GRANDES TEMAS, GRANDES NOMES

Futuro do Brasil passa pelo semipresidencialismo, afirma Manoel Gonçalves Ferreira Filho

 

27 de julho de 2024, 10h41

O presidencialismo de coalizão já não funciona, dada a disparidade dos interesses de deputados e senadores e do governo federal — algo que desemboca no sistema de Justiça, na forma de judicialização do debate político. Para corrigir esse cenário e garantir maioria parlamentar aos projetos do governo, o Brasil deveria adotar um sistema do tipo semipresidencialista, no qual o presidente da República atuaria como árbitro de eventuais conflitos políticos e em que o governo seria, na prática, presidido por um gabinete responsável pela política nacional perante o Congresso.

Para Ferreira Filho, semipresidencialismo evitaria judicialização da política

Essa é a proposta do advogado e professor emérito de Direito Constitucional da Universidade de São Paulo Manoel Gonçalves Ferreira Filho. Segundo ele, nesse sistema a ação política mais imediata estaria nas mãos de um “presidente de conselho”, que teria melhores condições, por ser mais próximo do Congresso, de conseguir o apoio da maioria parlamentar.

“E, por outro lado, o presidente da República não perde a sua importância, porque a ele vai caber uma série de decisões que são cruciais a longo prazo. Isso implica um pouco na ideia de que há problemas e objetivos nacionais de longo prazo e de curto prazo”, disse Ferreira Filho em entrevista à série Grandes Temas, Grandes Nomes do Direito. Nela, a revista eletrônica Consultor Jurídico conversa com algumas das personalidades mais importantes do Direito e da política sobre os temas mais relevantes da atualidade.

Na visão do constitucionalista, um arranjo do tipo também faria com que o Judiciário voltasse a atuar de forma “normal”, “fazendo Justiça” e corrigindo a judicialização da política ao limitar o controle de constitucionalidade ao essencial.

“O Judiciário não é um poder político e não cabe a ele decidir em lugar do povo. Os outros dois é que são poderes eleitos — daí a distinção entre poderes políticos e poderes não políticos —, os políticos são aqueles que vêm das eleições diretas, pelo povo.”

Por outro lado, segundo o jurista, a judicialização decorre atualmente do desencontro existente entre os parlamentares — que visam ao interesse dos estados e de determinados grupos de eleitores — e o presidente da República e sua equipe de governo.

“Surge, então, uma situação relativamente incoerente como a atual. Porque o presidente da República ganhou a eleição, embora com um número pequeno de diferença, e o partido dele não é nem sequer o primeiro dos partidos. E coalizão exige uma adequação e uma contenção que nem sempre ocorrem. É claro que isso se reflete na judicialização da política.”

Pauta de costumes

Um fator agravante, nesse cenário, são as discussões sobre as chamadas “questões de costume”, que são naturalmente delicadas e, por isso, requerem mais debate para a construção de consensos — que não são obtidos no cenário atual.

“As coisas precisam estar, de certa forma, maduras para que (projetos referentes a esses temas) sejam aprovados no Congresso, ainda que o presidente da República não pretenda isso. O presidente, como eu procurei mostrar, é eleito por um critério político diferente em relação aos deputados e senadores e, embora a eleição seja no mesmo dia, há muitos anos que não ocorre mais o famoso presidencialismo de coalizão. Hoje há coalizões instáveis, e é notório, para quem acompanha a política, que frequentemente a base de apoio ao presidente da República vota contra o presidente”, disse Ferreira Filho, novamente em defesa da adoção de um modelo semipresidencialista de governo.

Clique aqui para assistir à entrevista ou veja abaixo:

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