Os precatórios têm se mantido sob os holofotes da mídia já há algum tempo e não é sem motivo. O montante bilionário que essas dívidas judiciais de entidades públicas atingem preocupam o governo e, ao mesmo tempo, geram expectativa quanto ao impacto na economia, uma vez que os pagamentos movimentam o mercado de consumo.
Foi o que se viu com os R$ 93 bilhões em créditos extraordinários liberados, no final do ano passado, para pagamentos de dívidas judiciais da União, e o que se espera para os valores previstos para os próximos anos. Somente em 2024, a expectativa é de aproximadamente R$ 88 bilhões em pagamento de precatórios.
O fato é que o frenesi tende a continuar em torno do assunto. Isso porque o volume de precatórios pode aumentar ainda mais em decorrência de uma discussão que vem ocorrendo no estado de São Paulo, a respeito da forma de pagamento de condenações decorrentes de sentenças arbitrais proferidas contra órgãos públicos.
O parecer da PGE-SP
Em recente parecer, emitido em 19 abril de 2024, a Procuradoria Geral do Estado de São Paulo (PGE-SP) se manifestou favoravelmente sobre a aplicação do regime de precatórios para sentenças arbitrais condenatórias de cunho pecuniário exaradas contra a administração pública direta e autarquias.
O parecer da Procuradoria Administrativa (PA) (Parecer PA nº 12/2024) teve como base uma consulta da Assistência de Arbitragens da Subprocuradoria Geral do Estado da Área do Contencioso Geral, a respeito de um caso concreto, no qual se entendeu pela necessária submissão ao regime constitucional de precatórios, procedimento previsto no artigo 100 da Constituição Federal de 1988.
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Referido dispositivo da nossa Carta Magna estabelece que: “Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim”.
A leitura das consequências desse entendimento não é algo simples de se fazer. Misturam-se num mesmo caldeirão elementos de direito material e processual, de gestão e orçamento públicos, de economia e mercado, cujo resultado apresenta tanto aspectos positivos quanto negativos.
Todavia, no bojo do parecer emitido pela Procuradoria do Estado, vislumbra-se a busca por privilegiar a segurança jurídica. Afinal, como bem ressaltado no parecer, para as partes de um processo, a sentença arbitral possui os mesmos efeitos que a sentença judicial e segue o mesmo caminho de cumprimento, disposto nos artigos 513 e seguintes do Código de Processo Civil, logo, não seria adequado que recebesse tratamento diferenciado no que tange à forma de pagamento. Ainda mais nesses casos, em que umas das pontas é ocupada por entidades públicas.
Nesse sentido, acompanhar o parecer da PGE-SP é também respeitar princípios constitucionais, dentre eles, o princípio da moralidade administrativa, da impessoalidade, da igualdade, da legalidade orçamentária e da efetividade da tutela jurisdicional. Os precatórios representam mais do que um procedimento para pagamento de dívidas do Estado, constituem-se como instrumento de garantia dos direitos dos cidadãos brasileiros.
Tempo de espera
Infelizmente, nem tudo são flores. A aplicação desse entendimento também pode resultar no aumento da fila de precatórios e, consequentemente, em maior tempo de espera para os jurisdicionados até o efetivo pagamento, algo que notoriamente não é célere.
Já para o mercado de negociação de ativos judiciais, é mais uma oportunidade que se abre, visto que será possível oferecer a antecipação de valores, por meio da cessão de crédito, para titulares de direitos oriundos de sentenças arbitrais condenatórias contra a fazenda pública. Uma forma que o mercado encontra de equilibrar o sistema, atendendo a uma necessidade do cidadão frente a um judiciário sobrecarregado.
Evidente que não se pode prever todos os desdobramentos da aplicação do regime dos precatórios às sentenças arbitrais condenatórias proferidas contra a administração e autarquias, mas é possível enxergar a busca por segurança jurídica, pelo respeito aos princípios constitucionais e pela garantia de direitos do cidadão. Ademais, é indispensável observar as oportunidades e maximizar os benefícios que esse cenário pode proporcionar ao mercado e à sociedade.