândalo’

A Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura (Contag) sempre se posicionou contra a articulação de políticos como Temer. “É inadmissível, um escândalo, um atentado à nossa soberania”, disse o presidente da entidade, Aristides Veras dos Santos, na entrevista que deu à TV 247, no ano passado.

O ministro do Desenvolvimento Agrário e da Agricultura Familiar, Paulo Teixeira, também se posicionou firmemente contra a mudança. “O governo Lula é contra essa proposta de permitir a venda de grandes quantidades de terras para estrangeiros. É uma questão de soberania”, disse ele, também em entrevista ao 247.

A decisão do Incra, que tem como base estudos técnicos, é histórica e comprova o acerto da posição de líderes como Aristides e Paulo Teixeira e joga luz em um período obscuro da história do Brasil.

Depois de 2016, o país foi alvo de uma ofensiva ao patrimônio nacional. Como se sabe, a Petrobras foi obrigada a vender ativos e a ceder mercado para empresas estrangeiras de óleo e gás, com a introdução do Preço da Paridade de Importação (PPI).

Também perseguidas pela “lava jato”, as empresas nacionais de infraestrutura perderam mercado para construtoras estrangeiras e hoje nenhuma delas aparece entre as cinco maiores no ranking das companhias responsáveis por grandes obras no país.

Não foi diferente no caso da J&F, o grupo empresarial que criou a Eldorado e que mais crescia no Brasil até a instalação da força-tarefa de Curitiba. A “lava jato” contaminou o Ministério Público Federal e levou à criação de similares, como a  “greenfield”, instrumento de perseguição àquele grupo nacional.

Todas elas tiveram o apoio de uma ONG estrangeira, a Transparência Internacional, que, agora se sabe, atuava como sócia dessas forças-tarefas, articulando a participação nos seus resultados, que, em pelo menos um caso, o da Lava Jato, eram fruto da corrupção, como apurou o corregedor nacional de Justiça.

Era preciso deter essa ofensiva antinacional. Algumas vozes se levantaram, hoje são muitas vozes, e as instituições brasileiras estão assumindo a vanguarda na luta pela soberania. Que continue assim. É preciso que aventureiros do mundo todo saibam: o território brasileiro não está à venda.

*artigo publicado originalmente no Brasil 247

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  • é colunista do 247, foi subeditor de Veja e repórter do Jornal Nacional, entre outros veículos. Ganhou os prêmios Esso (equipe, 1992), Vladimir Herzog e Jornalismo Social (revista Imprensa).

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