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Consultor Jurídico

TRF-4 tenta virar a página, mas fantasma da ‘lava jato’ ainda assombra

12 de junho de 2024, 9h45

Por Júnior Carvalho

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*Reportagem publicada no Anuário da Justiça Federal 2024, lançado no Supremo Tribunal Federal. A versão impressa está à venda na Livraria ConJur (clique aqui). Acesse a versão digital pelo site do Anuário da Justiça (anuario.conjur.com.br).

Com muita dificuldade, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região tenta se reencontrar com um passado nem tão distante. Sob a presidência de Fernando Quadros desde junho de 2023, busca se livrar da pecha de ‘tribunal da lava jato’ para resgatar a reputação de corte vanguardista que a implantação do sistema processual eletrônico (e-proc), pioneira na Justiça Federal, conferiu-lhe e lhe rendeu certa distinção. Como uma alma penada, porém, a “operação” segue assombrando o presente do TRF-4.

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4ª Região em números

Não bastassem as derrotas acumuladas no Supremo Tribunal Federal, a anulação de condenações penais, a suspeição do ex-juiz Sergio Moro, o esvaziamento da competência da 13ª Vara Federal em Curitiba, em meados de abril o Conselho Nacional de Justiça decidiu afastar dois de seus desembargadores, Carlos Eduardo Thompson Flores e Loraci Flores de Lima, da 8ª Turma, especializada em Direito Penal.

Segundo o relatório do corregedor nacional de Justiça, Luis Felipe Salomão, haveria indícios da prática de “bypass processual” por Thompson Flores e Loraci Lima para burlar decisões do STF em processos que tramitavam na 13ª Vara pós-Moro. Thompson Flores foi substituído pela juíza Bianca Cruz Arenhart, da 12ª Vara de Curitiba; Loraci, pelo juiz Gerson Godinho, da 4ª Turma Recursal do Rio Grande do Sul.

O estrago só não foi maior para o TRF-4 porque, ao contrário do que determinou o corregedor na véspera da sessão ordinária, por 9 votos a 6, o CNJ revogou outros dois afastamentos: da juíza Gabriela Hardt, sucessora de Moro na 13ª, e do juiz Danilo Pereira Júnior, atual titular da Vara Federal de Curitiba e que atuou como convocado nas 7ª e 8ª Turmas. Ambos ainda podem ser alvo de processo disciplinar, já que a decisão foi adiada no CNJ por pedido de vista do ministro Luís Roberto Barroso.

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1 milhão de novos casos foram distribuídos a juízes e desembargadores em 2023

Antes da decisão do CNJ, Fernando Quadros deu entrevista (clique aqui para ler) ao Anuário da Justiça Federal 2024, a primeira desde que assumiu o comando do TRF-4. Nela reconheceu “excessos” da operação e deixou claro que o objetivo é tentar virar essa página. “Hoje a nossa preocupação é aprender com os excessos que se cometeram no tribunal. Todos aprendem com essas questões, a jurisprudência do Supremo variou e nós nos adaptamos a ela. Então, eu tento sair dessa ideia de tribunal da ‘lava jato’ porque isso passou. Esses processos não existem mais, muita coisa passou a ser considerada crime eleitoral, então não é mais da nossa competência”, frisou.

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Quase 1 milhão de casos foram julgados na 4ª Região em 2023

Ao citar, porém, que a 4ª Região ainda colhe frutos das ações da chamada república de Curitiba, disse: “Somos muito criticados até hoje. Tivemos inspeção do CNJ, tanto no tribunal quanto na primeira instância. A instituição sentiu essa crítica e esse viés e ainda colhe os frutos. (…) E o que eu sempre lembro é que era um sistema. Aquilo começava na primeira instância, passava pelo tribunal, subia para o STJ e o Supremo. Foi um conjunto. Mas é mais fácil brigar com o TRF-4, porque não vão brigar com os ministros do Supremo e do STJ que mantiveram a decisão. É mais fácil bater no pequeno”.

Na prática, a tentativa de passar a borracha nesse histórico se personifica na própria eleição de Fernando Quadros, considerado garantista na área penal, crítico ao punitivismo e identificado à esquerda por ter militado no movimento estudantil. Em seu discurso de posse, falou em imparcialidade e citou nominalmente advogados do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a quem se referiu como “amigos”. Outra tentativa de mudança na rota do TRF-4 ocorreu na 8ª Turma, responsável por julgar os recursos da ‘lava jato’: Victor Laus, Gebran Neto e Leandro Paulsen, ex-membros da turma, deixaram de atuar em Porto Alegre.

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Uma ação pode ter uma ou mais demandas

Na advocacia criminal, porém, a avaliação é de que o TRF-4 ainda está distante de retomar a normalidade. “A impressão que eu tenho é que essa lógica, esse caldo cultural da ‘lava jato’, acabou se estendendo [aos dias atuais]”, afirma Francisco Monteiro Rocha Jr., advogado criminalista e professor de Direito Penal da UFPR. “Os juízes garantistas com quem a gente se deparava antes era o pessoal da Justiça Federal, os desembargadores. Esse quadro mudou. Hoje, quando temos uma causa na Justiça Federal, a gente coloca a mão na cabeça e diz: ‘meu Deus do céu, vamos ter de enfrentar aqueles homens!’”, relata o advogado.

A busca pela retomada do protagonismo do TRF-4 ainda depende de resultados mais alvissareiros. Com o desmembramento, em 2022, de Minas Gerais do TRF-1, resultando na criação do TRF-6, a 4ª Região está na segunda posição no total de casos novos recebidos em 2023. Neste indicador, ultrapassou o TRF-3, que engloba os estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul, e encostou no TRF-1.

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Principais temas discutidos nas ações levadas à 4ª Região

Ricardo do Valle Pereira, ex-presidente da corte, atribui a melhora nos números, em 2022, ao aumento das vagas desembargador na 4ª Região – de 27 para 39 – e também à conjuntura regional. “O desafio ainda é grande, pois há carência de juízes e servidores, e a distribuição não para de crescer”. A descentralização dos órgãos julgadores, com a criação de duas novas turmas em Santa Catarina e Paraná (ao todo, são quatro turmas fora de Porto Alegre: 9ª, 10ª, 11ª e 12ª), a interiorização da Justiça Federal, o avanço da informatização e até questões culturais são apontados por desembargadores ouvidos pelo Anuário da Justiça como fatores responsáveis pela melhoria dos resultados.

Se, por um lado, o avanço tecnológico rendeu louros ao TRF da 4ª Região, por outro, a advocacia alerta para os impactos dessa realidade e se queixa da ausência dos desembargadores no tribunal. Boa parte dos magistrados só atua presencialmente em dias específicos. “Na minha última ida a Porto Alegre aproveitei para passar nos gabinetes dos desembargadores, mas não consegui conversar com nenhum”, relatou Mauro Morais, do Gouvêa dos Reis Advogados, de Santa Catarina. “Em que pese eu compreenda a agenda de todos, é fundamental que os desembargadores atendam aos advogados. É o nosso papel levar para eles a realidade dos fatos e eles julgarem da melhor maneira possível”, emendou o advogado Murilo Gouvêa dos Reis.

ANUÁRIO DA JUSTIÇA FEDERAL 2024
11ª Edição
ISSN: 2238107-4
Número de páginas: 228
Versão impressa: R$ 50, à venda na Livraria ConJur
Versão digital: acesso por meio do app “Anuário da Justiça” ou pelo site anuario.conjur.com.br

Assista à cerimônia de lançamento do Anuário da Justiça:

Anunciaram nesta edição:
Advocacia Fernanda Hernandez
Arruda Alvim & Thereza Alvim Advocacia e Consultoria Jurídica
Ayres Britto Consultoria Jurídica e Advocacia
Barroso Fontelles, Barcellos, Mendonça Advogados
Bialski Advogados Associados
Bottini & Tamasauskas Advogados
Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil
Costa & Marinho Advogados
Décio Freire Advogados
Dias de Souza Advogados
D’Urso & Borges Advogados Associados
JBS S.A.
Machado Meyer Advogados
Marcus Vinicius Furtado Coelho Advocacia
Milaré Advogados
Moraes Pitombo Advogados
Nelio Machado Advogados
Original 123 Assessoria de Imprensa
Pardo Advogados Associados
Sergio Bermudes Advogados
Warde Advogados