Opinião

Emissão de CTC frente ao recebimento de abono de permanência

Autores

  • Sarah Mattesco

    é bacharela em Direito pela União Pioneira de Integração Social (Upis) especialista em Direito Previdenciário com foco em processos administrativos e judiciais que tratam sobre a aplicação do regramento mais vantajoso à aposentadoria concedida aos servidores públicos e atuação na seara consultiva especializada na análise e mapeamento previdenciário.

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  • Eduarda Alves

    é bacharela em Direito pelo Centro Universitário de Brasília (UniCeub) especialista em Direito Previdenciário com foco em processos administrativos e judiciais que objetivam garantir a inativação dos servidores públicos de acordo com as regras mais vantajosas em vigor. Atua com destaque na seara consultiva especializada na análise e mapeamento previdenciário.

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14 de junho de 2024, 19h36

Pretende-se analisar aqui a possibilidade de emissão da certidão de tempo de contribuição (CTC) relativa a período que tenha gerado o recebimento do abono de permanência.

Primeiramente, insta consignar que o abono de permanência tem previsão constitucional e consiste em uma vantagem concedida aos servidores públicos que preenchem os requisitos para a aposentadoria voluntária, mas optam por permanecer em atividade. Confira-se:

“Art. 40. O regime próprio de previdência social dos servidores titulares de cargos efetivos terá caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente federativo, de servidores ativos, de aposentados e de pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial.     

§ 19. Observados critérios a serem estabelecidos em lei do respectivo ente federativo, o servidor titular de cargo efetivo que tenha completado as exigências para a aposentadoria voluntária e que opte por permanecer em atividade poderá fazer jus a um abono de permanência equivalente, no máximo, ao valor da sua contribuição previdenciária, até completar a idade para aposentadoria compulsória.”

Diante da omissão legislativa sobre a natureza jurídica do abono de permanência, iniciou-se uma discussão sobre se este seria considerado verba indenizatória ou remuneratória.

Isso porque o valor recebido a título de abono de permanência consiste no mesmo valor recolhido sob a rubrica de contribuição previdenciária.

Portanto, de certo modo, tem-se que o abono de permanência poderia ser considerado uma reparação pela permanência na atividade, ou seja, uma indenização equivalente à respectiva contribuição.

Entendimento do STJ

Divulgação

Para pôr fim às discussões, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), decidiu, no julgamento do Recurso Especial nº 1.192.556, sob o rito dos recursos repetitivos (Tema nº 424), que o abono de permanência possui natureza exclusivamente remuneratória, pois cuida de uma contraprestação pela permanência em atividade e deve ser alvo da incidência de Imposto de Renda.

A interpretação baseou-se no fato de que o abono de permanência, apesar de parecer, não se trata de ressarcimento da contribuição previdenciária e, além disso, confere acréscimo patrimonial ao beneficiário. Veja-se:

“PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS NO RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ABONO DE PERMANÊNCIA. INCIDÊNCIA DO IMPOSTO DE RENDA. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. REJEIÇÃO DOS EMBARGOS. (…)

2. Esta Seção manifestou-se sobre a natureza jurídica do abono de permanência, quando prestigiou, no acórdão embargado, o entendimento da Segunda Turma, que, ao julgar o REsp 1.105.814/SC, sob a relatoria do Ministro Humberto Martins, reconhecera a incidência do imposto de renda sobre o aludido abono com base nas seguintes razões de decidir: ‘O abono de permanência trata-se apenas de incentivo à escolha pela continuidade no trabalho em lugar do ócio remunerado. Com efeito, é facultado ao servidor continuar na ativa quando já houver completado as exigências para a aposentadoria voluntária. A permanência em atividade é opção que não denota supressão de direito ou vantagem do servidor e, via de consequência, não dá ensejo a qualquer reparação ou recomposição de seu patrimônio. O abono de permanência possui, pois, natureza remuneratória por conferir acréscimo patrimonial ao beneficiário e configura fato gerador do imposto de renda, nos termos termos do artigo 43 do Código Tributário Nacional.’ (grifou-se). Com efeito, o abono de permanência é produto do trabalho do servidor que segue na ativa, caracterizando inegável acréscimo patrimonial, o que enseja a incidência do imposto de renda. Não cabe a alegação de que o abono de permanência corresponderia a verba indenizatória, pois não se trata de ressarcimento por gastos realizados no exercício da função ou de reparação por supressão de direito. (…)” (STJ, 1ª Seção, REsp nº 1.192.556, relator ministro Mauro Campbell Marques, DJe de 28/10/2010, grifos aditados)

Natureza da verba

Do precedente, extrai-se que o abono de permanência não pode ser visto como uma verba indenizatória pois, apesar de ter o mesmo valor da contribuição previdenciária, o recebimento da vantagem não onera os recursos do fundo previdenciário, mas é devido pelo ente público ao qual é vinculado o servidor que permanece em atividade.

Definiu-se, então, que o preenchimento dos requisitos para a aposentadoria e a opção por permanecer em atividade geram o direito à vantagem remuneratória, e não indenizatória.

Certidão de tempo de contribuição

Assim, após a fixação do entendimento sobre o caráter dessa parcela, ergue-se a discussão acerca da emissão de certidão de tempo de contribuição para a averbação de período que tenha gerado tal vantagem.

Isso porque a Medida Provisória nº 871/2019, convertida na Lei nº 13.846/2019, deu nova redação ao artigo 96, VIII, da Lei nº 8.213/1991, que veda a desaverbação de tempo que tenha gerado vantagem remuneratória:

“Art. 96 (…)

VIII – é vedada a desaverbação de tempo em regime próprio de previdência social quando o tempo averbado tiver gerado a concessão de vantagens remuneratórias ao servidor público em atividade; e (…)”

A desaverbação de tempo é a possibilidade de utilização de período já averbado em outro destino. A Lei é clara no sentido de vedar a desaverbação de tempo que tenha gerado qualquer vantagem remuneratória, inclusive o abono de permanência.

Dessa forma, verifica-se que, o período anteriormente averbado não pode ser retirado do órgão de destino, se tiver resultado em efeitos financeiros.

No entanto, em que pese a lei ser clara na vedação em questão, o legislador foi silente acerca da possibilidade de averbação de período que tenha gerado vantagem remuneratória.

Então, presume-se que a legislação atual não veda a emissão de Certidão de Tempo de Contribuição de período que tenha resultado na concessão do abono, mas tão somente a desaverbação de período que tenha gerado tal vantagem.

Condição

Nesse sentido, a única condição que a Lei impõe para a emissão de certidão de tempo de contribuição no Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) é aquela disposta no artigo 96 da Lei nº 8.213/1991. Veja-se:

“Art. 96. O tempo de contribuição ou de serviço de que trata esta Seção será contado de acordo com a legislação pertinente, observadas as normas seguintes: (…)

VI – a CTC somente poderá ser emitida por regime próprio de previdência social para ex-servidor;”

Portanto, entende-se pela autorização legal da emissão de certidão de tempo de contribuição após a vacância do cargo, mesmo que o período tenha gerado vantagem remuneratória.

Para isso, basta que o período que se pretende averbar em outro vínculo não possua averbações anteriores.

Averbação

A certidão de tempo de contribuição permite que o período seja transportado para outro destino para fins de contagem por meio da averbação de tempo de serviço.

Spacca

A averbação é a possibilidade de agregar períodos anteriores ao vínculo atual para possibilitar a aposentadoria, desde que não concomitantes.

A título de exemplo, imagine que um servidor possua dois cargos acumuláveis permitidos pelo artigo 37 da Constituição da República.

Em um dos vínculos, possuía 30 anos de serviço público em um município, que já havia gerado o direito ao recebimento de abono de permanência.

Esse servidor deseja exonerar-se do cargo ocupado no município para a emissão de certidão de tempo de contribuição, com o intuito de averbar o período em seu outro cargo em um órgão federal.

O silêncio da lei quanto a averbação de tempo que tenha gerado vantagem remuneratória, permite que esse servidor se exonere do município e averbe o período no órgão federal, sem qualquer prejuízo de contagem.

Isso viabilizaria a sua aposentadoria de forma mais rápida e vantajosa no órgão federal, mesmo que tenha recebido abono de permanência do vínculo no qual pretende se exonerar.

Essa possibilidade permite aos servidores optarem por se aposentar no órgão no qual a sua aposentadoria seja mais vantajosa.

Conclusão

Portanto, conclui-se que, mesmo que o abono de permanência se trate de uma parcela remuneratória, há a possibilidade de emissão de certidão de tempo de contribuição de período que tenha gerado tal vantagem, se não houver averbações anteriores.

Com a certidão, é possível averbar o período que tenha gerado abono de permanência em outro vínculo para viabilizar a aposentadoria com regras mais vantajosas.

Mas, por mais que essa possibilidade esteja disponível, toda situação deve ser examinada de maneira individual e cautelosa, de modo a garantir o objetivo almejado e a evitar potenciais problemas.

Autores

  • é bacharela em Direito pela União Pioneira de Integração Social (Upis), especialista em Direito Previdenciário, com foco em processos administrativos e judiciais que tratam sobre a aplicação do regramento mais vantajoso à aposentadoria concedida aos servidores públicos e atuação na seara consultiva especializada na análise e mapeamento previdenciário.

  • é bacharela em Direito pelo Centro Universitário de Brasília (UniCeub), especialista em Direito Previdenciário, com foco em processos administrativos e judiciais que objetivam garantir a inativação dos servidores públicos de acordo com as regras mais vantajosas em vigor. Atua com destaque na seara consultiva especializada na análise e mapeamento previdenciário.

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