Supremo extingue pena de multa por presunção de falta de condições
25 de março de 2024, 18h47
O Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu que é possível extinguir o processo contra o condenado que cumpriu a pena de prisão sem pagar a pena de multa estipulada pela Justiça. Para isso, deve ser comprovada a impossibilidade de seu pagamento pelo apenado, ainda que de forma parcelada.
A decisão seguiu o voto do ministro Flávio Dino, relator da ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo partido Solidariedade (SD). O julgamento do processo foi feito em sessão virtual encerrada na última sexta-feira (22/3).
O artigo 51 do Código Penal (CP), com redação dada pela Lei 13.964/2019 (pacote “anticrime”), estabelece que, após decisão condenatória definitiva (trânsito em julgado), a multa deve ser cobrada perante o juiz da execução penal. O partido sustentou a inconstitucionalidade da interpretação, feita por tribunais brasileiros, que condiciona a extinção da punibilidade ao cumprimento da pena de multa quando tal sanção é acumulada com uma pena de prisão.
Proporcionalidade
Para o ministro Flávio Dino, com base no princípio da proporcionalidade da resposta penal, é necessário reconhecer que a impossibilidade de pagamento da pena de multa deve ser avaliada pelo juízo da execução. Ou seja, caso fique demonstrada a total impossibilidade do pagamento, tal obstáculo não pode impedir a extinção da pena privativa de liberdade.
Em seu voto pela procedência parcial do pedido, o ministro deu ao artigo 51 do Código Penal interpretação no sentido de que o descumprimento da pena de multa impede a extinção da punibilidade do condenado, exceto se for comprovada a impossibilidade do pagamento, ainda que de forma parcelada.
O relator acrescentou ainda que o juiz da execução pode extinguir a punibilidade do apenado, no momento oportuno, caso conclua, por meio de elementos constantes nos autos do processo, que o pagamento da multa é impossível.
Marginalização
Em série de reportagens recentes, a revista eletrônica Consultor Jurídico mostrou como as penas de multa contrastam com a miséria dos presos brasileiros e contribuem para a marginalização das pessoas que deixam a cadeia.
Segundo informações do Departamento Estadual de Execução Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), entre fevereiro de 2020 e abril de 2022, há a indicação de pagamento da pena de multa em apenas 10% das execuções.
Nos outros 90% — ou seja, 240,2 mil execuções —, o valor seguia pendente, impedindo a extinção da punibilidade dos presos que já cumpriram sua pena corporal.
Sem a extinção da punibilidade, o egresso do sistema prisional não consegue a reabilitação, que é o que assegura o sigilo dos registros sobre seu processo e sua condenação.
Sem o sigilo, a pessoa não consegue a certidão negativa de antecedentes criminais, sem a qual a busca por emprego formal fica muito prejudicada.
Além disso, sem a extinção, também não começa o chamado período depurador — prazo de cinco anos em que o condenado será considerado reincidente. Após esse tempo, ele volta a ser primário, embora ostente maus antecedentes.
Também permanece a suspensão dos direitos políticos. Assim, o ex-preso não consegue regularizar o título de eleitor. Logo, não pode votar, matricular-se em instituição de ensino público ou exercer cargos públicos concursados.
A regra geral no Código Penal é de que a pena de multa deve ser de, no mínimo, dez dias-multa e, no máximo, 360 dias-multa. Novamente, a escolha é do magistrado.
Atualmente, com o salário mínimo em R$ 1.412, o dia-multa em seu valor mínimo é de R$ 47,06. Isso significa que a pena varia entre R$ 470,66 (dez dias-multa) e R$ 16,9 mil (360 dias-multa).
Há casos em que o rigor da lei é maior, com a imposição de um valor mínimo específico para a pena de multa. No crime de tráfico de drogas, por exemplo, ela é de 500 dias-multa. Para os condenados em 2024, isso equivale a R$ 23,5 mil.
Levantamento feito a partir das intimações de agravo em execução das execuções de pena de multa destinadas à Defensoria Pública paulista em novembro de 2023 mostra que apenas 11% dos assistidos tinham renda mensal de mais de R$ 2,5 mil quando foram presos. Os mesmos dados mostram que 36% deles recebiam menos de R$ 1,2 mil. Com informações da assessoria de imprensa do STF
Clique aqui para ler o voto do ministro Flávio Dino
ADI 7.032
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