Casos de família

STF começa a julgar se chefes do Executivo e Legislativo podem ser parentes

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29 de maio de 2024, 19h45

O Supremo Tribunal Federal começou a analisar, nesta quarta-feira (20/5), uma ação em que o Partido Socialista Brasileiro (PSB) busca impedir que parentes de até segundo grau ocupem, simultaneamente, os cargos de chefia dos Poderes Legislativo e Executivo de uma mesma unidade federativa.

STF decidirá se parentes próximos podem chefiar, simultaneamente, Executivo e Legislativo

A análise chegou a ser iniciada em março, no Plenário virtual, mas o ministro Flávio Dino pediu destaque, levando o caso a julgamento presencial. Na ocasião, só a relatora, ministra Cármen Lúcia havia votado. Ela entendeu pela improcedência da ação.

Na sessão desta quarta houve apenas as sustentações orais. O advogado Rafael Carneiro, que atua defendendo o PSB, afirmou que permitir parentes em dois poderes compromete a independência e o exercício das competências do Legislativo e do Executivo.

Ainda segundo o advogado, o domínio de uma mesma família na chefia de dois poderes compromete a moralidade e a impessoalidade da administração pública e afeta a fiscalização das ações e das contas do Executivo. “É inimaginável que o filho aceitaria um pedido de impeachment contra o próprio pai”, sustentou Carneiro.

A ação

O PSB questiona o parentesco no Legislativo e Executivo via arguição de descumprimento de preceito fundamental. Segundo a legenda, tem sido cada vez mais comum, especialmente nos municípios, que pai e filho ocupem, ao mesmo tempo, a presidência da casa legislativa e o comando do Executivo local.

A ideia do PSB é evitar, por exemplo, que o presidente de uma Câmara Municipal seja filho do prefeito da cidade, ou que o presidente de uma Assembleia Legislativa estadual seja cônjuge do governador.

A agremiação aborda até mesmo a situação hipotética de um parente próximo do presidente da República se tornar presidente da Câmara ou do Senado (e vice-versa).

O pedido se baseia no parágrafo 7º do artigo 14 da Constituição, que prevê a chamada “inelegibilidade por parentesco”. Conforme o dispositivo, o cônjuge e os parentes próximos (inclusive por adoção) do presidente da República, do governador e do prefeito são inelegíveis no respectivo território de jurisdição, a menos que já sejam titulares de mandatos eletivos e candidatos à reeleição.

Ou seja, uma pessoa não pode se candidatar se seu cônjuge ou parente próximo (até o segundo grau, na lógica do Código Civil) ocupar o cargo de chefe do Executivo.

A intenção do PSB é aplicar essa regra também para impedir cônjuges, companheiros e parentes próximos do chefe do Executivo de disputarem a presidência do Legislativo do mesmo ente federativo.

De acordo com a sigla, o domínio de uma mesma família na chefia de dois poderes compromete a moralidade e a impessoalidade da administração pública e afeta a fiscalização das ações e das contas do Executivo. “É inimaginável que o filho aceitaria um pedido de impeachment contra o próprio pai”, exemplifica.

O partido também pede que o STF conceda liminar para suspender as eleições dos presidentes da Assembleia Legislativa de Tocantins e das Câmaras Municipais de Cornélio Procópio (PR) e Ji-Paraná (RO) para o período entre 2025 e 2026.

Antes da suspensão…

Antes de o julgamento ser paralisado no Plenário Virtual, a relatora, ministra Cármen Lúcia, afirmou que os precedentes do Tribunal Superior Eleitoral são no sentido de que não pode haver inelegibilidade em situações não previstas pela legislação. Ela irá proferir novo voto no Plenário físico.

O próprio STF já decidiu, em 2006, que as normas sobre inelegibilidade “são de natureza estrita, não cabendo interpretá-las a ponto de apanhar situações jurídicas nelas não contidas”.

A ideia é que, em caso de dúvida, deve sempre prevalecer a interpretação que menos restrinja o direito fundamental em debate — no caso, a elegibilidade.

Ao prever uma hipótese de inelegibilidade, o parágrafo 7º do artigo 14 da Constituição limita os direitos políticos dos cidadãos.

Por isso, Cármen explicou que só é válida a interpretação “que contemple a natureza restritiva daquela norma”. Ou seja, a limitação deve valer apenas para os casos previstos de forma expressa no texto.

Para a relatora, o PSB adotou “a linha de interpretação ampliativa daqueles limites”, pois busca estender a restrição de direitos políticos prevista na Constituição a outras situações.

Na sua visão, se o STF fizesse isso, estaria atuando “como poder constituinte, limitando direitos fundamentais de eventuais candidatos”. Isso violaria a independência do Legislativo, que tem a competência para definir as hipóteses de inelegibilidade.

Além disso, a Advocacia-Geral da União chamou atenção para o fato de que os atos de fiscalização promovidos pelo Legislativo são de competência de toda a casa legislativa, e não só do seu presidente. É comum que sejam criadas comissões específicas para isso.

Segundo a ministra, o PSB partiu do pressuposto de que o parentesco entre os políticos compromete a função de fiscalização do Executivo e a separação dos poderes, “sem colacionar aos autos elementos concretos que justifiquem seu comprometimento”.

ADPF 1.089

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