OAB-SP precisa se reconectar com a advocacia, afirma Carlos Kauffmann
1 de novembro de 2024, 8h30
Carlos Fernando de Faria Kauffmann quer ser o presidente da seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP) no triênio 2025-2027 para reconectar a entidade com a advocacia e combater violações profissionais.
Em conversa com a revista eletrônica Consultor Jurídico, Kauffmann afirmou que a OAB-SP precisa combater o ativismo judicial que prejudica a advocacia. Entre suas propostas, ele prevê criar centros de trabalho e convivência nas subseções e fiscalizar o cumprimento efetivo da tabela de honorários.
A entrevista é a terceira de uma série promovida pela ConJur com os candidatos à presidência da OAB-SP, com eleição prevista para o dia 21 de novembro, em votação online. Entre quarta (30/10) e esta sexta-feira (1º/11), foi publicada uma a cada dia. Outras três virão na semana seguinte, levando em conta a ordem alfabética dos nomes dos concorrentes.
Quem é Carlos Kauffmann?
Natural de Mogi das Cruzes (SP), onde o pai (Mario Kauffmann) presidiu a subseção da OAB-SP, o entrevistado da vez é advogado criminalista e sócio do escritório Kauffmann e Soares. Ele se formou em 1992 pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, onde concluiu mestrado. Na instituição, leciona Direito Processual Penal, área sobre a qual publicou livros como o Prisão Temporária.
Na OAB-SP, Kauffmann foi conselheiro por dois mandatos seguidos, de 2010 a 2015, e se reelegeu para o triênio 2019-2021, quando presidiu o Tribunal de Ética e Disciplina da seccional.
Ele tem como vice-presidente em sua chapa Lucineia Rosa dos Santos, professora da área de Direitos Humanos na PUC-SP. Em 2023, alunos da instituição fizeram uma campanha para que ela assumisse a vaga deixada pela ministra aposentada Rosa Weber no Supremo Tribunal Federal, que acabou ocupada pelo ministro Flávio Dino.
Leia a seguir a entrevista:
ConJur — Por que o senhor deseja ser presidente da OAB-SP?
Carlos Kauffmann — Vejo uma advocacia fragmentada: muitos se isolam em seus espaços, enquanto questões como a prática predatória e os desafios de acesso ao Judiciário afetam a todos. Durante minha participação nas gestões da OAB-SP, observei iniciativas positivas, mas também notei que algumas deixaram de ser feitas por interesses políticos. Isso precisa mudar. Quero que a OAB-SP recupere sua força e sua relevância, posicionando-se de forma firme diante das violações profissionais e sociais. Desejo restaurar os princípios que sempre pautaram nossa profissão, para que todos sejam respeitados pelo simples fato de serem advogados e para que a OAB-SP se reconecte com a advocacia e a sociedade, demonstrando a força que temos.
ConJur — Os últimos tempos foram marcados por violações das prerrogativas da advocacia, especialmente por parte de policiais. Como será a defesa dessas prerrogativas em sua gestão? O que pode melhorar?
Carlos Kauffmann — A violação das prerrogativas é resultado do enfraquecimento da advocacia, que é um fenômeno crescente e que vai perdurar enquanto nossos dirigentes estiverem mais preocupados com a política, inclusive pessoal, do que com a instituição. É necessário restabelecer o relacionamento institucional com os órgãos públicos para a conscientização efetiva dos problemas vivenciados pela advocacia. Isso é suficiente? Não. Para a recalcitrância de algumas autoridades, é indispensável o enfrentamento direto por ações judiciais e correicionais, o que estará aliado a uma campanha de comunicação para que a sociedade saiba que, quando a prerrogativa de um advogado é ofendida, o direito de um cidadão é desrespeitado.
ConJur — Os Tribunais de Ética e Disciplina da OAB têm julgado casos que extrapolam as suas competências e deixado de punir exemplarmente infrações sérias, como a apropriação de verbas de clientes. Como deve ser o TED em sua gestão?
Carlos Kauffmann — Presidi o TED de 2019 a 2021. Quando assumi, tínhamos 26 turmas disciplinares que agiam de forma absolutamente isolada, com procedimentos próprios. Em dois meses de gestão, redigimos o Regimento Interno do TED, que até então inexistia, com regras procedimentais claras e concretas. Padronizamos os procedimentos. Na pandemia, aparelhamos tecnologicamente todas as turmas disciplinares e digitalizamos os processos (100% na capital e 60% nas demais turmas). É necessário reformular e modernizar a estrutura organizacional interna, que hoje muito se assemelha ao Judiciário e, sabemos, não funciona. Fizemos isso no final de nossa gestão, mas houve retrocesso e se restabeleceu o sistema anterior.
ConJur — Como a OAB-SP deve agir com relação a avanços tecnológicos? Medidas como sessões via teleconferência, sustentações orais gravadas e julgamentos por colegiado virtual são benéficas ou prejudiciais aos advogados?
Carlos Kauffmann — Implementaremos um hub de inteligência artificial para facilitar a vida dos advogados. Buscaremos, por plataforma digital gratuita, fazer com que possam se apresentar de forma objetiva e gratuita, como meio de serem contratados por novos clientes ou por outros advogados ou escritórios que necessitem de correspondentes. Com relação às sessões por teleconferência, entendo que trouxeram uma comodidade e democratizaram o acesso, permitindo que os profissionais do interior participem e profiram sustentação oral sem custo extra, pessoal e financeiro. Contudo, sou absolutamente contrário aos julgamentos virtuais, às sustentações orais gravadas, à imposição de escolha. Isto tem de acabar.
ConJur — Como a Caixa de Assistência pode ajudar mais os advogados?
Carlos Kauffmann — Entre as diversas propostas assistenciais, gostaria de destacar uma parceria, que já consta de projeto, pela qual cada integrante da advocacia, ao custo mensal de R$ 30, poderá adquirir até R$ 300 em medicamentos genéricos, desde que receitados por médico. Trata-se de benefício não cumulativo, a ser disponibilizado para aqueles que desejarem. Em uma segunda etapa, buscaremos subsidiar esse benefício com empresas que, por intermédio da Caasp, vendem planos de saúde, bem como com laboratórios farmacêuticos. Desejamos que todos tenham acesso a esse plano sem custos. Paralelamente, vamos rediscutir todos os benefícios e parcerias que foram esquecidos.
ConJur — Quais são as suas propostas para as salas dos advogados em tribunais?
Carlos Kauffmann — Estabeleceu-se o autoatendimento nas salas dos advogados, especialmente nas subseções, como forma de economizar custos e encargos, com retorno parcial às subseções. Essa verba desapareceu na última gestão, assim como também desapareceram os funcionários. Muitos advogados, especialmente os que trabalham já há algum tempo, enfrentam enormes dificuldades pela falta de assistência pessoal nesses espaços. As salas precisam ter espaço para que seus usuários possam trabalhar com tranquilidade, com acesso gratuito à internet e locais de acolhimento. Vamos trabalhar fortemente para que todos os magistrados retornem ao fórum e as salas precisam estar aparelhadas para nos receber com dignidade.
ConJur — A OAB Nacional, em parceria com OABs locais, já inaugurou cerca de cem coworkings para facilitar a vida de advogados que não têm escritórios próprios. O senhor pretende investir nessa ideia?
Carlos Kauffmann — Investiremos muito nessa ideia, especialmente com a implementação gratuita de centros de trabalho e convivência nas subseções. Após a pandemia, os advogados se isolaram. Muitos trabalham em casa, sem condições materiais mínimas que lhes permitam exercer dignamente a profissão. Ao disponibilizar espaços, especialmente nas subseções, para que os profissionais possam trabalhar, tenham acesso à internet e possam receber clientes, estamos inserindo a advocacia em nosso meio e com ela nos reconectando. Ao mesmo tempo, desenvolveremos centros de convivência, de forma a fortalecer o contato entre advogados, a troca de experiências, networking, e viabilizar parcerias em casos concretos.
ConJur — É preciso aumentar a transparência na OAB-SP?
Carlos Kauffmann — Sim. Para tanto, submeteremos ao Conselho Seccional, em sessão aberta, a auditoria financeira da OAB-SP e da Caasp. Todos nós pagamos anuidade, que não é barata. Temos todo o direito de saber, com exatidão, onde cada centavo é gasto pela OAB-SP, como meio de avaliarmos o retorno e a gestão. Disso não abriremos mão.
ConJur — Considerando que o número de advogados formados cresce a cada ano, como receber e apoiar a jovem advocacia?
Carlos Kauffmann — A jovem advocacia está absolutamente distante da OAB-SP. Os jovens precisam, antes de tudo, ser ouvidos, compreendidos e inseridos no mercado de trabalho com qualidade. O apoio, para tanto, se dará não só pelos centros de trabalho e convivência, mas pela constante troca de experiências com advogados mais experientes e com escritórios, que serão estimulados, por meio de programas específicos, a receber a jovem advocacia. Além disso, desenvolveremos sistemas para auxiliar na estruturação da profissão, na criação das sociedades unipessoais, além de apoio material em parceria com empresas de telefonia e informática, entre diversas outras iniciativas.
ConJur — A OAB-SP faz um bom trabalho de estimativas de honorários?
Carlos Kauffmann — Não. A OAB-SP traz uma tabela mínima irreal e inexequível por boa parcela da advocacia. Não há campanha para efetiva implementação dos valores estipulados, nem acompanhamento das empresas e departamentos jurídicos que vilipendiam os honorários. Para isso, além de outras questões indispensáveis à valorização da classe, criaremos a Coordenadoria de Fiscalização da Advocacia.
ConJur — Diversas decisões negam o pagamento de honorários a advogados dativos. O que pretende fazer sobre o assunto?
Carlos Kauffmann — A fixação de honorários a advogados dativos decorre de lei e é obrigatória. Juiz que deixa de fixar referidos honorários deixa de seguir a lei. O mesmo ocorre com o constante desrespeito ao percentual mínimo de honorários estabelecido pelo CPP, que, por criação absurda, passaram a ser fixados por equidade. Incomoda-me quando vejo desembargadores que assumiram a função por indicação da OAB, em decorrência do quinto constitucional, fixar honorários advocatícios em desrespeito à norma vigente. A OAB-SP precisa, com urgência, combater o ativismo judicial que prejudica a advocacia e afasta a segurança jurídica. A lei existe e precisa ser respeitada por todos, especialmente pelo Poder Judiciário.
ConJur — Como o senhor gostaria que a sua gestão fosse lembrada?
Carlos Kauffmann — Como a gestão da união, da inclusão, do restabelecimento do diálogo, da nova metodologia, na qual todos os integrantes da advocacia, mulheres e homens, negros e brancos, velhos e jovens, independentemente da orientação sexual, sejam respeitados simplesmente por serem advogados. Vamos nos olhar nos olhos e enxergar nossos conteúdos, ética e força. Será a gestão em que a advocacia vai ser ressignificada e direcionada para o alto patamar em que merece estar. A OAB-SP será o esteio da sociedade e todos nós seremos respeitados por desempenharmos nossas funções com dignidade e altivez.
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